Roteiro 11
Inteligência Humana
Objetivos:
» Conceituar Inteligência e intelecto, segundo a Ciência e a Doutrina Espírita.
» Elaborar linha histórica que retrate a evolução da inteligência humana.
IDEIAS PRINCIPAIS
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Inteligência é, entre outros conceitos, a capacidade mental de raciocinar, planejar e resolver problemas.
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Intelecto é função cerebral que viabiliza a manifestação da inteligência.
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Na planta, a inteligência dormita; no animal, sonha; só no homem acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente; a partir daí, o progresso, de alguma sorte fatal nas formas inferiores da Natureza, só se pode realizar pelo acordo da vontade humana com as leis Eternas. Léon Denis: O problema do ser, do destino e da dor. Primeira parte, Capítulo IX.
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O desenvolvimento da inteligência humana inicia com a humanização do princípio inteligente e prossegue continuamente, pois o progresso jamais cessa.
SUBSÍDIOS
De forma ampla, inteligência pode ser conceituada como a capacidade mental de raciocinar, planejar, resolver problemas, abstrair e compreender ideias e linguagens, sobretudo, aprender. Para a Medicina é, simplesmente, a capacidade de “[…] compreender e fazer relações; de solucionar problemas e de se ajustar a novas situações.” (1) Neste contexto, os chamados “testes de inteligência” apresentam valor relativo e, por serem de natureza generalista, tais instrumentos não consideram as peculiaridades de cada indivíduo, procedente de diferentes extratos sociais, raciais, culturais ou econômicos. (1)
Inteligência não é o mesmo que intelecto, afirmam os estudiosos, ainda que ambos os conceitos estejam relacionados. Intelecto é função cerebral que viabiliza a manifestação da inteligência, (1) entendida como faculdade mental ou pensante do Espírito, considerado “o princípio inteligente do Universo”, no dizer dos Espíritos da Codificação. (2) Inteligência e intelecto são conceitos conhecidos desde a Antiguidade, por Sócrates, Platão e Aristóteles. (3)
O intelecto se traduz como a possibilidade de conhecer, compreender e aprender, sempre viabilizada pela inteligência. No ser humano, a intelectualidade é favorecida pela emissão de pensamentos contínuos, que constituem a plataforma da inteligência. Os animais apresentam inteligência rudimentar (pensamento descontínuo), que pode ser mais ou menos primitiva de acordo com a posição evolutiva em que se encontram. Não possuem, contudo, intelecto ou intelectualidade, propriamente dita, porque suas ações se baseiam no instinto e no hábito (automatismo).
Nesse contexto, mesmo o homem primitivo é considerado ser inteligente, por emitir pensamentos contínuos, mas não é intelectualizado, pois os seus conhecimentos são escassos. Em oposição, a inteligência do gênio possui elevado grau de intelectualidade, acumulada ao longo das inumeráveis experiências reencarnatórias.
A inteligência e o intelecto evoluem de forma gradual, como tudo na Natureza: a inteligência, propriamente dita, começa quando o ser passa a emitir pensamentos contínuos, com a humanização do princípio inteligente, mas a capacidade intelectual se desenvolve com a aquisição de conhecimento. Estas conquistas são arquivadas na memória integral do Espírito por intermédio do perispírito que, igualmente, evolui. Esclarece a respeito o Espírito André Luiz:
Assim como o aperfeiçoado veículo [físico] do homem nasceu das formas primárias da Natureza, o corpo espiritual foi iniciado também nos princípios rudimentares da inteligência. É necessário não confundir a semente com a árvore ou a criança com o adulto, embora surjam na mesma paisagem de vida. O instrumento perispirítico do selvagem deve ser classificado como protoforma humana, extremamente condensado pela sua integração com a matéria mais densa. Está para o organismo aprimorado dos Espíritos algo enobrecidos, como um macaco antropomorfo está para o homem bem-posto das cidades modernas. Em criaturas dessa espécie, a vida moral está começando a aparecer e o perispírito nelas ainda se encontra enormemente pastoso. Por esse motivo, permanecerão muito tempo na escola da experiência, como o bloco de pedra rude sob marteladas, antes de oferecer de si mesmo a obra-prima… Despenderão séculos e séculos para se rarefazerem, usando múltiplas formas, de modo a conquistarem as qualidades superiores que, em lhes sutilizando a organização, lhes conferirão novas possibilidades de crescimento consciencial. O instinto e a inteligência pouco a pouco se transformam em conhecimento e responsabilidade e semelhante renovação outorga ao ser mais avançados equipamentos de manifestação… (4)
A inteligência, enquanto faculdade do Espírito, desenvolve-se não só pelas aquisições intelectuais características do pensamento racional e lógico, mas, também, por outros meios, como a intuição e percepções variadas, assim como pela habilidade de utilizar instrumentos (ferramentas de trabalho, de arte e estética, por exemplo).
