Eis-me ainda no teatro do mundo, eu que me julgava para sempre amortalhada no meu véu de inocência e de juventude. O fogo da Terra salvou-me do fogo do inferno: assim pensava em minha fé católica e, se não ousava entrever os esplendores do paraíso, minha alma vacilante se refugiava na expiação do purgatório e eu orava, sofria, chorava. Mas quem dava à minha fraqueza a força de suportar as angústias? quem, nas longas noites de insônia e de febre dolorosa, se debruçava sobre o meu leito de martírio? quem me refrescava os lábios áridos? Éreis vós, meu anjo guardião, cuja branca auréola me cercava; éreis também vós, caros Espíritos amigos, que vínheis murmurar em meu ouvido palavras de esperança e de amor.
A chama que consumiu meu débil corpo despojou-me do apego ao que passa; assim, morri já viva da verdadeira vida. Não conheci a perturbação e entrei serena e recolhida no dia radioso que envolve os que, depois de muito sofrimento, esperaram um pouco. Minha mãe, minha cara mãe, foi a última vibração terrestre que ressoou em minha alma. Como gostaria que ela se tornasse espírita!
Desliguei-me da árvore terrena como um fruto que amadurecesse antes do tempo. Mal tinha aflorado para o demônio do orgulho, que fere as almas das infelizes arrastadas pelo sucesso brilhante e pela embriaguez da juventude. Bendigo a chama; bendigo os sofrimentos; bendigo a prova, que era uma expiação. Semelhante a esses leves fios brancos do outono, flutuo arrastada na corrente luminosa; já não são as estrelas de diamante que brilham em minha fronte, mas as estrela de ouro do bom Deus.
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Nota. – Nossa intenção tinha sido evocar nessa sessão este Espírito, ao qual, sabíamos, muitos dentre nós eram simpáticos. Razões particulares nos haviam levado a adiar essa evocação, da qual não havíamos conversado com ninguém. Mas o Espírito, certamente atraído pelo nosso e pelo pensamento de vários membros, veio espontaneamente, sem ser chamado, ditar a encantadora comunicação acima.