O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano II — Abril de 1859.

(Idioma francês)

Fraudes espíritas. n

Os que não admitem a realidade das manifestações físicas geralmente atribuem à fraude os efeitos produzidos. Fundam-se em que os prestidigitadores hábeis fazem coisas que parecem prodígios, para quem não lhes conhece os segredos, donde concluem que os médiuns não passam de escamoteadores. Já refutamos este argumento, ou, antes, esta opinião, notadamente nos nossos artigos sobre o Sr. Home e nos números da Revista de janeiro [Os médiuns julgados.] e fevereiro de 1858. [A floresta de Dodona e a estátua de Memnon.] Aqui, pois, não diremos mais que algumas palavras, antes de falarmos de coisa mais séria.

Do fato de haver charlatães que preconizam drogas nas praças públicas, mesmo de haver médicos que, sem irem à praça pública, iludem a confiança de seus clientes, seguir-se-á que todos os médicos são charlatães e que a classe médica haja perdido a consideração que merece? De haver indivíduos que vendem tintura por vinho, segue-se que todos os negociantes de vinho são falsificadores e que não há vinho puro? De tudo se abusa, mesmo das coisas mais respeitáveis e bem se pode dizer que também a fraude tem o seu gênio. Mas, a fraude sempre visa a um fim, a um interesse material qualquer; onde nada há a ganhar, nenhum interesse há em enganar. Por isso foi que dissemos, em nosso número anterior, a propósito dos médiuns mercenários, que a melhor de todas as garantias é o desinteresse absoluto.

Dir-se-á que essa garantia não é única, porque em matéria de prestidigitação há amadores muito hábeis, que visam apenas a distrair a sociedade e disso não fazem uma profissão. Não poderia dar-se o mesmo com os médiuns? Sem dúvida que por alguns momentos podemos nos divertir, divertindo os outros; porém, para nisso passar horas inteiras, durante semanas, meses e anos, fora necessário que se estivesse verdadeiramente possuído do demônio da mistificação, e o primeiro mistificado seria o mistificador. Não repetiremos aqui tudo que já foi dito sobre a boa-fé dos médiuns e dos assistentes, quanto a serem joguetes de uma ilusão ou de uma fascinação. A isso já respondemos inúmeras vezes, bem como a todas as outras objeções, pelo que remetemos o leitor à nossa Instrução Prática sobre as Manifestações [v. Livro dos Médiuns], e aos nossos artigos anteriores da Revista. Nosso objetivo aqui não é convencer os incrédulos. Se não se convencem pelos fatos, não se deixarão convencer pelo raciocínio; seria, pois, perder nosso tempo. Ao contrário, dirigimo-nos aos adeptos, a fim de preveni-los contra os subterfúgios de que poderiam ser vítimas da parte de pessoas interessadas, por um motivo qualquer, em simular certos fenômenos; dizemos certos fenômenos porque alguns há que evidentemente desafiam toda habilidade de prestidigitação, tais como o movimento de objetos sem contato, a suspensão de corpos pesados no espaço, os golpes desferidos em diferentes posições, as aparições, etc. E, ainda, para alguns desses fenômenos, até certo ponto seria possível a simulação, tal o progresso realizado pela arte da imitação.

O que é necessário fazer em semelhantes casos é observar atentamente as circunstâncias e, sobretudo, levar em conta o caráter e a posição das pessoas, a finalidade e o interesse que poderiam ter em enganar: eis aí o melhor de todos os controles, pois há circunstâncias que afastam todo motivo de suspeita. Desse modo, estabelecemos como princípio que é preciso desconfiar de todos quantos fizessem desses fenômenos um espetáculo ou um objeto de curiosidade e de divertimento, ou que deles tirassem qualquer proveito, por menor que fosse, vangloriando-se de os produzir à vontade e a qualquer momento. Nunca seria demasiado repetir que as inteligências ocultas que se manifestam têm suas susceptibilidades e querem provar-nos que também possuem livre-arbítrio e não se submetem aos nossos caprichos.

De todos os fenômenos físicos, um dos mais comuns é o dos golpes internos, vibrados na própria substância da madeira, com ou sem movimento da mesa ou de qualquer objeto que possa ser utilizado. Ora, sendo esse efeito um dos mais fáceis de imitar e também um dos mais frequentemente produzidos, julgamos de utilidade revelar uma pequena astúcia com a qual podemos ser enganados: basta colocar as mãos abertas sobre a mesa, suficientemente próximas para que as unhas dos polegares se apóiem fortemente uma na outra; então, por um movimento muscular absolutamente imperceptível, produz-se um atrito semelhante a um ruído seco, muito parecido com o da tiptologia interna. Esse ruído repercute na madeira e produz uma ilusão completa. Nada mais fácil do que fazer ouvir tantos golpes quanto se queira, uma batida de tambor, etc., responder a certas perguntas pelo sim e pelo não, pelos números e até mesmo pela indicação das letras do alfabeto.

Uma vez prevenidos, o meio de reconhecer a fraude é bem simples. Não será mais possível se as mãos ficarem afastadas uma da outra e se estivermos seguros de que nenhum outro contato possa produzir o ruído. Aliás, os golpes autênticos oferecem essa característica: mudam de lugar e de timbre à vontade, o que não ocorre quando se devem à causa que assinalamos ou a outra análoga qualquer; que eles deixam a mesa para se fazerem ouvir em outra peça de mobiliário que ninguém toca; que, enfim, respondem a perguntas não previstas pelos assistentes.

Chamamos, pois, a atenção das pessoas de boa-fé para esse pequeno estratagema, bem como para outros que possam reconhecer, a fim de os denunciar sem cerimônia. A possibilidade de fraude e de imitação não impede a realidade dos fatos, não podendo o Espiritismo senão ganhar em desmascarar os impostores. Se alguém nos disser: Vi tal fenômeno, mas havia fraude, responderemos que é possível; nós mesmos vimos pretensos sonâmbulos simular o sonambulismo com muita habilidade, o que não impede que o sonambulismo deixe de ser um fato. Todo mundo já viu negociantes venderem algodão por seda, o que também não impede que haja verdadeiros tecidos de seda. É preciso examinar todas as circunstâncias e verificar se a dúvida tem fundamento. Nisso, porém, como em todas as coisas, é preciso ser perito. Ora, nós não poderíamos reconhecer como juiz de uma questão alguém que dela nada conhecesse.

Dizemos outro tanto dos médiuns escreventes. Pensa-se comumente que aqueles que são mecânicos oferecem mais garantias, não apenas pela independência das ideias, mas, também, contra o embuste. Pois bem! Isto é um erro! A fraude insinua-se por toda parte e sabemos com que habilidade é possível dirigir à vontade uma cesta ou uma prancheta que escreve, dando-lhes toda a aparência de movimentos espontâneos. O que levanta todas as dúvidas são os pensamentos expressos, venham de um médium mecânico, intuitivo, audiente, falante ou vidente. Há comunicações que escapam de tal forma das ideias, conhecimentos e, até mesmo, do alcance intelectual do médium, que seria necessário que nos enganássemos excessivamente para lhes dar crédito. Reconhecemos no charlatanismo uma grande habilidade e fecundos recursos, conquanto ainda não lhe reconheçamos o dom de dar saber a um ignorante, ou talento a quem não o tenha.



[1] N. do T.: Vide O Livro dos Médiuns, capítulo XXVIII, itens 314 a 316.


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