O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano VIII — Dezembro de 1865.

(Idioma francês)

Modo de protesto de um espírita contra os ataques de certos jornais.

(Sumário)


1. — Um de nossos correspondentes nos escreve o seguinte:

“Eis o que escrevi, há dois anos, ao Sr. Nefftzer,  †  diretor do jornal le Temps:

“Eu era assinante de vosso jornal, cujas tendências e opiniões me eram simpáticas. É, pois, com pesar que não prossigo a assinatura. Permiti vos dê os motivos. Em vosso número de 3 de junho, vos esforçáveis em lançar o ridículo sobre o Espiritismo e os espíritas, narrando uma história mais ou menos autêntica, sem citar nomes, datas e lugares, o que é cômodo. Procuráveis estabelecer, tema hoje obrigatório dos materialistas, incomodados imensamente pelo Espiritismo, que essa crença leva à loucura. Sem dúvida, espíritos fracos, já tendo tendências para uma perturbação das faculdades cerebrais, puderam perder a cabeça inteiramente, ao se ocuparem do Espiritismo, como lhes teria acontecido sem isto, e como acontece aos que se ocupam de Química, de Física ou de Astronomia,.e mesmo a escritores que não acreditam nos Espíritos. Também não nego que não haja charlatães que exploram o Espiritismo, porque qual a ciência que possa escapar ao charlatanismo? Não temos charlatães literários, industriais, agrícolas, militares, políticos, sobretudo destes últimos? Mas concluir daí contra o Espiritismo em geral é pouco lógico e pouco sensato. Antes de lançar uma acusação dessa natureza, seria preciso, ao menos, conhecer a coisa de que se fala; no mais das vezes, porém, é a menor preocupação de quem escreve. Cortam e decidem a torto e a direito, o que é mais fácil do que aprofundar e aprender.

“Se alguma vez experimentardes grandes desgraças, vivas dores, crede-me, senhor, estudai o Espiritismo; somente nele encontrareis a consolação e as verdades que vos farão suportar vossos desgostos, vossos desenganos ou vossos desesperos, o que será preferível ao suicídio. Que nos queríeis dar mais que esta bela e consoladora filosofia cristã? O culto dos interesses materiais, do bezerro de ouro? É talvez o que convém ao temperamento da generalidade dos felizardos de hoje, mas é preciso outra coisa para os que não mais querem o fanatismo, a superstição, as práticas ridículas e grosseiras da Idade Média, nem o ateísmo, o panteísmo e a incredulidade sistemática dos séculos dezoito e dezenove.

“Permiti-me, senhor, vos aconselhar a ser mais prudente em vossas diatribes contra o Espiritismo, porque hoje elas se dirigem, só na França, a algo em torno de trezentas ou quatrocentas mil pessoas.”


Blanc de Lalésie.

Proprietário em Genouilly,  †  perto de Joncy.  †  (Saône-et-Loire.)


“Há poucos dias os jornais nos informaram da morte do filho único do Sr. Nefftzer. Não sei se essa desgraça o terá feito lembrar-se de minha carta.

“Acabo de enviar ao Sr. Émile Aucante, administrador do jornal Univers illustré, a seguinte carta:

“Há dezoito meses sou assinante do Univers illustré e, desde essa época, quase não há números em que o vosso cronista, sob o pseudônimo de Gérôme, não tenha julgado útil, para ocupar sua pena, zombar do Espiritismo e dos espíritas de todos os modos possíveis. Até aí essa diversão, um tanto fastidiosa por sua frequência, é muito inocente: O Espiritismo não vai mal por isto. Mas o Sr. Gérôme, sem dúvida percebendo que pouco se inquietam com suas pilhérias, muda de linguagem e, no número de 7 de outubro, trata todos os espíritas, em bloco, de idiotas; da zombaria passa à injúria e não teme insultar milhares de pessoas tão instruídas, tão esclarecidas e tão inteligentes quanto ele, porque creem ter uma alma imortal e pensam que essa alma, numa outra vida, será recompensada ou punida conforme seus méritos ou deméritos. O Sr. Gérôme não tem semelhantes preconceitos. Irra! Sem dúvida crê que come, bebe, reproduz sua espécie, nem mais nem menos do que meu cachorro ou meu cavalo. Rendo-lhe meus cumprimentos.

