O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão | Estudos Espíritas

Índice | Página inicial | Continuar

EADE — Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita — Religião à luz do Espiritismo

TOMO I — CRISTIANISMO E ESPIRITISMO
Módulo II — O Cristianismo

Roteiro 16


As epístolas de Paulo de Tarso (3)


Objetivo: Analisar os principais ensinos existentes nas epístolas destinadas aos tessalonicenses, a Timóteo, a Tito, a Filêmon e aos hebreus.



IDEIAS PRINCIPAIS

  • As duas epístolas dirigidas aos tessalonicenses são consideradas os escritos mais antigos do Novo Testamento. Abrangem instruções para as comunidades cristãs recém-criadas.

  • As duas epístolas endereçadas a Timóteo, assim como a que foi enviada a Tito, são chamadas de “pastorais” porque trazem orientações ao trabalho missionário desses dois cooperadores e amigos de Paulo.

  • A carta a Filêmon é, na verdade, um pedido de perdão que Paulo faz em benefício de Onésimo, um escravo fugitivo.

  • Ao contrário de todas as precedentes, a epístola aos hebreus teve a sua autenticidade posta em dúvida desde a Antiguidade. Emmanuel, porém, afirma que esta carta foi, efetivamente, escrita pelo próprio Paulo que a redigiu com grande emoção.



 

SUBSÍDIOS


1. Epístolas aos tessalonicenses


As duas epístolas dirigidas aos tessalonicenses são consideradas os primeiros escritos de Paulo, e, também, os mais antigos do Novo Testamento. Tessalônica, cidade litorânea, capital da Macedônia, na Grécia, foi visitada por Paulo, Silas e Timóteo, durante a segunda viagem missionária do apóstolo. (Atos dos Apóstolos, capítulos 16 a 18)


Após deixar Filipos, Paulo e seus companheiros passaram ali um tempo breve, mais longo o suficiente para ganhar vários convertidos entre judeus e gregos que frequentavam a sinagoga e fundar uma igreja. Segundo Lucas, a oposição forçou os missionários a partir precipitadamente. Eles seguiram para Acaia e trabalharam brevemente em Atenas e depois, por um longo período, em Corinto. Foi durante esse período que Timóteo fez a visita mencionada em 1 Tessalonicenses, 3.1-6 e que Paulo escreveu a primeira epístola, sem dúvida de Corinto. (9)


A duas epístolas foram redigidas em linguagem simples; focalizando problemas surgidos na comunidade, ainda na infância da fé, a braços com costumes e ideias do paganismo circundante, que ameaçavam penetrá-la. Revela o tipo de pregação usual na igreja primitiva: sermões que se caracterizavam pela simplicidade e clareza, denominados prédica. Percebe-se, igualmente, que Paulo se encontrava na primeira fase de compreensão do Evangelho. (5)

O enfoque principal da primeira epístola é a futura vinda do Cristo, chamada de parusia. Há indicações de que os tessalonicenses não compreenderam o real sentido da ressurreição e a forma de como o Cristo poderia retornar. Daí a razão das explicações contidas nessa carta. Não há dúvida de que Paulo foi o seu autor. (10)


A segunda epístola suscita problemas para os quais não há respostas consensuais. Sua linguagem e conteúdo são suficientemente semelhantes aos de 1 Tessalonicenses para indicar que, se autêntica, foi provavelmente escrita não muito tempo depois da primeira epístola. […] A pungência da linguagem de Paulo pode sugerir também que ele próprio estava sendo alvo de ataque particular de pessoas de fora da igreja. […] Na parte final da carta, encontramos indícios de que alguns membros da igreja estava vivendo na ociosidade, à custa dos outros. […] Isso provocou forte censura de Paulo, que acreditava firmemente que os cristãos deviam trabalhar para o seu sustento. (10)


