A religião católica nos mostra o purgatório como um lugar onde a alma, sofrendo terríveis expiações, alivia suas faltas e, pela dor, pouco a pouco reivindica seus direitos ao sol da vida eterna. Imagem esplêndida! a mais verdadeira, a mais perfeita da grande trindade dogmática do inferno, do purgatório e do paraíso. Malgrado suas severidades desesperadoras, compreendeu a Igreja que era preciso um meio-termo entre a danação eterna e a felicidade eterna. Nessa estranha combinação, entretanto, ela confundiu o tempo infinito e progressivo, que é apenas um, com três situações limitadas e incompreensíveis. À religião, ou antes, ao ensino inteiramente humanitário e progressivo do Cristo, o Espiritismo adiciona os meios de realizar esta humanidade ideal. Nos desvios filosóficos de nossa época, há mais de um germe espírita; e tal filósofo céptico, que não aconselha para a felicidade definitiva da Humanidade senão o afastamento e a destruição de toda crença humana e divina trabalha mais do que se pensa para a tendência universal do Espiritismo. Somente é uma rota em que o céu pouco aparece, a existência futura quase não aparece, mas onde, pelo menos, a tranquilidade material e, por assim dizer, egoística desta vida é compreendida com a clareza do legislador e, se não do santo, pelo menos de um filantropo humanitário.
Ora, no estado latente, a bem dizer, da vida extracorpórea, e que poderia ser chamada intravital, tratar-se-ia de saber se, com a medida de conhecimentos e de sagacidade clarividente que possuem os Espíritos superiores, o progresso universal é tão eficaz quanto o progresso terrestre. Esta questão, fundamental para o Espiritismo até o presente, é resolvida por detalhes que não satisfazem. Já não é apenas, como diz a Igreja, um lugar de expiação, mas um foco universal onde as almas que aí circulam receiam angustiadas ou aceitam esperançosas as existências que se lhes desvelam. Aí está, segundo nós, apenas o começo do que se chama o purgatório. A erraticidade, esta fase importante da vida da alma, não nos parece de modo algum explicada, nem mesmo mencionada pelos dogmas católicos.
Lamennais. n
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[v. Lamennais.]