Ainda uma palavra sobre os espectros artificiais e ao Sr. Oscar Comettant.
1. — A revista hebdomadária do Siècle de 12 de julho de 1863, trazia o seguinte parágrafo:
“Fora destas questões importantes, outras há, de ordem diversa, e que também não podem ser negligenciadas, entre as quais a questão tão expressiva dos espectros. Vistes os espectros? Há cerca de oito dias o espectro é o único assunto a distrair um pouco as conversas. Assim, cada teatro tem os seus, espectros de honestos velhacos que roubaram, pilharam, assassinaram e que retornam, sombras impalpáveis, a passear à meia-noite, no quinto ato de um drama fortemente planejado. Este segredo do espectro, ou, para falar a linguagem dos bastidores, este truque, dizem, tão caro a um inglês, é de uma simplicidade tão elementar, que todos os teatros têm tido seus espectros no mesmo dia, este mais caro que aquele. Depois do teatro o espectro passou ao salão, onde faz as alegres noitadas dos senhores e senhoras, excitadíssimos por essa amável espectromania. Eis uma diversão que chega na hora certa para explicar muitos prodígios, e quero falar, sobretudo, dos prodígios do Espiritismo. Muito se tem falado desses espíritas que evocam os mortos, os quais, na intimidade, são mostrados a crentes apavorados. Com o auxílio de um simples truque, pode fazer-se a mesma tarefa sem passar por grande feiticeiro. Esta evocação geral dos espectros dá um golpe funesto no maravilhoso, hoje que está provado que não é mais difícil fazer aparecerem fantasmas do que pessoas em carne e osso. O próprio Sr. Home em pessoa já deve ter perdido setenta e cinco por cento da estima de suas numerosas admiradoras.
“O ideal vira pó ao toque do real. O real é o truque.”
Edmond Texier.
2. — Tínhamos razão em dizer, a propósito deste novo processo fantasmagórico, que os jornais não deixariam de falar do Espiritismo. Já o Indépendence belge tinha expressado sua viva satisfação, exclamando: “Como os espíritas vão se sair desta?” Diremos simplesmente a esses senhores que se informem de como se porta o Espiritismo. O que mais claramente ressalta desses artigos é, como sempre, a prova da mais completa ignorância do assunto que atacam. Efetivamente, é preciso não saber quase nada para crer que os espíritas se reúnem para fazer aparecerem fantasmas. Ora, o mais estranho é que jamais os vimos, nem mesmo nos teatros, embora, no dizer desses senhores, estejamos grandemente interessados na questão.
O Sr. Robin, o prestidigitador citado em nosso precedente artigo do mês de julho, vai mais longe: não é só o Espiritismo que ele pretende demolir, mas a própria Bíblia. Em sua alocução quotidiana aos seus espectadores, afirma que a aparição de Samuel a Saul se deu pelo mesmo processo que o seu. Não imaginávamos que a ciência da óptica estivesse tão adiantada naquela época, entre os hebreus, que não passavam por muito cultos. Sendo assim, foi sem dúvida também por meio de algum truque que Jesus apareceu a seus discípulos.
Não produzindo os falsos espectros o resultado esperado, sem dúvida logo veremos surgir algum novo estratagema. Eles terão seu tempo, como tudo quanto tem como resultado apenas satisfazer a curiosidade; esse tempo talvez seja mais curto do que se pensa, porque a gente se cansa depressa do que nada deixa no espírito. Assim, os teatros farão bem os aproveitando, enquanto têm o privilégio de atrair a multidão pela sedução da novidade. Sua aparição sempre terá tido a vantagem de fazer falar do Espiritismo e de espalhar sua ideia. Como qualquer outro, era um meio de estimular muita gente a se inquirir da verdade.
3. — Que diremos nós do folhetim do Sr. Oscar Comettant sobre o livro do Sr. Home, publicado no Siècle de 15 de julho de 1863? Nada, senão que é a melhor propaganda para fazer vender a obra, do que se aproveitará o Espiritismo [Vide: Revelações sobre minha vida sobrenatural, por D. D. Home]. É útil que, de tempos em tempos, haja estas chicotadas, para despertar a atenção dos indiferentes. Se o artigo não é espírita nem espiritualista, é, ao menos, espirituoso? Deixamos a outros o cuidado de se pronunciarem.