1.1 Síntese dos principais ensinos das epístolas aos tessalonicenses

  • EXORTAÇÃO A UMA VIDA SIMPLES E SANTIFICADA

Costumes dissolutos e práticas sexuais ultrajantes (encesto, por exemplo) foram os maiores desafios enfrentados por Paulo junto aos povos gentílicos. Eles se convertiam ao Cristianismo, mas tinham dificuldades em abrir mão das práticas às quais estavam acostumados. Resulta o apóstolo lhes falarem com veemência: “Finalmente, irmãos, vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus que, assim como recebestes de nós, de que maneira convém andar e agradar a Deus, assim andai, para que continueis a progredir cada vez mais; porque vós bem sabeis que mandamentos vos temos dado pelo Senhor Jesus. Porque esta é a vontade de Deus, a vossa santificação: que vos abstenhais da prostituição, que cada um de vós saiba possuir o seu vaso em santificação e honra, não na paixão de concupiscência, como os gentios, que não conhecem a Deus. Ninguém oprima ou engane a seu irmão em negócio algum, porque o Senhor é vingador de todas estas coisas, como também, antes, vo-lo dissemos e testificamos. Porque não nos chamou Deus para a imundícia, mas para a santificação.” (1 Ts 4.1-7)

  • RESSURREIÇÃO DO CRISTO

Percebe-se que os habitantes da Tessalônica acreditavam que as pessoas mortas permaneciam dormindo, nada sabendo sobre a ressurreição nem sobre a reencarnação, ideias comuns que os demais gregos tinham informações, ainda que rudimentares. “Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança. Porque, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem Deus os tornará a trazer com ele. Dizemos-vos, pois, isto pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor. Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras.” (1 Ts 4.13-18)

  • A OUTRA VINDA DO CRISTO

“Ora, irmãos, rogamo-vos, pela vinda de nosso Senhor Jesus Cristo e pela nossa reunião com ele, que não vos movais facilmente do vosso entendimento, nem vos perturbeis, quer por espírito, quer por palavra, quer por epístola, como de nós, como se o Dia de Cristo estivesse já perto. […] Não vos lembrais de que estas coisas vos dizia quando ainda estava convosco? […] Então, irmãos, estai firmes e retende as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa. E o próprio nosso Senhor Jesus Cristo, e nosso Deus e Pai, que nos amou e em graça nos deu uma eterna consolação e boa esperança.” (2 Ts 2.1-2,5, 15,16)


Dirigindo-se aos irmãos de Tessalônica, o apóstolo dos gentios rogou-lhes concurso em favor dos trabalhos evangélicos, para que o serviço do Senhor estivesse isento dos homens maus e dissolutos, justificando apelo com a declaração de que a fé não é de todos. Através das palavras de Paulo, percebe-se-lhe a certeza de que as criaturas perversas se aproximariam dos núcleos de trabalho cristianizante, que a malícia delas poderia causar-lhes prejuízos e que era necessário mobilizar os recursos do espírito contra semelhante influência. O grande convertido, em poucas palavras, gravou advertência de valor infinito, porque, em verdade, a cor religiosa caracterizará a vestimenta exterior de comunidades inteiras, mas a fé será patrimônio somente daqueles que trabalham sem medir sacrifícios, por instalá-la no santuário do próprio mundo intimo. A rotulagem de cristianismo será exibida por qualquer pessoa, todavia, a fé cristã revelar-se-á pura, incondicional e sublime em raros corações. (14)


2. Epístolas a Timóteo

As duas epístolas a Timóteo são classificadas de pastorais porque salientam a firmeza doutrinária e a consagração ao ministério do Senhor. “O caráter que se diria hoje dogmático e moralista destas cartas é julgado pelos críticos como sinal de que não saíram da pena do mesmo autor de Romanos ou Gálatas.” (5) Timóteo foi importante e dedicado servidor do evangelho, além de grande amigo de Paulo.


Nascido na Ásia Menor de mãe judia e pai gentio, tomou-se companheiro de Paulo e, segundo Atos, acompanhou-o em sua primeira viagem à Grécia e mais tarde serviu como emissário junto a comunidades cristãs ali, inclusive Corinto. Paulo chama Timóteo seu “irmão e colaborador”. (1 Tessalonicenses, 3.2; 2 Coríntios, 1.1; Romanos, 16.21) (11)


A autoria dessas epístolas é contestada. As dúvidas estão relacionadas, primeiro, ao vocabulário e o estilo, muito diferente do existente em outras epístolas, como romanos e coríntios.Segundo há conceitos teológicos referentes à respeitabilidade pública, próprio das ideias de padres católicos. Terceiro há uma ordenação eclesiástica, não encontrada nas de mais epístolas paulinas, semelhante aos escritos à existentes no século I d.C. (de Policarpo, por exemplo). Quarto há trechos em que o autor discute teologicamente com os opositores, quando Paulo jamais procedeu assim, limitando-se, apenas, a repreendê-los. (11)


