O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

Índice |  Princípio  | Continuar

Revista espírita — Ano IV — Novembro de 1861.

(Idioma francês)

Banquete oferecido ao Sr. Allan Kardec pelos espíritas bordeleses.

(Sumário)


1. Discurso e brinde do Sr. Lacoste, negociante.


Senhores,

Rogo principalmente à juventude, que me ouve, a bondade de prestar atenção às poucas palavras de fraterna afeição, escritas especialmente para ela. A falta de experiência, a conformidade de nossas idades, e a comunhão de nossas ideias me asseguram a sua indulgência.

Nenhum de nós, senhores, acolheu com indiferença a revelação desta santa doutrina, cujos elementos novos foram recolhidos por nosso venerado mestre num livro sábio. Em tempo algum campo mais vasto foi aberto às nossas imaginações; jamais horizonte mais grandioso foi desvendado às nossas inteligências. É com o ardor da mocidade, é sem olhar para trás que nos tornamos adeptos da fé no futuro e pioneiros da civilização futura. Não permita Deus que eu venha proferir palavras de desânimo! Vossas crenças me são muito conhecidas, senhores, e as sei muito sólidas para crer que a zombaria ou o falso raciocínio de alguns adversários as venham abalar. A juventude é rica em privilégios, fácil às nobres emoções e ardente no empreendimento; possui ainda o entusiasmo da fé, essa alavanca moral que levanta os mundos. Mas se sua imaginação a empurra além dos obstáculos, ela lhe faz muitas vezes ultrapassar o objetivo. É contra esses desvios que vos exorto a vos acautelardes. Entregues a vós mesmos, atraídos pelo encanto da novidade, levantando a cada passo a ponta do véu que vos ocultava o desconhecido, quase que tocando o dedo na solução do eterno problema das causas primeiras, guardai-vos de vos deixar inebriar pelas alegrias do triunfo. Poucos caminhos estão isentos de precipícios; a maior confiança segue sempre caminhos fáceis, e nada é mais difícil de obter dos jovens soldados, como das inteligências jovens, do que a moderação na vitória. Aí está o mal que temo para vós, como receio para mim.

Felizmente o remédio está perto do mal. Há entre nós, aqui reunidos, alguns que, à maturidade da idade e do talento, aliam a feliz vantagem de terem sido, em nossa cidade, propagadores esclarecidos do ensino espírita. É a esses Espíritos mais calmos e mais refletidos que deveis submeter a direção dos vossos estudos e, graças a essa deferência de todos os dias, graças a essa subordinação moral, ser-vos-á dado trazer à construção do edifício comum uma pedra que não oscilará.

Saibamos, pois, senhores, vencer as questões pueris do amor-próprio. Nossa parte à nossa juventude, não é tão bela? Efetivamente, a nós pertence o futuro; a nós que poderemos assistir, cheios de vida e de fé, quando nossos pais em Espiritismo reviverem num mundo melhor, à esplêndida radiação desta verdade, da qual eles não terão entrevisto na Terra senão a misteriosa aurora.

Deixai-me, pois, esperar, senhores, que possais dizer comigo, e do fundo do coração:

A todos os nossos decanos de idade; a todos os que, conhecidos ou não, sob a casaca do rico ou o avental do operário, fizeram-se adeptos e propagadores da Doutrina Espírita, em Bordeaux!  †  À prosperidade da Sociedade Espírita de Paris,  †  dessa Sociedade que empunha tão alto e com tanta firmeza o estandarte sob o qual aspiramos a nos colocar! Que o Sr. Allan Kardec, nosso mestre comum, receba por nossos irmãos de Paris o penhor de uma profunda simpatia; que ele lhes diga que os nossos jovens corações batem em uníssono e que, embora com passo menos seguro, nem por isso deixamos de concorrer para a regeneração universal, estimulados por seus exemplos e sucessos!