1. A INTELIGÊNCIA HUMANA
O conhecimento científico sobre a inteligência se revela especialmente desafiante, independentemente das diferentes abordagens fornecidas pelos saberes humanos. Assim, a melhor forma de estudar o assunto é situá-lo no contexto da evolução histórica — orientação seguida neste Roteiro — para, a seguir, procurar entender a natureza e as formas de manifestação da inteligência — tema a ser desenvolvido no próximo Roteiro.
Para a Doutrina Espírita, a inteligência humana começa a ser percebida nos hominídeos, condição adquirida depois de longa jornada do princípio inteligente nos reinos inferiores da Natureza, no decurso das eras, em ambos os planos da vida. A construção da inteligência foi lenta e laboriosa, iniciada a partir do momento em que o princípio espiritual (inteligente) uniu-se ao princípio material, cuja caminhada evolutiva foi assim sabiamente sintetizada por Léon Denis: “[…] Na planta, a inteligência dormita; no animal, sonha; só no homem acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente; a partir daí, o progresso, de alguma sorte fatal nas formas inferiores da Natureza, só se pode realizar pelo acordo da vontade humana com as leis Eternas.” (5)
Para a Filosofia, a evolução histórica da inteligência passou por processos específicos, obtendo consenso científico a partir do pensamento do filósofo Renée Descartes, para quem a inteligência humana deve ser considerada como capacidade de raciocinar, tendo como base a memória. Inteligência passa a ser vista, então, como sinônimo de cognição, claramente definida por Jean Piaget (1896-1980) † como função lógico-matemática.
Com esses dois conceitos (de Descartes e de Piaget), três conclusões surgiram de imediato, conduzindo os estudiosos a ampla repercussão, ainda que alguns aspectos se revelassem equivocados: 1) a inteligência é sempre hereditária; 2) homem é mais inteligente que a mulher; 3) é possível medir a inteligência humana e classificá-la em uma escala, denominada Coeficiente de Inteligência (C.I.).
A primeira ideia — a inteligência como algo exclusivamente inato e de transmissão hereditária — foi parcialmente descartada com os estudos da genética, sobretudo com os avanços da biologia molecular. Na verdade, ainda que se considere a existência de um suporte genético, a inteligência se constrói também pelo processo educativo, pela influência do meio e pela experiência. O nível de construção da inteligência e do saber (intelectualidade) se revela, naturalmente, no comportamento humano. Daí acertadamente afirmar o biólogo suíço Jean Piaget que o comportamento dos seres vivos não é, essencialmente, inato ou preso a condicionamentos. Para ele o comportamento resulta da interação do indivíduo com o meio ambiente. Esta sua teoria, conhecida como epistemológica (epistemo = conhecimento; logia = estudo), é de natureza interacionista, acreditando-se que a inteligência humana está vinculada à complexidade da interação indivíduo-meio ambiente. Significa dizer também que, quanto mais complexa for esta interação, mais “inteligente” será ó indivíduo.