“Se o Sr. Gérôme se dignasse receber um conselho, eu me permitiria exortá-lo a só falar de coisas que conhece e a calar-se em relação às que não conhece ou, pelo menos, a estudá-las, o que lhe seria fácil, com sua alta e incontestável inteligência. Ele aprenderia aquilo que certamente nem desconfia: que o Espiritismo é o Cristianismo desenvolvido, e que as manifestações dos Espíritos são de todos os tempos e nada representam para a doutrina, que não deixaria de existir, com ou sem manifestações.

“Mas, por que falo de Espíritos a um homem que só acredita no seu e talvez ignore se tem uma alma? Que o Sr. Gérôme seja envolvido na bandeira do materialismo, do panteísmo ou do paganismo – este último seria melhor, porque nele ao menos se acreditava na existência da alma e da vida futura – pouco importa! Mas que ele saiba, respeitando-se a si mesmo, respeitar a crença de seus leitores. É evidente que não me seria possível continuar dando dinheiro para me deixar insultar; se essas injúrias continuarem, lamento ser obrigado a deixar de ser vosso assinante…”


2. — O Sr. de Lalésie é modesto ao avaliar o número de espíritas da França em trezentos ou quatrocentos mil. Teria podido dobrar esta cifra sem cometer exagero e ainda estaria muito abaixo dos cálculos do autor de uma brochura que pretendia pulverizar-nos e a elevava a vinte milhões. [Vide: O orçamento do Espiritismo.] Aliás, um recenseamento exato dos espíritas é coisa impossível, uma vez que não estão arregimentados, nem formam uma corporação, uma afiliação ou uma congregação, cujos membros são registrados e podem ser contados.


3. — O Espiritismo é uma crença. Quem quer que creia na existência e na sobrevivência das almas e na possibilidade das relações entre os homens e o mundo espiritual, é espírita, e muitos o são intuitivamente, sem jamais terem ouvido falar de Espiritismo nem de médiuns. É-se espírita por convicção, como outros são incrédulos; para isto, não basta fazer parte de uma sociedade, e a prova é que nem a milésima parte dos adeptos frequentam as reuniões. Para fazer a sua contagem não há nenhum registro-matrícula a consultar; seria preciso fazer um inquérito junto a cada indivíduo e lhe perguntar o que pensa. Através da conversa se descobrem, todos os dias, pessoas simpáticas à ideia e que, só por isto, são espíritas, sem que haja necessidade de possuir diploma ou de fazer um ato público qualquer. Seu número cresce diariamente; o fato é constatado por nossos próprios adversários, que reconhecem com pavor que esta crença invade todas as camadas da sociedade, de alto a baixo da escala. É, pois, uma opinião com a qual se deve contar hoje, e que tem a particularidade de não se circunscrever a uma classe, nem a uma casta, nem a uma seita, nem a uma nação, nem a um partido político. Tem representantes em toda parte, nas letras, nas artes, nas ciências, na Medicina, na magistratura, na ordem dos advogados, no exército, no comércio, etc.

Na França o número de espíritas seguramente ultrapassa de muito o dos assinantes de todos os jornais de Paris. É evidente que eles entram em notável parte entre os mesmos assinantes. É, pois, a estes que pagam que os senhores jornalistas dizem injúrias. Ora, como diz com razão o Sr. de Lalésie, não é agradável dar seu dinheiro para ser ridicularizado e injuriado. Por isto cancelou a assinatura dos jornais onde se via maltratado em sua crença, e ninguém deixará de achar muito lógica sua maneira de agir.

Significa dizer que para agradar os espíritas os jornais devem adotar suas ideias? Absolutamente. Todos os dias eles discutem opiniões de que não partilham, mas não injuriam os que as professam. Esses escritores não são judeus e, no entanto, não se permitem lançar o anátema e o desprezo sobre os judeus em geral, nem ridicularizar sua crença. Por que isto? Porque, dizem, deve-se respeitar a liberdade de consciência. Por que, então, não existiria essa liberdade para os espíritas? Não são cidadãos como todo o mundo? Reclamam exceções e privilégios? Só pedem uma coisa: direito de pensar como entenderem. Os que inscrevem em sua bandeira: Liberdade, igualdade, fraternidade, quereriam então criar na França uma classe de párias?


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