1. — Citamos pura e simplesmente a passagem dessa pastoral concernente ao Espiritismo, sem comentários e reflexões. Ao dar sua opinião a respeito, do ponto de vista teológico, o Sr. bispo está no seu direito e, desde que só ataca a coisa e não as pessoas, nada há a dizer. Só haveria que discutir sua teoria, o que já foi feito tantas vezes, sendo supérfluo repetir-se, tanto mais quando não encontramos nenhum argumento novo. Nós a submetemos aos nossos leitores, a fim de que todos possam tomar conhecimento e tirar o proveito que bem entenderem.
“O demônio oculta-se de todas as formas possíveis, para eternizar sua conspiração contra Deus e os homens, para continuar sua obra de sedução. No paraíso ele se disfarçou de serpente; se for preciso, ou se puder contribuir para a realização de seus projetos, transformar-se-á em anjo de luz, como o provam mil exemplos consignados na História.
“Em época mais recente, o demônio chegou a retirar do arsenal do inferno armas usadas e cobertas de ferrugem, de que se havia servido em tempos mais recuados, particularmente no segundo e terceiro séculos, para combater o Cristianismo. As mesas girantes, os Espíritos batedores, as evocações, etc., são outros tantos artifícios, e Deus os permite para castigo dos homens ímpios, curiosos e levianos. Se os maus gênios, como o asseguram as santas Escrituras, saturam o ar; se se unem aos homens em seus corpos e em suas almas (vede o livro de Job e muitas outras passagens da Escritura); se podem fazer falar um pau, uma pedra, uma serpente, cabras, uma jumenta; se, perto do lago de Genesaré † recebem, a seu próprio pedido, permissão de entrar em animais imundos, também lhes é possível falar por meio das mesas, escrever com o pé de uma mesa ou de uma cadeira, adotar a linguagem e imitar a voz dos mortos e ausentes, contar coisas que nos são desconhecidas ou que nos pareçam impossíveis, mas que, como Espíritos, podem ver e ouvir. Infelizes, pois, os insensatos, ociosos, imprevidentes e criminosamente discretos, que buscam seu passa-tempo nesse malabarismo diabólico, que não temem recorrer a meios supersticiosos e proibidos, para chegarem ao conhecimento do futuro e de outros mistérios que o demônio ignora ou só conhece imperfeitamente! Quem ama o perigo perecerá no perigo; quem brinca com serpentes venenosas não escapará de seu dardo mortífero; quem se precipita nas chamas será reduzido a cinzas; quem busca a sociedade dos mentirosos e dos velhacos, necessariamente se tornará sua vítima. É um comércio com os anjos maus, ao qual os profetas do Antigo Testamento dão um nome que não se leva de boa vontade a um púlpito cristão. Quando se fazem essas evocações, o Espírito maligno bem poderá dizer, inicialmente, uma ou outra verdade, e falar conforme o desejo dos curiosos, a fim de lhes ganhar a confiança. Mas as pessoas impacientes de penetrar mistérios são seduzidas, deslumbradas; então se aproxima de seus lábios a taça envenenada; enchem-nas com toda a sorte de mentiras e de impiedades, despojam-nas de todos os princípios cristãos, de todos os sentimentos piedosos. Feliz o que percebe a tempo que caiu em mãos diabólicas e pode, com o auxílio de Deus, resistir aos laços com que ia ser carregado!…”
2. — Enquanto os nossos antagonistas ficarem no terreno da discussão teológica, convidamos os irmãos que nos queiram escutar a abster-se de qualquer recriminação, porque a liberdade de opinião tanto deve existir para eles quanto para nós. O Espiritismo não se impõe: aceita-se; dá as suas razões e não acha mau que as combatam, desde que seja com armas leais, confiando no bom-senso do público para decidir. Se repousar na verdade, triunfará a despeito de tudo; se seus argumentos forem falsos, a violência não os tornará melhores. O Espiritismo não quer ser acreditado sob palavra; quer o livre exame; sua propaganda se faz dizendo: vede os prós e os contras; julgai o que melhor satisfaz o vosso julgamento, o que corresponde melhor às vossas esperanças e aspirações, o que mais vos toca o coração, e decidi-vos com conhecimento de causa.
Censurando nos adversários a inconveniência de palavras e o personalismo, os espíritas não devem incorrer na mesma falta; a moderação mostrou seu valor; nós os instamos a que não fujam disto. Em nome dos princípios espíritas e no interesse da causa, não nos solidarizamos com polêmicas agressivas e inconvenientes, venham de onde vierem.
Ao lado de alguns fatos lamentáveis, como o de Marmande, † poderíamos citar um bom número de outros de caráter diverso, se não temêssemos contrariar os seus autores, razão por que só fazemos com a maior reserva.
Uma senhora que conhecemos pessoalmente, bom médium e, como o marido, fervorosa espírita, estava, há seis meses, à beira da morte; hauria na crença e na fé no futuro uma consoladora resignação nesse momento supremo, que via aproximar-se sem medo. A seu pedido, o cura da paróquia, ancião respeitável, lhe veio administrar os sacramentos. Disse ela: “Sabeis que somos espíritas. A despeito disto, dar-me-eis os sacramentos da Igreja? – Por que não? respondeu o bom cura; esta crença vos consola; torna-vos a ambos piedosos e caridosos. Não vejo mal nisso. Conheço O Livro dos Espíritos. Não direi que me tenha convencido em todos os pontos, mas contém a moral que todo cristão deve seguir e não vos censuro por o ler. Apenas se há bons Espíritos, também os há maus. É contra estes que vos deveis resguardar e vos empenhar em distinguir. Aliás, vede, minha filha, a verdadeira religião consiste na prece de coração e na prática das boas obras. Tendes fé em Deus, orais com fervor, assistis o vosso próximo tanto quanto podeis; posso, pois, vos dar a absolvição.”