O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano IX — Janeiro de 1866.

(Idioma francês)

O Espiritismo tem lugar reservado na filosofia e nos conhecimentos usuais.

(Sumário)


Neste momento publica-se importante obra que interessa à Doutrina Espírita no mais alto grau, e cuja análise do seu prospecto nos fará melhor conhecê-la.


Novo Dicionário Universaln panteão literário e enciclopédia ilustrada, por Maurice Lachâtre,  †  com o concurso de cientistas, artistas e escritores, conforme os trabalhos de Allan Kardec, Ampère, Andral, Arago, Audouin, Balbi, Becquerel, Berzelius, Biot, Brongnard, Burnouf, Chateaubriand, Cuvier, Flourens, Gay-Lussac, Guizot, Humboldt, Lamartine, Lamennais, Laplace, Magendie, Michelet, Ch. Nodier, Orfila, Payen, Raspail, de Sacy, J. B. Say, Thiers, etc., etc.

“Dois magníficos volumes in-4º grande, de três colunas, ilustrados com vinte mil figuras, gravadas em madeira, intercaladas no texto. — Dois fascículos semanais, de 10 centavos cada. — Cada fascículo contém 95.768 letras, isto é, matéria da metade de um volume in-8º. A obra contém 200 fascículos por volume e não custará mais que 40 francos. Esta obra, o mais gigantesco empreendimento literário de nossa época, contém a análise de mais de 400.000 obras, e pode ser considerada, com justiça, como o mais vasto repertório de conhecimentos humanos. O Novo Dicionário Universal é o mais exato, o mais completo e o mais progressivo de todos os dicionários, o único que abarca em seus desenvolvimentos todos os dicionários especiais da língua usual, da linguagem poética, dos sinônimos, da linguagem antiga, das dificuldades gramaticais, da teologia, das religiões, seitas e heresias, das festas e cerimônias de todos os povos, da mitologia, do magnetismo, do Espiritismo, das doutrinas filosóficas e sociais, da história da biografia, das ciências, da física, da química, da história natural, da astronomia, das invenções, da medicina, da geografia, da marinha, da jurisprudência, da economia [organização] política, da franco-maçonaria, da agricultura, do comércio, da economia doméstica, do governo doméstico, etc., etc. — Paris, Docks de la librairie, boulevard Sébastopol.”  † 

Esta obra conta no momento vinte mil subscritores.

Devemos fazer notar, inicialmente, que se o nosso nome se acha à testa dos autores, cujas obras foram consultadas, foi a ordem alfabética que assim o quis, e não a preeminência.

Todos os termos especiais do vocabulário espírita se acham nesse vasto repertório, não como uma simples definição, mas com todos os desenvolvimentos que comportam, de sorte que seu conjunto formará um verdadeiro tratado do Espiritismo. Além disso, toda vez que uma palavra possa levar a uma dedução filosófica, a ideia espírita é cotejada, como ponto de comparação.

Concebida num espírito de imparcialidade, a obra não apresenta a ideia espírita, nem qualquer outra, como verdade absoluta; deixa livre o leitor para aceitá-la ou rejeitá-la, mas dá a este os meios de apreciá-la, apresentando-a com escrupulosa exatidão, e não truncada, alterada ou prejulgada. Limita-se a dizer: sobre tal ponto uns pensam de tal maneira; o Espiritismo o explica de outro modo.

Um dicionário não é um tratado especial sobre uma matéria, no qual o autor desenvolve sua opinião pessoal; é uma obra de pesquisas, destinado a ser consultado, e que se dirige a todas as opiniões. Se aí se procura uma palavra, é para saber o que realmente significa e não para ter a apreciação do redator, que pode ser justa ou falsa. Um judeu e um muçulmano devem nele encontrar a ideia judaica ou muçulmana reproduzida exatamente, o que não implica em esposar essa ideia. O dicionário não tem de decidir se ela é boa ou má, absurda ou racional, porque o que é aprovado por uns, pode ser censurado por outros; apresentando-a na sua integralidade, não lhe assume a responsabilidade. Se se tratar de uma questão científica, que divide os sábios, por exemplo, da homeopatia e da alopatia, ele tem por missão dar a conhecer os dois sistemas, mas não preconizar um em detrimento do outro. Tal deve ser o caráter de um dicionário enciclopédico; só nesta condição deve ser consultado com proveito, em todos os tempos e por todo o mundo. Com a universalidade ele adquire a perpetuidade.

Tal é, e tal deveria ser o sentimento que presidiu a parte que concerne ao Espiritismo. Que os críticos emitam sua opinião em obras especiais, nada melhor; é seu direito. Mas um dicionário é um terreno neutro, onde cada coisa deve ser apresentada sob suas verdadeiras cores, e onde se deve poder colher toda espécie de informações, com a certeza de aí encontrar a verdade.

Em tais condições, tendo o Espiritismo achado lugar numa obra tão importante e tão popular quanto o Novo Dicionário Universal, tem lugar reservado entre as doutrinas filosóficas e os conhecimentos habituais; seu vocabulário, já aceito pelo uso, recebeu sua consagração e, doravante, nenhuma obra do mesmo gênero poderá omiti-lo sem ser incompleto. Aí está ainda uma das produções do ano de 1865, que o Sr. vice-presidente Jaubert esqueceu de mencionar na sua lista de resultados deste ano. [Vide: Carta do Sr. Jaubert.]