A segunda ideia nasceu de incorreta (e preconceituosa) interpretação da seguinte afirmativa do cientista britânico Charles Darwin quando ele observou aspectos específicos da evolução das espécies: “[…] cada membro de uma mesma espécie difere dos demais.” (6)
Por equívoco de julgamento, surgiu a teoria de que as mulheres seriam menos inteligentes que os homens, uma vez que teriam aparência desigual e algumas funções orgânicas diferentes (gravidez, por exemplo). Entretanto, o sexo, como gênero, não determina ser a inteligência maior ou menor, uma vez que estruturas cerebrais e a capacidade de aprender são as mesmas, no homem e na mulher. Mesmo quando se verifica que há aptidões e habilidades mais marcantes em um ou outro sexo, sabe-se que são devidas aos estímulos recebidos (oportunidades de aprendizado) e às experiências vivenciadas. Dessa forma a teoria de que a mulher é menos inteligente que o homem não prevalece nem apresenta embasamento científico, sociológico ou antropológico. Contudo, serviu de base para a psicologia estudar de forma sistemática, a partir do século vinte, as chamadas diferenças individuais.
A terceira ideia trouxe a noção de que haveria um coeficiente [quociente] de inteligência (QI) individual, passível de ser dimensionado. Verificou-se, posteriormente, contudo, que os testes de QI só mediam (e medem), de forma generalizada, quando muito, a capacidade cognitiva. Não devem ser considerados isoladamente, mas no contexto de múltiplos fatores.
Os testes de inteligência surgiram na China, no século V, e começaram a ser usados cientificamente na França, no século XX. Em 1905, Alfred Binet [1857-1911] † e o seu colega Theodore Simon [1872-1961] † criaram a Escala de Binet-Simon, usada para identificar estudantes que pudessem precisar de ajuda extra na sua aprendizagem escolar. […] Em 1912, Wilhelm Stern † propôs o termo “QI” (quociente de inteligência) † para representar o nível mental, e introduziu os termos “idade mental” e “idade cronológica”. Stern propôs que o QI fosse determinado pela divisão da idade mental pela idade cronológica. Assim uma criança com idade cronológica de 10 anos e nível mental de 8 anos teria QI 0,8. (7)
Com o tempo, novas adaptações foram introduzidas aos testes de QI, de forma que, hoje, já não se utilizam os testes de QI de forma isolada, que são apresentados, agora, com nova roupagem e inseridos dentro de um contexto mais amplo. Para o Espírito Emmanuel, é importante considerar:
Em verdade, o homem inteligente não é aquele que apenas calcula, mas sim o que transfunde o próprio raciocínio em emoção para compreender a vida e sublimá-la. Podendo senhorear as riquezas do mundo, abstém-se do excesso para viver com simplicidade, sem desrespeitar as necessidades alheias. Guardando o conhecimento superior, não se encastela no orgulho, mas aproxima-se do ignorante para auxiliá-lo a instruir-se. Dispondo de meios para fazer com que o próximo se lhe escravize ao interesse, trabalha espontaneamente pelo prazer de servir. E, entesourando virtudes inatacáveis, não se furta à convivência com as vítimas do mal, agindo, sem escárnio ou condenação, para libertá-las do vício. O homem inteligente, segundo o padrão de Jesus, é aquele que, sendo grande, sabe apequenar-se para ajudar aos que caminham em subnível, consagrando-se ao bem dos outros, para que os outros lhe partilhem a ascensão para Deus. (8)
2. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA INTELIGÊNCIA HUMANA
Na década de 1950 Paul MacLean, † conhecido neurologista do Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos, propôs a tese de que o cérebro poderia ser constituído de três partes. “Ele chamou a sua teoria de cérebro trino, e acreditava que, quando evoluímos dos anfíbios para mamíferos terrestres, e daí para primatas, nossos cérebros aumentaram.” (9) Este aumento teria ocorrido mais em nível de “qualidade” do que em “quantidade”, podemos assim exprimir. Quis Maclean dizer que as modificações no cérebro “[…] não se devem a uma completa reestruturação e reorganização, mas, sim, ao desenvolvimento de “extensões” do antigo núcleo interno — melhorias mais avançadas, se preferir”, (9) afirmou.
As explicações sobre o cérebro trino lançaram novas luzes para o entendimento da inteligência, sobretudo a humana, ainda que, atualmente, existam diversas (e legítimas) objeções à teoria de MacLean, sobretudo por ter ele dividido o cérebro de modo tão restrito.