2.1 Síntese dos principais ensinos das epístolas a Timóteo

  • VALOR DA ORAÇÃO

“Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações, orações, intercessões e ações de graças por todos os homens, pelos reis e por todos os que estão em eminência, para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade. Porque isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Salvador […]. Quero, pois, que os homens orem em todo o lugar, levantando mãos santas, sem ira nem contenda.” (1 Tm 2.1,2,8)

  • PRECAUÇÕES CONTRA OS ESPÍRITOS ENGANADORES

“Mas o Espírito expressamente diz que, nos últimos tempos, apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores e a doutrinas de demônios, pela hipocrisia de homens que falam mentiras, tendo cauterizada a sua própria consciência, proibindo o casamento e ordenando a abstinência dos manjares que Deus criou para os fiéis e para os que conhecem a verdade, a fim de usarem deles com ações de graças […].” (1 Tm 4.1-3)

  • CUIDADOS COM OS VELHOS E AS VIÚVAS

“Não repreendas asperamente os anciãos, mas admoesta-os como a pais; aos jovens, como a irmãos; às mulheres idosas, como a mães, às moças, como a irmãs, em toda a pureza. Honra as viúvas que verdadeiramente são viúvas. Mas, se alguma viúva tiver filhos ou netos, aprendam primeiro a exercer piedade para com a sua própria família e a recompensar seus pais; porque isto é bom e agradável diante de Deus.” (1 Tm 5.1-3)

  • EXORTAÇÃO A FIRMEZA E CONSTÂNCIA NO MINISTÉRIO

“Timóteo, meu amado filho: graça, misericórdia e paz, da parte de Deus Pai, e da de Cristo Jesus, Senhor nosso. Dou graças a Deus, a quem, desde os meus antepassados, sirvo com uma consciência pura, porque sem cessar faço memória de ti nas minhas orações, noite e dia; desejando muito ver-te, lembrando-me das tuas lágrimas, para me encher de gozo; trazendo à memória a fé não fingida que em ti há, a qual habitou primeiro em tua avó Lóide e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também habita em ti. Por este motivo, te lembro que despertes o dom de Deus, que existe em ti pela imposição das minhas mãos. Porque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, e de amor, e de moderação. […] Tu, porém, tens seguido a minha doutrina, modo de viver, intenção, fé, longanimidade, caridade, paciência […].” (2 Tm 1.2-7; 3.10)

O discípulo sincero do Evangelho vive em silenciosa batalha no campo do coração. […] A vitória do espírito exige esforço integral do combatente. E, mais tarde, o lidador cristão é convidado a testemunhos mais ásperos, compelido à batalha solitária, sem o recurso de outros tempos. A lei de renovação modifica-lhe os roteiros, subtrai-lhe as ilusões, seleciona-lhe os ideais. […] Quando o aprendiz receber a dor em si próprio, compreendendo-lhe a santificante finalidade, e exercer a justiça ou aceitá-la, acima de toda a preocupação dos elos consanguíneos, estará atingindo a sublime posição de triunfo no combate contra o mal. (18)


3. Epístola a Tito

A epístola a Tito é também chamada de “pastoral”. O discípulo foi importante associado de Paulo que, como Timóteo, esteve sempre muito próximo do apóstolo.


Acompanhou Paulo em sua segunda viagem a Jerusalém, serviu como seu emissário a Corinto e foi por ele designado para supervisionar a igreja de Jerusalém. Paulo se refere a Tito como seu “parceiro e colaborador” (2 Cor 8.23). Embora Tito fosse um gentio, não se exigiu dele que se circuncidasse, a despeito da opinião de alguns líderes cristãos judeus. Tito simboliza assim a crescente separação entre o Cristianismo e o Judaísmo à medida que cristãos como ele não eram obrigados a observar muitos aspectos da Leis Judaica. (12)


Os assuntos abordados na epístola a Tito são semelhantes aos existentes nas cartas dirigidas a Timóteo. Trata-se de diretivas para a organização e conduta das comunidades confiadas a esses discípulos. Da mesma forma, o estilo de Paulo, ao se dirigir aos dois amigos, “[…] não é mais apaixonado e entusiasta, mas mitigado e burocrático. O modo de resolver problemas mudou. Paulo simplesmente condena falso ensinamento em lugar de argumentar persuasivamente contra ele.” (1)

