1 A comunidade espírita estava em grande agitação na campanha financeira para a construção de um lactário.
2 E ao dissertar sobre a caridade, Isauro Borges falou, veemente:
— Meus amigos, em matéria de assistência, mais vale um pão cedido de boa vontade, que as promessas de milhões…
3 Ao sair do templo espírita, foi procurado por Licínio Gonzaga, companheiro da atividade espírita, que observou, calmo:
— Borges, gostei de sua palestra, mas não concordo com a sua maneira de encarar a questão. Dar migalhas é dar esmolas…
4 — E que nos sugere então? — Respondeu o interpelado. — Não podemos esquecer que a obra do bem é serviço de todos.
5 Gonzaga piscou um olho e disse:
— Não estou dormindo no ponto.
6 E contou que encontrara, hospitalizado, grande fazendeiro que adoecera de repente, no Rio, e pelo qual passara a se responsabilizar financeiramente, até que a família lhe viesse ao encontro, e esse novo amigo, ao que lhe parecia, era o homem providencial.
7 Convidado a vê-lo, Borges compareceu no dia seguinte à casa de saúde, e o coronel Custódio Augusto de Souza, tal era o seu nome, conversou, animado, dizendo possuir grande sítio ao pé da Serra do Caparaó, no Espírito Santo, e larga faixa de terra na Baixada Fluminense, e que pretendia cooperar na campanha do lactário, com seiscentos mil cruzeiros.
8 Licínio mostrava olhos fulgurantes, e várias vezes os dois amigos visitaram o enfermo, fazendo planos.
9 Daí a uma semana, voltaram ao hospital com os demais elementos da diretoria para tratarem da doação.
10 Contudo, desapontados, souberam que o doente, que usava nome suposto, estava com vários processos em andamento na polícia, e, desde a véspera, fora transferido para a cadeia…
Hilário Silva