Mas, afinal, o que significa cérebro trino? É uma teoria que parte do pressuposto que, evolutivamente, o cérebro evoluído foi dividido em três partes: cérebro primitivo (ou reptiliano) — também chamado de cérebro do instinto da sobrevivência; cérebro intermediário (ou límbico) — conhecido como cérebro emocional; e o cérebro racional (neocórtex) — identificado como cérebro lógico. (10) Essa divisão apresentaria o seguinte desenvolvimento evolutivo:
Primeiro surgiu o chamado “cérebro reptiliano”, o antigo núcleo interno [nervoso] presente em todos os répteis, responsável pelas funções básicas de respiração, circulação sanguínea e digestão, e, também, por alguns aspectos básicos do comportamento, como acasalamento, agressão e raiva. Nos seres humanos, o cérebro reptiliano fica acima da medula espinhal, na base do cérebro. (10) [Veja figura]
“[…] Foi só com a evolução da espécie e o desenvolvimento do cérebro límbico que surgiu a maioria dos aspectos emocionais básicos, incluindo a proteção da prole. Sentimentos como amor, tristeza e ciúme parecem ter raízes no cérebro límbico.” (10)
Acredita-se que a maior parte dos nossos instintos seja controlada pelo cérebro límbico porque neste local há estruturas (hipocampo, tálamo, hipotálamo, tonsila ou amígdala cerebelar) associadas à memória, aos comportamentos ligados ao sexo (reprodução), aos hormônios (que funcionam como moduladores biológicos), à alimentação (sobrevivência da espécie), à percepção do prazer e à competição individual entre espécies semelhantes. (10) (Veja figura)
Acrescenta, também, o cientista estadunidense que a “[…] evolução para um cérebro maior resultou o terceiro componente, o neocórtex. Segundo MacLean, com o passar do tempo, o cérebro neocórtico produziu a lógica e o pensamento, favorecendo, nos humanos, a fala, a escrita e a capacidade de planejar.” (11) (Veja figura)
Figuras 1 e 2 (24)
Segundo a Doutrina Espírita, o desenvolvimento da inteligência humana está claramente delineada com a humanização do princípio inteligente, uma ocorrência gradual estabelecida ao longo dos milênios. Junto com as conquistas da inteligência, acompanha-se o aperfeiçoamento do livre-arbítrio, condição que transforma o homem em construtor do próprio destino. Vemos, então, que desde os primórdios a inteligência é ampliada pelas aquisições obtidas nas inúmeras reencarnações do Espírito e nos seus estágios no plano espiritual. O progresso da inteligência humana é, portanto, infinito.
A alma, dissemos, vem de Deus; é, em nós, o princípio da inteligência e da vida. […] Desde a hora em que caiu na matéria, qual foi o caminho que seguiu para remontar até ao ponto atual da sua carreira? Precisou de passar vias escuras, revestir formas, animar organismos que deixava ao sair de cada existência, como se faz com um vestuário inútil. Todos estes corpos de carne pereceram, o sopro dos destinos dispersou-lhes as cinzas, mas a alma persiste e permanece na sua perpetuidade, prossegue sua marcha ascendente, percorre as inumeráveis estações da sua viagem e dirige-se para um fim grande e apetecível, um fim que é a perfeição. A alma contém, no estado virtual, todos os germens dos seus desenvolvimentos futuros. É destinada a conhecer, adquirir e possuir tudo. Como, pois, poderia ela conseguir tudo isso numa única existência? A vida é curta e longe está a perfeição! Poderia a alma, numa vida única, desenvolver o seu entendimento, esclarecer a razão, fortificar a consciência, assimilar todos os elementos da sabedoria, da santidade, do gênio? Para realizar os seus fins, tem de percorrer, no tempo e no espaço, um campo sem limites. […] (12)
Os seres humanos pertencem ao grupo dos mamíferos chamados primatas que, atualmente, contam mais de 230 espécies (lêmures, tarsos, macacos e os grandes símios). Derivam de uma ramificação evolutiva de um grupo de símios, ocorrida cerca de seis milhões de anos atrás, na África. Os novos hominídeos apresentavam características únicas que os distinguiram dos demais: caninos reduzidos e bipedalismo. (13)
Desse ponto em diante, desencadeiam acontecimentos sucessivos que definem marcos de desenvolvimento da inteligência no homem, apresentados resumidamente, em seguida. Acredita-se, hoje, que o hominídeo que deu origem direta ao homem contemporâneo, e mais parecido com este, apareceu, pela primeira vez, no continente africano, cerca de 150 mil anos atrás e, a partir desta localidade, espalhou-se pelo Planeta, sendo que a chegada ao continente americano é aceita pela comunidade científica como um dos seus últimos estágios de migração (há 15-12 mil anos). (13)
O erguimento da coluna vertebral e a capacidade bípede são aspectos fundamentais da anatomia que tornaram tais ancestrais dos homem superiores aos símios, propriamente ditos, e aos demais seres da Criação. Acredita-se que tais características teriam surgido nos primeiros hominídeos denominados Australopithecus.
