1. — Membro da Sociedade Espírita de Paris, sepultado em 12 de setembro de 1863 no cemitério de Montmartre, † em vala comum. 2 Era um homem de coração que o Espiritismo reconduziu a Deus; completa, sincera e profunda era a sua fé em Deus. Simples calceteiro, praticava a caridade por pensamentos, palavras e obras consoante os fracos recursos de que dispunha e encontrando meios, ainda assim, de socorrer os que possuíam menos do que ele. 3 Se a SOCIEDADE não lhe adquiriu uma sepultura particular, foi porque lhe pareceu dever antes empregar mais utilmente o dinheiro em benefício dos vivos, do que em vãs satisfações de amor-próprio, além de que nós, os espíritas, sabemos melhor que ninguém que a vala comum é, tanto quanto os mais suntuosos mausoléus, uma porta aberta para o Céu.
4 O Sr. Canu, secretário da SOCIEDADE e profundo materialista de outros tempos, pronunciou sobre a campa a seguinte alocução:
5 “Caro irmão Costeau: Faz alguns anos, muitos dentre nós, e eu em primeiro lugar, não viríamos ante este túmulo aberto, que representaria apenas o fim das misérias humanas, e depois o nada, o pavoroso nada, isto é, onde não existia nem alma para merecer ou expiar, e, consequentemente, nem Deus para recompensar, castigar, ou perdoar. 6 Hoje, graças à nossa santa Doutrina, divisamos aqui o termo das provações, e para vós, querido irmão, cujos despojos baixam à terra, o triunfo dos labores e o início das recompensas a que fizeram jus a vossa coragem, resignação, caridade, as vossas virtudes, e, acima de tudo isso, a glorificação de um Deus sábio, onipotente, justo e bom. 7 Sede, pois, caro irmão, o portador das graças que rendemos ao Eterno por ter permitido dissiparem-se as trevas do erro e da incredulidade que nos assoberbavam. Não há muito tempo, e nestas mesmas circunstâncias, com a fronte abatida e o coração lacerado, em desânimo, nós vos diríamos: “Amigo, adeus para sempre”. Mas hoje vos dizemos, de fronte erguida, radiante de esperanças, e com o coração repleto de amor e de coragem: — “Caro irmão, até breve, orai por nós.” n
2. — Um dos médiuns da SOCIEDADE obteve ali mesmo sobre a sepultura, ainda meio aberta, a seguinte comunicação, ouvida por todos os assistentes, coveiros inclusive, de cabeça descoberta e com profunda emoção. Era, de fato, um espetáculo novo e surpreendente esse de ouvir palavras de um morto, recolhidas do seio do próprio túmulo:
2 “Obrigado, amigos, obrigado. O meu túmulo ainda nem mesmo de todo é fechado, mas, passando um segundo, a terra cobrirá os meus despojos. Vós sabeis, no entanto, que minha alma não será sepultada nesse pó, antes pairará no Espaço a fim de subir até Deus!
3 “E como consola poder-se dizer a respeito da dissolução do invólucro: Oh! eu não morri, vivo a verdadeira vida, a vida eterna!
4 “O enterro do pobre não tem grandes cortejos, nem orgulhosas manifestações se abeiram da sua campa, em compensação, acreditai-me, imensa multidão aqui não falta, e bons Espíritos acompanharam convosco, e com estas mulheres piedosas, o corpo que aí jaz; estendido. Ao menos todos vós tendes fé e amais o bom Deus!
5 “Oh! certamente não morremos só porque o nosso corpo se esfacela, esposa amada! Demais, eu estarei sempre ao teu lado para te consolar, para te ajudar a suportar as provações. Rude ser-te-á a vida, mas repleto o coração com as ideias da eternidade e do amor de Deus. Como serão efêmeros os teus sofrimentos!
6 “Parentes que rodeais a minha amantíssima companheira, amai-a, respeitai-a, sede para ela como irmãos. Não vos esqueçais nunca da assistência que mutuamente vos deveis na Terra, se é que pretendeis penetrar a morada do Senhor.
7 “Quanto a vós, espíritas, irmãos, amigos, obrigado por terdes vindo a esta morada de pó e lama, a dizer-me adeus. Mas sabeis, e sabeis muito bem, vós, que minha alma imortal vive, e que algumas vezes vos irá pedir preces que jamais lhe recusareis para auxiliá-la na vida magnífica que lhe descortinastes na vida terrena.
8 “A vós todos que aqui estais, adeus. Nós nos podemos rever noutro lugar que não sobre este túmulo. As almas me chamam a conferenciar. Adeus, orai pelos que sofrem e até outra vista.”
Costeau.
3. — Três dias depois, evocado num grupo particular, o Espírito de Costeau assim se exprimiu por intermédio doutro médium:
2 “A morte é a vida; 3 não vou mais que repetir o que já disseram, mas para vós não há outra expressão senão esta, a despeito do que afirmam os materialistas, os que preferem ficar cegos. 4 Oh! meus amigos, que belo espetáculo sobre a Terra o de ver tremular os estandartes do Espiritismo! Ciência profunda, imensa, da qual apenas soletrais as primeiras palavras. 5 E que de luzes leva aos homens de boa vontade, aos que, libertando-se das terríveis cadeias do orgulho, altamente proclamam a sua crença em Deus! Homens, orai, rendei graças por tantos benefícios. 6 Pobre Humanidade! Ah! se te fora dado compreender!… Mas não, que o tempo não é chegado ainda, no qual a misericórdia do Senhor deve estender-se por sobre todos os homens, a fim de lhe reconhecerem as vontades e a elas se submeterem.
7 “Por teus raios luminosos, ciência bendita, é que eles lá chegarão e compreenderão. Ao teu calor benéfico aquecerão os corações, tonificando-os no fogo divino, portador de consolações como de fé. 8 Aos teus raios vivificantes, o mestre e o operário virão a confundir-se e identificar-se, compenetrados dessa caridade fraterna preconizada pelo divino Messias.
9 “Oh! meus irmãos, pensai na felicidade imensa que possuís como primeiros iniciados na obra da regeneração. Honra vos seja feita. 10 Prossegui, e um dia, como eu, vendo a pátria dos Espíritos, exclamareis: — A morte é a vida, ou antes um sonho, espécie de pesadelo que dura o espaço de um minuto, e do qual despertamos para nos vermos rodeados de amigos que nos felicitam, ditosos por nos abraçarem. 11 Tão grande foi a minha ventura, que eu não podia compreender que Deus me destinasse tantas graças relativamente ao pouco que fiz. 12 Parecia-me sonhar, e como outrora me acontecia sonhar que estava morto, fui por instantes obrigado ao temor de voltar ao pobre corpo. Muito não tardou, porém, que me desse contas da realidade e rendesse graças a Deus. 13 Eu bendizia o mestre que tão bem soube incutir-me os deveres de homem que crê na vida futura. Sim, eu o bendizia, agradecia-lhe, porquanto O Livro dos Espíritos despertara-me na alma os elos de amor ao meu Criador.
14 “Obrigado, bons amigos que me atraístes para junto de vós. Participai aos nossos irmãos que estou muitas vezes com o nosso amigo Sanson. Até outra vista e coragem, porque o triunfo vos espera. Felizes os que houverem tomado parte no combate!”
15 Daí por diante o Sr. Costeau manifestou-se constantemente, na SOCIEDADE e em outras reuniões, dando sempre provas dessa elevação de pensamentos que caracteriza os Espíritos adiantados.
[1] Para mais detalhes, e outras alocuções, ver a Revista Espírita de outubro de 1863.