2. BRINDE DO SR. SABÒ.


Mais uma vez, senhores, os Espíritos querem nos assegurar de que podemos conquistar a sua simpatia unindo os seus aos nossos desejos para a prosperidade desta santa doutrina, que é a sua obra. O Espírito Ferdinand, um de nossos guias protetores, ditou espontaneamente o seguinte ensinamento, que me deixa feliz em vo-lo transmitir:


“A grande família espírita, da qual fazeis parte, vê aumentar diariamente o número de seus filhos e, em breve, não haverá mais em vossa bela pátria, nem cidades, nem povoados onde não se tenha estabelecido a tenda dos membros desta tribo abençoada por Deus.

“f á nos seria impossível assinalar os numerosos centros que gravitam em torno do foco luminoso cuja sede é Paris, porque os centros das grandes cidades só por nós são conhecidos. Entre estes se distingue, pelo saber, inteligência e união fraternal, a Sociedade dos Espíritas de Metz;  †  está destinada a dar frutos em abundância e, se buscardes com eles estabelecer relações amigáveis, baseadas numa estima recíproca, enchereis de doce alegria o coração paternal de vosso chefe aqui presente.

“O eminente Espírito Erasto vos disse ontem: Sede unidos; a união faz a força. Envidai, pois, todos os esforços para o conseguir, a fim de que, em pouco tempo, todos os centros espíritas franceses, unidos entre si pelos laços da fraternidade, possam marchar a passos de gigante pela via traçada.”


Ferdinand.

Guia espiritual do médium.


Finalmente, e como fiel intérprete dos sentimentos expressos por esse bom Espírito, proponho um brinde aos nossos irmãos de Metz, em particular, e a todos os espíritas franceses, em geral.


Senhores,

Convencido de que as calorosas palavras, pronunciadas ontem em vosso meio pelo nosso honrado chefe espírita, não caíram sobre pedras e espinheiros, mas nos vossos corações, agora dispostos a apertar os laços da fraternidade, venho propor um brinde aos nossos irmãos espíritas de Lyon.  †  Eles começaram suas tarefas antes de nós e, para se organizarem, tiveram de passar pelas mesmas dificuldades que outrora tanto nos fizeram sofrer. Mas, graças ao impulso que o nosso bem-amado chefe lhes proporcionou no ano passado, deram um passo imenso na estrada abençoada em que os bons Espíritos estão fazendo entrar a Humanidade. Imitemo-los, senhores. Que uma louvável emulação una aos de Bordeaux  †  os espíritas de Lyon, a fim de que a comunhão de pensamentos e sentimentos, de que todos estiverem animados, deles faça dizer: bordeleses e lioneses são irmãos.

Proponho um brinde à união dos irmãos de Bordeaux e Lyon.


3. DISCURSO DO SR. DESQUEYROUX, MECÂNICO.

Em nome do grupo de operários.

Senhor Allan Kardec, nosso caro mestre,

Em nome de todos os operários espíritas de Bordeaux, meus amigos e irmãos, permito-me erguer um brinde à vossa prosperidade. Embora já chegado a uma alta perfeição, que Deus vos faça crescer ainda nos bons sentimentos que vos têm animado até hoje e, sobretudo, vos faça crescer aos olhos do Universo e no coração dos que, seguindo vossa doutrina, se aproximam de Deus.

Nós, que somos do número dos que a professam, vos bendizemos do fundo do coração e rogamos ao nosso Criador para que vos deixe ainda muito tempo entre nós, a fim de que, quando vossa missão estiver terminada, já estejamos bastante firmes na fé para nos conduzirmos sozinhos, sem nos afastar do bom caminho.

Para nós é uma felicidade inefável ter nascido numa época em que podemos ser esclarecidos pelo Espiritismo. Mas não basta conhecer e desfrutar essa felicidade; com a doutrina, contraímos compromissos que consistem em quatro deveres diferentes: dever de submissão, que nos faça ouvir com docilidade; dever de afeição, que nos faça amar com ternura; dever de zelo, para atender seus interesses com ardor; dever de prática, que nos faça honrá-la por nossas obras.