O que fez os humanos primitivos andarem sobre as duas pernas em vez de quatro? Algumas pessoas supõem que deve ter sido a cópia do movimento feito pelos chipanzés para pegar frutas maduras no alto de árvores baixas. Outros acreditam que ser bípede oferecia grandes vantagens para a sobrevivência: podíamos andar distâncias maiores; absorvíamos menos calor do sol […]; podíamos caçar e percorrer territórios maiores e possivelmente mais lucrativos. Qualquer que seja a sequência exata dos eventos que levaram os nossos ancestrais a andarem sobre duas pernas, sabemos que a postura ereta foi fundamental para a sobrevivência e o sucesso da espécie. […] Para os hominídeos, uma outra coisa realmente importante surgiu com a prática de andar sobre duas pernas […]: ficar de pé significava ter as mãos livres. (14)
O bipedalismo exigiu algumas mudanças anatômicas nos australopitecinos: osso pélvico mais amplo e côncavo para abrigar órgãos internos e dar mais estabilidade durante a caminhada. Ângulo das pernas e posição dos joelhos adaptados para suportar o peso do corpo. Dedos dos pés mais curtos e menos flexíveis que os dos símios. Coluna em forma de “S”, que se prolonga por uma abertura localizada na base do crânio. (15)
Em termos evolutivos, supõe-se que um milhão de anos depois do erguimento da coluna vertebral, os Australopithecus evoluíram para o gênero Homo — linhagem que conduziu à espécie do homem atual (Homo sapiens, sapiens), conferindo-lhe habilidades excepcionais, como carregar os próprios filhos pequenos, objetos e alimentos; colher e transportar frutas e vegetais e, sobretudo, construir e utilizar ferramentas.
O gênero Homo (13) revela destacado florescimento da inteligência, ainda que não exista unanimidade científica de como tal ocorreu. As primeiras espécies desse grupo foram Homo habilis e Homo erectus, já totalmente extintas. (15) Entre
[…] 2,5 e 2,3 milhões de anos ocorreu o surgimento do gênero Homo, o qual acredita-se que esteja diretamente relacionado com uma única característica: o desenvolvimento do cérebro. Também não há um consenso sobre a explicação para o desenvolvimento das habilidades mentais dos membros desse grupo. Alguns cientistas afirmam que esse desenvolvimento ocorreu devido à fabricação e ao uso de ferramentas, outros dizem que esse desenvolvimento também se deve à variação da dieta proporcionada pelo próprio uso de ferramentas (raízes, tubérculos e carne). (15)
Com o incremento da inteligência, surgiu o Homo habilis há 2,5 e 2 milhões de anos, que tinha capacidade para construir ferramentas de pedra, usadas para cortar e raspar, assim como emitir sons, considerados os primeiros vestígios da linguagem. (13) (15) É conhecido como “o homem da pedra lascada”.
O homem primitivo não era, em muitos aspectos, diferente dos animais, sobretudo quando diante da necessidade de sobreviver. Vivia num mundo pleno de desafios, em perene combate com as forças da Natureza, com animais e outros hominídeos. Somente o desenvolvimento da inteligência lhe possibilitou superar as dificuldades do meio, já que não possuía a força física de alguns animais ou acuidades percebidas em outros (visão e audição mais apuradas, por exemplo).
