O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

Índice |  Princípio  | Continuar

Instruções práticas.

(Idioma francês)

Capítulo III.


COMUNICAÇÕES ESPÍRITAS.

Como já dissemos, toda manifestação que revela uma intenção ou uma vontade é, por isso mesmo, inteligente em maior ou menor grau. É, pois, uma qualificação genérica que distingue essas espécies de comunicações das que são puramente materiais. Quando o aperfeiçoamento dessa experiência permite uma troca recíproca e contínua de pensamentos, obtêm-se comunicações regulares, cujo caráter permite julgar o Espírito que se manifesta. Conforme sua natureza e objetivo, elas serão frívolas, grosseiras ou instrutivas. (V. o artigo Comunicação Espírita no “Vocabulário Espírita”). Esta distinção é de grande importância, porquanto é através dela que os Espíritos nos revelam sua superioridade ou sua inferioridade. Conhecem-se os homens pela linguagem; dá-se o mesmo com os Espíritos. Ora, quem quer que esteja bem compenetrado das qualidades distintivas de cada uma das classes da Escala Espírita, poderá facilmente classificar qualquer Espírito que se apresente na ordem que lhe cabe, assim como o grau de estima e confiança que ele merece. Se a experiência não viesse apoiar este princípio, bastaria o simples bom senso para o demonstrar. Estabelecemos, pois, como regra invariável e sem exceção, que a linguagem dos Espíritos está sempre na razão do grau de sua elevação. A dos Espíritos realmente superiores é constantemente grave, digna, nobre; é sublime quando o assunto o exige. Além de não dizerem senão boas coisas, eles se expressam em termos que excluem, da maneira mais absoluta, toda trivialidade. Por melhores que sejam esses ensinamentos, se estiverem maculados por uma única expressão que exale baixeza, é isto um sinal indubitável de inferioridade, sobretudo se o conjunto da comunicação ofender as conveniências por sua grosseria. A linguagem revela sempre sua origem, quer pelo pensamento que traduz, quer pela forma; e ainda que um Espírito nos quisesse enganar quanto à sua pretensa superioridade, bastaria conversar com ele por algum tempo para ver que se trai, pois não sustenta o que diz.

O fato seguinte reproduziu-se muitas vezes no curso de nossos longos e numerosos estudos. Conversamos com um Espírito cujo caráter e linguagem nos são bem conhecidos. Outro Espírito, mais ou menos elevado, se achava presente e, sem que fosse solicitado, tomou parte na conversação. Ora, antes que tivesse declinado seu nome, a diferença de estilo era tão patente, que cada um dos presentes disse de imediato: Não é mais o outro que fala. Entre os homens não se julgaria de outro modo. Para isto, basta ouvi-los, ainda que não os vejamos. Suponde que num aposento contíguo àquele em que estais se achem vários Espíritos que não conheceis e que não podeis ver. Pela sua conversação julgareis imediatamente se são rústicos ou pessoas de fino trato, ignorantes ou sábios, malfeitores ou homens de bem.

A bondade e a benevolência são ainda atributos essenciais dos Espíritos depurados. Eles não têm ódio nem aos homens, nem aos outros Espíritos. Lastimam-lhes as fraquezas, criticam-lhes os erros, mas sempre com moderação, sem fel e sem animosidade. Isto quanto ao moral. Podemos julgá-los igualmente pela natureza de sua inteligência. Um Espírito pode ser bom, benevolente, só ensinar o bem e possuir conhecimentos limitados, porque o seu desenvolvimento ainda é incompleto. Não nos referimos a Espíritos notoriamente inferiores; pedir-lhes explicação de certas coisas seria pura perda de tempo. Isto equivaleria a pedir a um aluno do ensino básico o que ele pensa de Aristóteles ou do Cosmos. Mas há Espíritos que, em certos assuntos, parecem esclarecidos, ao passo que, em outras questões, acusam a mais absoluta ignorância, por conta das heresias científicas mais absurdas, que defendem. Um Espírito desta espécie raciocinará muito sensatamente sobre um ponto e dirá tolices sobre outro. Dá-se ainda como entre nós: um astrônomo é sábio no que concerne aos astros e pode ser muito ignorante em arquitetura, em música, em pintura, em agricultura, etc. Tudo isto denota, evidentemente, uma evolução imperfeita, o que não significa que se trate de um mau Espírito.