Há, entretanto, algo de bom nesse artigo: é que o autor, a exemplo de vários de seus confrades, cai sem dó nem piedade sobre os que fazem profissão da faculdade mediúnica; censura com justa severidade os abusos daí resultantes, e assim contribui para os desacreditar, do que o Espiritismo sério não poderia lamentar-se, já que ele próprio repudia toda exploração deste gênero como indigna do caráter exclusivamente moral do Espiritismo e como um golpe ao respeito que se deve aos mortos. Erra o Sr. Comettant ao generalizar o que seria, quando muito, uma rara exceção e, sobretudo, identificar os médiuns com os prestidigitadores, os que deitam cartas, os ledores da sorte, os saltimbancos, porque viu saltimbancos tomar o nome de médiuns, como se veem charlatães se fazendo passar por médicos. Ele parece ignorar que há médiuns entre os membros das famílias das mais altas classes; que os há mesmo entre certos escritores de renome, tidos em grande estima por ele próprio e seus amigos; que é notório que a Sra. Émile de Girardin era um excelente médium. Teríamos curiosidade de saber se ele ousaria dizer-lhes na face que são farsistas.
Se os que assim falam se dessem ao trabalho de estudar antes de falar, saberiam que o exercício da mediunidade exige um profundo recolhimento, incompatível com a leviandade de caráter e a algazarra dos curiosos e que nada de sério se deve esperar nas reuniões públicas. O Espiritismo desaprova toda experiência de mera curiosidade, realizada com o propósito de diversão, pois que se não deve distrair com essas coisas. Os Espíritos, isto é, a alma dos que deixaram a Terra, dos nossos parentes e amigos, o que nada tem de divertido, vêm nos instruir e moralizar, e não distrair os ociosos; não vêm predizer o futuro, nem descobrir segredos ou tesouros ocultos; vêm ensinar-nos que há uma outra vida, e como nos devemos conduzir para nela sermos felizes, o que, para certa gente, é pouco recreativo. Mesmo que se não acredite na alma e na sobrevivência dos que nos foram caros, é sempre descabido expor ao ridículo essa crença, ainda que por respeito à sua memória. O Espiritismo também nos ensina que os Espíritos não estão às ordens de ninguém; que vêm quando querem e com quem querem; que quem quer que pretenda tê-los à sua disposição e os governar à vontade, pode, com toda a razão, passar por ignorante ou charlatão; que tanto é ilógico quanto irreverente admitir que os Espíritos sérios se submetam ao capricho do primeiro que chegue e os pretenda evocar, a qualquer hora e a tanto por sessão, para lhes fazer representar um papel de comparsa; que há mesmo um sentimento instintivo de repugnância ligado à ideia de que a alma do ser que se chora venha a troco de dinheiro.
4. — Por outro lado, é princípio consagrado pela experiência que os Espíritos não se comunicam facilmente, nem de boa vontade, por certos médiuns; que entre estes últimos os há absolutamente repulsivos a certos Espíritos, o que se compreende facilmente quando se conhece a maneira pela qual se opera a comunicação, pela assimilação de fluidos. Pode, pois, entre o Espírito e o médium, haver atração ou repulsão, conforme o grau de afinidade simpática. A simpatia é fundada sobre as similitudes morais e a afeição. Ora, que simpatia pode ter o Espírito por um médium que só o chama por dinheiro?
Talvez digam que o Espírito vem para a pessoa que o chama e não pelo médium, que não passa de um instrumento. De acordo; mas nem por isso são menos necessárias as condições fluídicas, essencialmente modificadas pelos sentimentos morais e pelas relações pessoais entre o Espírito e o médium. Esta a razão por que não há um só médium que se possa vangloriar de comunicar-se indistintamente com todos os Espíritos, dificuldade capital para aquele que os quisesse explorar. Eis o que ensinamos ao Sr. Comettant, uma vez que o ignora, e que destrói as assimilações que ele pretende estabelecer. A mediunidade real é uma faculdade preciosa, que adquire tanto mais valor quanto mais é empregada para o bem e é exercida religiosamente e com total desinteresse, moral e material. Quanto à mediunidade simulada ou abusiva, seja no que for, nós a entregamos a todas as severidades da crítica. Seria ignorar os mais elementares princípios do Espiritismo imaginar que este se constitui o seu defensor e que a repressão legal de um abuso, caso ocorresse, fosse um choque. Nenhuma repressão poderia atingir os médiuns que não fizessem profissão de sua faculdade e não se afastassem da via moral que lhes é traçada pela doutrina. As armas que os abusos fornecem aos detratores, sempre ávidos em aproveitar as ocasiões para censurar, mesmo as inventar quando não existem, fazem ressaltar mais ainda, aos olhos dos espíritas sinceros, a necessidade de mostrar que não há nenhuma solidariedade entre a verdadeira doutrina e os que a parodiam.