Em meio a essa diversidade havia vislumbres de diferenças de inteligência. O caçador deve ser mais esperto do que o caçado. A fisiologia do sangue quente aumentou os riscos. Mais comida tinha que ser consumida para alimentar os fogos metabólicos; o oportunismo dos répteis [sangue frio] tinha que ser suplantado por estratagemas que são em parte instinto, em parte inteligência. E os caçadores inteligentes devem ser vencidos com nervos delicados e sentidos sutis. (16)
O passo evolutivo seguinte caracteriza-se pelo surgimento do Homo erectus, cuja inteligência já lhe permite construir ferramentas mais elaboradas e diversificadas, especializadas para uso diferenciado: caça, pesca, ataque, defesa, etc.
Outro acontecimento, marcadamente importante, ocorreu com o Homo erectus: a descoberta e a utilização do fogo. Tal conquista evolutiva fez o homem primitivo se projetar, mais ainda, como superior aos demais seres, e, ao mesmo tempo, desenvolver formas mais seguras e confortáveis de sobrevivência: construção de abrigos para a proteção contra o frio e ataques de animais; trabalhar a madeira para construção de moradias, armadilhas para captura de animais; cozinhar carnes e outros alimentos, facilitando a digestão e absorção de nutrientes, etc. (13) (15) (16)
É também no Homo erectus (13) (17) que se desenvolve um mecanismo evolutivo considerado, a rigor, exclusivo da espécie humana: a linguagem. Por ela, aprende o homem a se comunicar, emitir sinais de alerta, trocar aprendizagens.
Cientistas da atualidade, como as autoras do livro A Evolução em Quatro Dimensões, acreditam que o fator que torna a espécie humana tão diferente e especial é, justamente,
[…] a nossa capacidade de pensar e de comunicar através de palavras e de outros símbolos […]. Essa ideia foi explorada há mais de um século pelo filósofo alemão Ernest Cassirer [1874-1945] † , e foi discutida recentemente pelo neurobiologista Terrence Deacon. † Assim como Cassider, nós escolhemos os símbolos como traço diagnóstico dos seres humanos, porque a racionalidade, a capacidade linguística, a habilidade artística e a religiosidade são facetas do pensamento e da comunicação simbólicos. (17)
A linguagem “[…] permite comunicação ilimitada acerca de todos os aspectos da realidade, concretos e abstratos, presentes e ausentes. Permite também reinventar o mundo cultural para além da experiência física direta do aqui e agora.” (18)
Eis como Emmanuel se expressa a respeito da importância da linguagem:
Através da linguagem, o homem ajuda-se ou se desajuda. […] A palavra é canal do “eu”. Pela válvula da língua, nossas paixões explodem ou nossas virtudes se estendem. Cada vez que arrojamos para fora de nós o vocabulário que nos é próprio, emitimos forças que destroem ou edificam, que solapam ou restauram, que ferem ou balsamizam. Linguagem, a nosso entender, se constitui de três elementos essenciais: expressão, maneira e voz. Se não aclaramos a frase, se não apuramos o modo e se não educamos a voz, de acordo com as situações, somos suscetíveis de perder as nossas melhores oportunidades de melhoria, entendimento e elevação […]. (19)
O Homo neandertalensis (Homem de Neandertal), é o passo evolutivo que se seguiu, caracterizado por inteligência bem mais aprimorada. (13) Com a capacidade craniana semelhante ao homem atual, viveu na Era do Gelo ou Glacial. Era hábil caçador, conseguia suportar climas extremos, aprendeu a construir as primeiras cabanas, fazia funerais e prestava assistência aos doentes. Viveu há 400 mil anos, extintos há 25 mil, é considerado “o nosso adão genético” porque, a partir dele, surgiu o Homo sapiens, antecessor da espécie atual: Homo sapiens, sapiens. (13) (15)
A aprendizagem humana pode ser entendida, de forma geral, como a aquisição de novos conhecimentos pelo desenvolvimento de competências, que resultam na mudança de comportamentos. A aprendizagem social, fator evolutivo marcante no homem, “[…] é uma mudança de comportamento que resulta de interações sociais com outros indivíduos, geralmente da mesma espécie.” (20)
Segundo a Psicologia, a aprendizagem humana é um processo integrado que provoca transformação qualitativa na estrutura mental (intelecto e inteligência) daquele que aprende. Assim, aprendizagem humana é distinta da que se opera no animal, porque no homem se observa: a) vontade ou intenção de aprender; b) persistente dinamismo pela busca de novas informações; c) criatividade na utilização de métodos que aprimoram o próprio conhecimento.
