Falarei da estranha mudança que se opera no Espírito logo após a sua libertação. Ele se evapora dos despojos que abandona, como uma chama se desprende do foco que a produziu; depois sucede uma grande perturbação e essa dúvida estranha: estou morto ou vivo? A ausência das sensações ordinárias produzidas pelo corpo surpreende e imobiliza, por assim dizer. Como um homem habituado a um fardo pesado, nossa alma, aliviada repentinamente, não sabe o que fazer de sua liberdade; depois, o espaço infinito, as maravilhas sem-número dos astros, sucedendo-se num ritmo harmonioso, os Espíritos solícitos, flutuando no ar e deslumbrantes de luz sutil que parece atravessá-los, o sentimento da libertação que inunda de repente, a necessidade de lançar-se também no espaço como aves que querem treinar as próprias asas, tais as primeiras impressões que todos nós sentimos. Não vos posso revelar todas as fases desta existência; apenas acrescentarei que, tão logo satisfeita com o seu encantamento, a alma ávida quer se lançar e subir mais às regiões do verdadeiro belo, do verdadeiro bem, e essa aspiração é o tormento dos Espíritos sedentos do infinito. Como a crisálida, esperam despojar-se de sua pele; sentem brotar as asas que os levarão, radiosos, ao azul abençoado. Mas, retidos ainda pelos laços do pecado, devem planar entre o Céu e a Terra, não pertencendo nem a um, nem a outra. Que são todas as aspirações terrenas, comparadas ao ardor insaciável do ser que entreviu um recanto da eternidade! Sofrei, pois, bastante, para chegardes depurados entre nós. O Espiritismo vos ajudará, pois é uma obra abençoada; liga entre si os Espíritos e os vivos, formando os elos de uma cadeia invisível que sobe até Deus.
Delphine de Girardin. n
[1]
[v. Delphine
de Girardin.]