Charles de Saint-G… é um jovem idiota de treze anos, vivo, cujas faculdades intelectuais são de tal nulidade que nem mesmo reconhece os pais e apenas é capaz de alimentar-se. Há nele uma parada completa do desenvolvimento em todo o sistema orgânico. Pensou-se que ele poderia constituir-se num interessante assunto de estudo psicológico.
1.
(A São
Luís.) Poderíeis dizer-nos se podemos evocar o Espírito dessa criança?
Resposta. – Podeis fazê-lo como se evocásseis um morto.
2. Vossa resposta faz-nos supor que a evocação poderia ser feita em qualquer momento.
Resposta. – Sim. Sua alma está atada ao corpo por laços materiais, mas não espirituais; ela pode sempre se desprender.
3. Evocação de Ch. de Saint-G…
Resposta. – Sou um pobre Espírito, preso à Terra como uma ave pelo pé.
4. Em vosso estado atual, como Espírito, tendes consciência de vossa nulidade neste mundo?
Resposta. – Certamente; sinto bem o meu cativeiro.
5. Quando vosso corpo dorme e vosso Espírito se desprende, tendes as ideias tão lúcidas quanto se estivésseis em estado normal?
Resposta. – Quando meu corpo infeliz repousa, estou um pouco mais livre para me elevar ao céu, a que aspiro.
6. Como Espírito, experimentais um pensamento penoso de vosso estado corporal?
Resposta. – Sim, pois é uma punição.
7. Recordai-vos da vossa existência precedente?
Resposta. – Oh, sim! Ela é a causa de meu exílio atual.
8. Qual foi essa existência?
Resposta. – Um jovem libertino ao tempo. de Henrique III.
9. Dissestes que vossa condição atual é uma punição; então não a escolhestes?
Resposta. – Não.
10. Como pode vossa existência atual servir ao vosso progresso, no estado de nulidade em que vos encontrais?
Resposta. – Ela não me é nula perante Deus, que a impôs.
11. Prevedes a duração da vossa existência atual?
Resposta. – Não; mais alguns anos e retornarei à minha pátria.
12. Desde vossa precedente existência até a encarnação atual, que fizestes como Espírito?
Resposta. – Porque eu era um Espírito leviano, Deus me aprisionou.
13. No estado de vigília tendes consciência do que se passa ao vosso redor, apesar da imperfeição dos vossos órgãos?
Resposta. – Vejo, entendo, mas meu corpo não compreende e nada vê.
14. Podemos fazer algo que vos seja útil?
Resposta. – Nada.
15.
(A São Luís.) As preces por um Espírito reencarnado podem ter a mesma
eficácia que a dirigida a um errante?
Resposta. – As preces são sempre boas e agradáveis a Deus. Na posição deste pobre Espírito, elas em nada lhe poderão servir; servirão mais tarde, pois Deus as deixa de reserva.
Observação. – Ninguém desconhecerá o alto ensinamento moral
que resulta desta evocação. Além disso, ela confirma o que sempre foi
dito sobre os idiotas. Sua nulidade moral nada tem a ver com a nulidade
do Espírito, que, abstração feita dos órgãos, goza de todas as suas
faculdades. A imperfeição dos órgãos é apenas um obstáculo à
livre manifestação das faculdades; não as aniquila. É o caso de um homem
vigoroso, cujos membros seriam comprimidos por laços. Sabe-se que, em
certas regiões, longe de ser um objeto de desprezo, os cretinos são
cercados de cuidados benevolentes. Esse sentimento não decorreria de
uma intuição do verdadeiro estado desses infortunados, tanto mais dignos
de atenções quanto seu Espírito, que compreende a posição em que se
encontra e deve sofrer por se ver como um refugo da sociedade?