Como o aprendizado é variável nos indivíduos, obviamente são diferentes as suas posições evolutivas, mesmo antes do surgimento do gênero Homo. Condição claramente explicada pelo Espiritismo: “Deus criou iguais todos os Espíritos. Cada um deles, porém, viveu mais ou menos tempo, e, por conseguinte, obteve maior ou menor soma de aquisições. A diferença entre eles está na diversidade da experiência alcançada e da vontade com que procedem, vontade que é o livre-arbítrio.” (21)
O Homo sapiens, também conhecido como Homem de Cro-Magnon, † é cognominado “animal cultural” porque nele aparecem manifestações artísticas, representações simbólicas e realizações de cerimoniais impregnados de significados, religiosos ou espirituais. Viveu o H. Sapiens cerca de 40 mil anos. Apresentava rosto pequeno, testa alta, e queixo largo. Mais socializado que os demais hominídeos, vivia em grupos nas grutas ou nas cercanias, em moradias construídas, constituindo os primeiros agrupamentos humanos (clãs ou tribos).
Esses seres são conhecidos, igualmente, como os primeiros artistas, pois desenvolveram uma arte denominada rupestre, caracterizada por pinturas, gravuras e esculturas executadas em pedra e osso. As pinturas rupestres encontradas nas grutas de Altamira, † na Espanha, e as de Lascaux, † França, são consideradas as primeiras obras artísticas do ser humano. O significado dessa arte revela aspectos mágico, religioso, estético e social. (13) (15)
Ilustrações: Evolução Humana
Figura 3 (25)
Homo Sapiens Neanderthalensis
Figura 4 (26)
Como fechamento deste estudo, destacamos que atualmente há dois consensos em relação ao conceito de inteligência. O primeiro integra o documento Intelligence: Knowns and Unknowns, relatório da Associação Americana de Psicologia-APA, elaborado em 1995 e publicado pela American Psychologist, fevereiro de 1996, periódico oficial da APA. (22) Segundo esse relatório,
os indivíduos diferem na habilidade de entender ideias complexas, de se adaptarem com eficácia ao ambiente, de aprenderem com a experiência, de se engajarem nas várias formas de raciocínio, de superarem obstáculos mediante o pensamento. Embora tais diferenças individuais possam ser substanciais. nunca são completamente consistentes: o desempenho intelectual de uma dada pessoa vai variar em ocasiões distintas, em domínios distintos, a se julgar por critérios distintos. Os conceitos de “inteligência” são tentativas de aclarar e organizar esse conjunto complexo de fenômenos. (19)
A segunda definição de inteligência consta do manifesto Mainstream Science on Intelligence, † assinado por cinquenta e dois pesquisadores em inteligência, em 1994, e publicado no periódico Wall Street Journal, December, 13, 1994. (23)
[É] uma capacidade mental bastante geral que, entre outras coisas, envolve a habilidade de raciocinar. planejar, resolver problemas, pensar de forma abstrata, compreender ideias complexas, aprender rápido e aprender com a experiência. Não é uma mera aprendizagem literária, uma habilidade estritamente acadêmica ou um talento para sair-se bem em provas. Ao contrário disso, o conceito refere-se a uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreensão do mundo à sua volta — “pegar no ar”, “pegar” o sentido das coisas ou “perceber” uma coisa.
ORIENTAÇÕES AO MONITOR
1. Sugerimos que o estudo seja realizado em duas reuniões devido a quantidade de informações presentes no Roteiro.
2. É importante que em ambas as aulas ocorra exposição introdutória, fornecendo visão panorâmica do assunto. Nestas explanações utilizar ilustrações compatíveis com o conteúdo.