Corroborando as observações acima, e como amostra da maneira pela qual as questões espíritas são tratadas nesta obra, citaremos a explicação que se acha no verbete alma. Depois de haver desenvolvido longamente, imparcialmente as diferentes teorias da alma, segundo Aristóteles, Platão, Leibniz, Descartes e outros filósofos, que não podemos reproduzir por causa de sua extensão, o artigo termina assim:

Conforme a Doutrina Espírita, a alma é o princípio inteligente que anima os seres da criação e lhes dá o pensamento, a vontade e a liberdade de agir. Ela é imaterial; individual e imortal; mas sua essência íntima é desconhecida; não a podemos conceber de modo algum isolada da matéria, senão como uma abstração. Unida ao envoltório fluídico etéreo ou perispírito, ela constitui o ser espiritual concreto, definido e circunscrito chamado Espírito (Vide Espírito, perispírito). Por metonímia, muitas vezes empregam-se as palavras alma e Espírito uma pela outra; diz-se: as almas sofredoras e os Espíritos sofredores; as almas felizes e os Espíritos felizes; evocar a alma ou o Espírito de alguém; mas a palavra alma desperta antes a ideia de um princípio, de uma coisa abstrata, e a palavra Espírito a de uma individualidade.

“Unido ao corpo material pela encarnação, o Espírito constitui o homem, de modo que no homem há três coisas: a alma propriamente dita, ou princípio inteligente; o perispírito, ou envoltório fluídico da alma; o corpo, ou invólucro material. Assim, a alma é um ser simples; o Espírito um ser duplo, composto da alma e do perispírito; o homem, um ser triplo, composto da alma, do perispírito e do corpo. Separado do Espírito, o corpo é uma matéria inerte; separado da alma, o perispírito é uma matéria fluídica, sem vida e sem inteligência. A alma é o princípio da vida e da inteligência; foi, pois, equivocadamente que algumas pessoas pretenderam que, dando à alma um envoltório fluídico semimaterial, o Espiritismo dela fazia um ser material.

“A origem primeira da alma é desconhecida, porque o princípio das coisas está nos segredos de Deus, e porque não é dado ao homem, no seu atual estado de inferioridade, tudo compreender. Sobre este ponto só se podem formular sistemas. Segundo uns, a alma é uma criação espontânea da Divindade; segundo outros, é a própria emanação, uma porção, uma centelha do fluido divino. Eis um problema sobre o qual não se podem estabelecer senão hipóteses, pois há razões a favor e contra. À segunda opõe-se, todavia, esta fundada objeção: Sendo Deus perfeito, se as almas fossem porções da Divindade, deveriam ser perfeitas, em virtude do axioma de que a parte é da mesma natureza que o todo; desde então, não se compreenderia que as almas fossem imperfeitas e tivessem necessidade de se aperfeiçoar. Sem se deter nos diversos sistemas relativos à natureza íntima e à origem da alma, o Espiritismo a considera na espécie humana; constata, em razão de seu isolamento e de sua ação independente da matéria, durante a vida e depois da morte, sua existência, seus atributos, sua sobrevivência e sua individualidade. Sua individualidade ressalta da diversidade que existe entre as ideias e as qualidades de cada uma no fenômeno das manifestações, diversidade que para cada uma acusa uma existência própria.

“Um fato não menos capital ressalta igualmente da observação: é que a alma é essencialmente progressiva e adquire incessantemente, em saber e em moralidade, pois que são vistas em todos os graus de desenvolvimento. Segundo o ensino unânime dos Espíritos, ela é criada simples e ignorante, isto é, sem conhecimentos, sem consciência do bem e do mal, com igual aptidão para um e para outro é para tudo adquirir. Sendo a criação incessante e para toda a eternidade, há almas chegadas ao topo da escala, enquanto outras surgem para a vida; mas, tendo todas o mesmo ponto de partida, Deus não cria umas melhor dotadas que outras, o que é conforme à soberana justiça. Presidindo uma perfeita igualdade à sua formação, elas progridem mais ou menos rapidamente, em virtude de seu livre-arbítrio e conforme o seu trabalho. Assim, Deus deixa a cada uma o mérito e o demérito de seus atos, e a responsabilidade cresce à medida que se desenvolve o senso moral. De sorte que, de duas almas criadas ao mesmo tempo, uma pode chegar ao objetivo mais depressa que a outra, se trabalhar mais ativamente por sua melhoria; mas as que ficaram na retaguarda chegarão igualmente, embora mais tarde e depois de rudes provas, porque Deus não interdita o futuro a nenhum de seus filhos.

“A encarnação da alma num corpo material é necessária ao seu aperfeiçoamento; pelo trabalho necessário à existência corporal, desenvolve-se a inteligência. Não podendo adquirir, numa única existência, todas as qualidades morais e intelectuais que a devem conduzir ao objetivo, ela aí chega passando por uma série ilimitada de existências, quer na Terra, quer em outros mundos, em cada uma das quais dá um passo na via do progresso e se despoja de algumas imperfeições. Em cada existência traz a alma o que adquiriu nas existências precedentes. Assim se explica a diferença existente nas aptidões inatas e no grau de aditamento das raças e dos povos (Vide Espírito, reencarnação).”


Allan Kardec.



Paris. — Typ. de Cosson et Comp., rue du Four-Saint-Germain,  †  43.


[1] [Nouveau dictionnaire universel - Google Books. Veja também do mesmo autor: Dictionnaire universel - Google Books.]


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