Estamos no seio do Espiritismo e o Espiritismo é para nós uma firme consolação em nossas penas. Não podemos negar que há momentos na vida em que a razão talvez pudesse nos sustentar, mas outros há em que se tem necessidade de toda fé que dá o Espiritismo, para não sucumbir. Em vão os filósofos vêm pregar uma firmeza estóica, enunciar suas pomposas máximas, dizer-nos que nada os perturba, que o homem é feito para se possuir a si mesmo e dominar os acontecimentos da vida. Tristes consolações! Longe de suavizar a dor, eles a tornam mais amarga; em todas as suas palavras só encontramos o vazio e a esterilidade. Mas o Espiritismo nos vem em socorro, provando que nossa própria aflição pode contribuir para a nossa felicidade.

Sim, caro mestre, continuai vossa augusta missão. Continuai a nos mostrar esta ciência, que vos é ditada pela bondade divina, nosso consolo durante a vida e pensamento inabalável que nos sustentará por ocasião da morte.

Recebei, caro mestre, estas poucas palavras, brotadas do coração de vossos filhos, porquanto sois o pai de todos nós; pai da classe laboriosa e dos aflitos. Como bem o sabeis, progresso e sofrimento marcham juntos; mas, quando o desespero oprimia os nossos corações, viestes trazer-nos força e coragem. Sim, ao nos mostrardes o Espiritismo, dissestes: “Irmãos, coragem! Suportai corajosamente as provas que vos são enviadas, e Deus vos bendirá”. Sabei, pois, que somos apóstolos devotados e que neste século, como nos que se seguirão, vosso nome será abençoado pelos nossos filhos e pelos nossos amigos operários.


4. DISCURSO E BRINDE DO SR. ALLAN KARDEC.


Meus caros irmãos no Espiritismo,

Faltam-me expressões para externar o que sinto por vossa acolhida tão simpática e benevolente. Permiti-me, pois, dizer em algumas palavras e não em longas frases, que não acrescentariam mais, que incluirei minha primeira estada em Bordeaux entre os mais felizes momentos de minha vida, e dela guardarei eterna lembrança. Mas também não esquecerei, senhores, que esta acolhida me impõe uma grande responsabilidade — a de justificá-la — o que espero fazer com a ajuda de Deus e dos bons Espíritos. Além disso, ela me impõe grandes obrigações, não só para convosco, mas ainda para com os espíritas de todos os países, dos quais sois representantes como membros da grande família; para com o Espiritismo em geral, que acabais de aclamar nestas duas reuniões solenes e que, não tenhais dúvida, colherá no entusiasmo de vossa importante cidade uma força nova para lutar contra os obstáculos que quererão lançar em vosso caminho.

Em minha alocução de ontem, falei de sua força irresistível, de que sois a prova evidente. Não é um fato característico a inauguração de uma sociedade espírita que, como a vossa, se inicia pela reunião espontânea de quase trezentas pessoas, atraídas, não por uma vã curiosidade, mas pela convicção e pelo só desejo de se agrupar num único feixe? Sim, senhores, este fato não somente é característico, como providencial. Eis, a respeito, o que ainda ontem me dizia, antes da sessão, o Espírito de Verdade — meu guia espiritual:

“Deus marcou com o selo de sua imutável vontade a hora da regeneração dos filhos desta grande cidade. À obra, pois, com confiança e coragem. Esta noite os destinos de seus habitantes vão começar a sair da rotina das paixões, que sua riqueza e seu luxo faziam germinar, como o joio em meio ao trigo, para alcançar, pelo progresso moral que lhe vai imprimir o Espiritismo, a altura dos destinos eternos. Como vês, Bordeaux é uma cidade amada pelos Espíritos, pois multiplica intramuros, sob todas as formas, as mais sublimes devoções da caridade. Por isso eles estavam aflitos por vê-la na retaguarda do movimento progressivo que o Espiritismo vem impor à Humanidade. Mas os progressos hão de ser tão rápidos que os Espíritos bendirão o Senhor por te haver inspirado o desejo de vir ajudá-los a entrar nesta via sagrada.”