3. Após essa atividade inicial, desenvolver o conteúdo por meio de atividades grupais e plenárias, favorecedoras de análise mais aprofundada.
4. Sugerimos que as ideias espíritas, expressas nas referências 2, 4, 5, 8, 12, 19 e 21 sejam utilizadas como fechamento do estudo, selecionando as mais adequadas para cada aula.
REFERÊNCIAS
1. CLAYTON, L. Thomas. Dicionário médico enciclopédico Taber. [ Taber’s Cyclopedic Medical Dictionary - Google Books by Clarence Wilbur Taber ] † . Tradução de Fernando Gomes do Nascimento. 1ª ed. São Paulo: Manole, 2000, p. 957.
2. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 2 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2010, questão 23, p. 87.
3. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia - Google Books. Tradução de Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 571-574.
4. XAVIER, Francisco Cândido. Entre a Terra e o Céu. Pelo Espírito André Luiz. Rio de Janeiro: 25. ed. Rio de Janeiro, 2010. Capítulo 21, p. 171-172.
5. DENIS, Léon. O problema do ser, do destino e da dor. 1ª edição (especial) Rio de Janeiro: FEB, 2008. Primeira parte, Capítulo IX, Evolução e finalidade da alma. p. 166.
6. GOODWIN, James C. História da psicologia moderna - Google Books. Tradução de Marta Rosas. 4. ed. São Paulo: Cultrix, 2010. Capítulo 5, p. 171.
7. Quociente de Inteligência. Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Quociente_de_intelig%C3%AAncia
8. XAVIER, Francisco Cândido. Religião dos Espíritos. Pelo Espírito Emmanuel. 21. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Capítulo: O homem inteligente, p. 135-136, p. 105-106.
9. WINSTON, Robert. Instinto humano - Google Books. Tradução Mário M. Ribeiro e Sheill Mazzolenis. São Paulo: Globo, 2006. Capítulo 1, p. 42.
10. Idem ibidem - p. 43.
11. Idem ibidem - p. 43-44.
12. DENIS, Léon. O problema do ser, do destino e da dor. Op. Cit. Capítulo IX, p. 161-162.
13. VITÓRIA, Pedro. Evolução humana. Acesso em janeiro de 2011 http://www.scribd.com/doc/6454529/Evolucao-Humana
14. WINSTON, Robert. Instinto humano. Op. Cit, p. 63-64.
15. UNESP-Universidade Estadual Paulista Julio Mesquita. Evolução Humana e Aspectos Socio-Culturais. Acesso: janeiro de 2011. http://www.assis.unesp.br/darwinnobrasil/humanev3.htm
16. FORTEY, Richard. Vida: uma biografia não-autorizada - Google Books. Tradução de Jorge Calife. São Paulo: Record, 2000. Capítulo 11, p. 314.
17. JABLONKA, Eva e LAMB, Marion J. Evolução em quatro dimensões - Google Books. Tradução de Claudio Angelo. São Paulo: Companhia das Letras. Capítulo 6, p. 233.
18. RODRIGUES, Cássio. TOMICH, Leda Maria B. e colaboradores. Linguagem e cérebro humano - Google Books. Capítulo 1 (artigo de Fernando e Alessandra Capovilla), p. 20.
19. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Capítulo 43, p. 105-106.
20. JABLONKA, Eva e LAMB, Marion J. Evolução em quatro dimensões. Op. Cit, Capítulo 5, p. 197.
21. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Op. Cit, questão 804, p. 492.
22. Relatório: Intelligence: Knowns and Unknowns - Google Books. Texto disponível em inglês [traduzido]
23. Manifesto subscrito por 52 cientistas: Mainstream Science on Intelligence. Texto disponível em inglês: http://www.udel.edu/educ/gottfredson/reprints/1997mainstream.pdf
24. Origem: Fig. 1. http://www.espacocomenius.com.br — Fig. 2. http://www.inconscientecoletivo.net
25. Origem: Fig. 3. http://www.lucilobiologia.blogspot.com
26. Origem: Fig. 4. (Concepção artística de um caçador Neanderthal) Artist’s impression of a Neanderthal hunter: http://www.cosmosmagazine.com