Para julgar os Espíritos, como para julgar os homens, é preciso, antes de mais, saber julgar a si mesmo. Infelizmente há muitas pessoas que tomam sua opinião pessoal como medida exclusiva do bom e do mau, do verdadeiro e do falso. Tudo quanto lhes contradiz a maneira de ver, suas ideias, os sistemas que conceberam ou adotaram, é mau a seus olhos. A tais pessoas falta, evidentemente, a primeira qualidade para uma justa apreciação: a retidão de julgamento; mas não o percebem. É o defeito responsável pelas maiores ilusões.

Acredita-se geralmente que interrogando o Espírito de um homem que foi sábio em determinada especialidade, quando na Terra, obter-se-á a verdade com mais segurança. Isto é lógico e, todavia, nem sempre é verdadeiro. A experiência demonstra que os cientistas, tanto quanto os outros homens, sobretudo os que deixaram a Terra há pouco tempo, acham-se ainda sob o império dos preconceitos da vida corporal; eles não se libertam imediatamente do espírito de sistema. É, pois, possível que, sob a influência das ideias que acalentavam em vida e das quais fizeram um título de glória, vejam menos claro do que pensamos. Não damos este princípio como regra, absolutamente. Dizemos apenas que se constata isto, e que, por conseguinte, a ciência humana de que são dotados nem sempre é uma prova de sua infalibilidade como Espíritos. Aqueles que, como sucede muitas vezes, condenam na condição de Espíritos as doutrinas que haviam sustentado como homens, dão sempre, com isto, uma prova de elevação. Regra geral: o Espírito é tanto menos perfeito quanto menos desprendido da matéria. Portanto, toda vez que nele se reconhece a persistência das ideias falsas que o preocuparam durante a vida, quer pertençam à ordem física ou à ordem moral, é um sinal infalível de que não está completamente desmaterializado.

A obstinação nas ideias terrestres é tanto maior quanto mais recente é a morte. No momento da morte, a alma está sempre num estado de perturbação durante o qual mal se reconhece; é um despertar que não é completo: Não sei onde estou; tudo é confuso para mim. Tal é sua resposta constante. Alguns se queixam de terem sido importunados tão cedo; outros dizem secamente que os deixem em paz e, conforme o seu caráter, exprimem este pensamento em termos mais ou menos corteses. Muitos Espíritos não acreditam que tenham morrido, principalmente os supliciados, os suicidas e, em geral, os que pereceram de morte violenta. Eles veem o próprio corpo, sabem que esse corpo lhes pertence e não compreendem porque estão separados dele. Isto os surpreende; é-lhes preciso algum tempo para se darem conta de sua nova situação. A evocação não pode ser feita nesse momento senão como objeto de estudos psicológicos; mas não é o caso de pedir-lhes informações.

Este estado de confusão, que se pode comparar ao estado transitório do sono à vigília, persiste por um tempo mais ou menos longo. Vimos alguns Espíritos que se haviam desprendido completamente ao cabo de três ou quatro dias, enquanto outros não o estavam ainda depois de vários meses. Segue-se-lhes com interesse a marcha progressiva, assiste-se de algum modo ao despertar de sua alma; as perguntas que lhes são dirigidas, se feitas com medida, prudência, circunspeção e benevolência, os ajudam mesmo a se desembaraçarem. Se sofrem e nos compadecemos de sua dor, isto os alivia. Quando a morte é natural, isto é, quando ela se dá pela extinção gradual das forças vitais, a alma já está parcialmente desligada antes da cessação completa da vida orgânica, e se reconhece mais prontamente. Dá-se o mesmo com os homens que, durante a vida, se elevaram pelo pensamento acima das coisas materiais. Já neste mundo eles pertencem, de certo modo, ao mundo dos Espíritos; a passagem de um a outro se faz rapidamente e a perturbação é de curta duração.