Vedes, pois, senhores, que o impulso que vos anima vem do Alto, e bem temerário seria quem o quisesse deter, porquanto seria abatido como os anjos rebeldes, que quiseram lutar contra o poder de Deus. Assim, não temais a oposição de alguns adversários interessados, que se pavoneiam na sua incredulidade materialista. O materialismo vê chegada a sua última hora, e é o Espiritismo que vem anunciá-la, por ser a aurora que dissipa as trevas da noite. E, coisa providencial, o próprio materialismo, sem o querer, serve de auxiliar à propagação do Espiritismo, porque, por seus ataques, chama a si a atenção dos indiferentes. Querem ver o que é; como o encontram bem, adotam-no. Tendes a prova disto aos vossos olhos: sem os artigos de um dos jornais da vossa cidade, os espíritas bordeleses talvez não passassem da metade do que hoje são. Tal artigo naturalmente despertou a curiosidade. Como se diz geralmente, onde há fumaça há fogo; mediram a importância do fogo pela extensão do artigo. Perguntaram: É bom? É mau? É verdadeiro? É falso? Vejamos para crer. Viram, e sabeis o resultado.

Longe, pois, de atacar o autor do artigo, devemos agradecer-lhe pela propaganda gratuita; e, caso esteja aqui algum de seus amigos, pedimos a este que o aconselhe a recomeçar, a fim de que, se ontem éramos trezentos, sejamos seiscentos no próximo ano. Sobre isto eu vos poderia citar fatos curiosos de propaganda semelhante, feita em certas cidades, por sermões furibundos contra o Espiritismo.

Como Lyon, Bordeaux vem, pois, plantar orgulhosamente a bandeira do Espiritismo, e o que vejo me garante que não será arrancada. Bordeaux e Lyon! Duas das maiores cidades da França; focos de luz! E ainda dizem que todos os espíritas são loucos! Honra aos loucos desta espécie! Não esqueçamos Metz, que também acaba de fundar sua sociedade, onde figuram em grande número oficiais de todos os graus, e que reclama sua admissão na grande família. Espero que em breve Toulouse,  †  Marselha  †  e outras cidades, onde já fermenta a nova semente, se juntem às suas irmãs mais velhas, dando o sinal da regeneração em suas respectivas regiões.

Senhores, em nome da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, levanto um brinde aos espíritas de Bordeaux; à sua união fraterna para resistir ao inimigo que os queria dividir, a fim de ter mais facilmente razão.

A este brinde associo, do imo do meu coração, e com a mais viva simpatia, o Grupo Espírita dos operários de Bordeaux que, como os de Lyon, dão admirável exemplo de zelo, devotamento, abnegação e reforma moral. Estou feliz, muito feliz, vos asseguro, de ver vossos delegados reunidos fraternamente nesta mesa, com a elite da sociedade, provando, por esta associação, a influência do Espiritismo sobre os preconceitos sociais. Não poderia ser de outro modo, quando ele nos ensina que o mais alto colocado no mundo pode ter sido humilde proletário e que, ao apertar a mão do último serviçal, talvez aperte a de um irmão, de um pai ou de um amigo.

Em nome dos espíritas de Metz e de Lyon, dos quais me faço intérprete, eu vos agradeço por os terdes compreendido na expressão de vossos sentimentos fraternos.

Aos espíritas bordeleses!

Senhores, os espíritas não devem ser ingratos. Creio ser dever de reconhecimento não esquecer os que, mesmo sem o querer, servem à nossa causa. Assim, proponho um brinde ao autor do artigo do Courrier de la Gironde, pelo serviço que nos prestou, fazendo votos para que ele repita, de vez em quando, seus espirituosos artigos. E, se Deus quiser, logo ele será o único homem sensato de Bordeaux.


Abrir