Uma vez desprendida dos restos de suas vestes corporais, a alma se acha em seu estado normal de Espírito; só então se pode julgá-la, porque se apresenta verdadeiramente como é. Suas qualidades e defeitos, suas imperfeições e preconceitos, suas prevenções, suas ideias falsas, mesquinhas ou ridículas, persistem sem se modificar durante toda a duração de sua vida errante, fosse esta de mil anos. É-lhe preciso passar novamente pelo cadinho da vida corporal, para nela deixar algumas impurezas e elevar-se mais alguns graus. Temos visto algumas que, depois de 200 anos de vida errante, ainda têm as manias e mesquinharias que as caracterizavam em vida, enquanto outras exibem quase imediatamente uma grande superioridade.

A propósito do estado de transição que acabamos de descrever, estávamos nos referindo aos Espíritos sofredores. Perguntar-se-á, naturalmente, se esse momento é doloroso. Não cogitamos tratar a questão do sofrimento dos Espíritos, nem muito menos examinar a sua natureza. Esta questão terá seu lugar na Revista. Limitar-nos-emos, pois, a dizer que, para o homem de bem, para o que adormece na paz de uma consciência pura e não teme nenhum olhar perscrutador, o despertar é sempre calmo, doce e sereno. Para aquele cuja consciência está carregada de faltas, para o homem material que pôs todas as suas alegrias na satisfação do corpo, para aquele que malbaratou os favores que a Providência lhe havia outorgado, tal despertar é terrível. Sim, esses Espíritos sofrem no momento em que deixam a vida; sofrem muito e esse sofrimento pode durar tanto quanto sua vida errante. Pelo fato de ser moral, essa dor não deixa de ser menos pungente, porque nem sempre lhes é dado ver o seu termo; sofrem até que um raio de esperança venha luzir a seus olhos, e esta esperança nós podemos fazê-la nascer conversando com eles. Boas palavras, testemunhos de simpatia são para eles um alívio para o qual podem concorrer os bons Espíritos, que chamamos em nosso auxílio para secundarem nossas intenções.

Um suicida evocado pouco tempo depois de sua morte, nos descrevia suas torturas. Quanto tempo isto durará? foi-lhe perguntado. — Não faço a mínima ideia, e é o que me desespera. Um Espírito Superior que estava presente disse, então, espontaneamente: “Isto durará até o termo natural da vida que ele voluntariamente interrompeu”. — Muito obrigado! disse o outro, pelo que aquele que está aí acaba de me informar.

Terminaremos este capítulo com uma observação essencial. O quadro que acabamos de traçar não é o resultado de uma teoria, nem de um sistema filosófico mais ou menos engenhoso. Tudo o que dissemos, nós o obtivemos dos próprios Espíritos, a quem interrogamos, e foram eles que nos responderam, muitas vezes, de maneira contrária às nossas convicções primitivas. Fizemos com os Espíritos o que o anatomista faz com o corpo humano: levamos o escalpelo da investigação a inúmeros “cadáveres”. Não nos contentamos em fazer que falassem: sondamos-lhes todos os refolhos da existência, ao menos tanto quanto nos foi possível fazê-lo; seguimo-los desde o instante em que exalaram o último suspiro da vida corporal até o momento em que nela tornaram a entrar; estudamos sua linguagem, seus costumes, pensamentos e sentimentos, como o médico ausculta as pulsações de um doente, e nesta clínica moral em que todas as fases da vida espírita passaram sob nossos olhos, observamos e comparamos. Se, de um lado, vimos chagas horrendas, também vimos, do outro, grandes motivos de consolação. Ainda uma vez, não fomos nós que imaginamos todas essas coisas; foram os próprios Espíritos que a si mesmo se descreveram. Para quem quer que queira entrar em relação com eles, importa conhecê-los bem, a fim de estar em condições de apreciar-lhes a situação e melhor compreender a sua linguagem, que, sem isto, poderia, algumas vezes, parecer contraditória. Eis por que nos estendemos um tanto longamente sobre este capítulo.


Abrir