Em razão dessa drástica mudança de estilo e de argumentação, é compreensível o questionamento a respeito da autenticidade da epístola. (1) Supõe-se que a carta tenha sido escrito por um outro discípulo de Paulo, no fim do século I d.C. (1)


3.1 Síntese dos principais ensinos da epístola a Tito

  • O DISCÍPULO DO CRISTO DEVE EXEMPLIFICAR

“Tu, porém, fala o que convém à sã doutrina. Os velhos que sejam sóbrios, graves, prudentes, sãos na fé, na caridade e na paciência. As mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a santas, não caluniadoras, não dadas a muito vinho, mestras no bem, para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes, a amarem seus maridos, a amarem seus filhos, a serem moderadas, castas, boas donas de casa, sujeitas a seu marido, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada. Exorta semelhantemente os jovens a que sejam moderados. Em tudo, te dá por exemplo de boas obras; na doutrina, mostra incorrupção, gravidade, sinceridade, linguagem sã e irrepreensível, para que o adversário se envergonhe, não tendo nenhum mal que dizer de nós. Exorta os servos a que se sujeitem a seu senhor e em tudo agradem, não contradizendo, não de fraudando, antes mostrando toda boa lealdade […].” (Tt 2.1-10)


O homem enxerga sempre, através da visão interior. Com as cores que usa por dentro, julga os aspectos de fora. Pelo que sente, examina os sentimentos alheios. Na conduta dos outros, supõe encontrar os meios e fins das ações que lhe são peculiares. Daí, o imperativo de grande vigilância para que a nossa Consciência não se contamine pelo mal. […] Quando a treva se estende, na intimidade de nossa vida, deploráveis alterações nos atingem os pensamentos. Virtudes, nessas circunstâncias, jamais são vistas. Os males, contudo, sobram sempre. Os mais largos gestos de bênção recebem lastimáveis interpretações. Guardemos cuidado toda vez que formos visitados pela inveja, pelo ciúme, pela suspeita ou pela maledicência. Casos intrincados existem nos quais o silêncio é o remédio bendito e eficaz, porque, sem dúvida, cada espírito observa o caminho ou o caminheiro, segundo a visão clara ou escura de que dispõe. (15)


4. Epístola a Filêmon


Filêmon foi um cristão que viveu na Frigia no primeiro século da era Cristã.


O principal interesse da breve carta é o destino do escravo de Filêmon, Onésimo. […] Parece que esse escravo havia sido de início útil a seu senhor, mas tornara-se inútil porque, tendo considerado suas condições intoleráveis, fugira de Colossos, provavelmente levando consigo certos objetos de valor pertencentes a seu patrão. A epístola fala do que se seguiu à fuga. Tendo se dirigido para uma cidade maior, Onésimo fora detido e posto na prisão, onde encontrou Paulo. Ali o escravo foi convertido e logo se fez útil a Paulo. Ao ser libertado, o novo cristão teve de decidir o que fazer com relação aos direitos de seu senhor prejudicado. Voltar para ele era correr o risco de severa punição, pois fugir da escravidão era uma transgressão capital e Filêmon teria todo direito de lhe infligir a pena que quisesse. Encorajado por Paulo, contudo, o escravo decidiu retornar e partiu para Colossos, na companhia de Tíquico, e levando essa carta de Paulo. […] Quando a carta foi entregue, o senhor deve ter enfrentado um dilema. A violação de seus direitos de propriedade teria gerado indignação, apoiados como eram pela lei romana e o costume universal. […] Paulo pedia ao proprietário que acolhesse seu escravo como um irmão, aceitasse a restituição do que havia perdido e o tratasse como se fosse o próprio Paulo. […] O que estava em jogo era mais que perdão, pois Paulo parece ter pedido a Filêmon não só libertasse Onésimo, mas que até o enviasse de volta a ele, Paulo, para ajudá-lo no trabalho missionário […]. Nada se sabe sobre a história posterior dos dois personagens […]. (7)


Emmanuel faz significativos comentários a respeito da fraterna atitude de intercessão, operada por Paulo.


Enviando Onésimo a Filêmon, Paulo, nas suas expressões inspiradas e felizes, recomendava ao amigo lançasse ao seu débito quanto lhe era devido pelo portador. Afeiçoemos a exortação às nossas necessidades próprias. Em cada novo dia de luta, passamos a ser maiores devedores do Cristo. Se tudo nos corre dificilmente, é de Jesus que nos chegam as providências justas. Se tudo se desenvolve retamente, é por seu amor que utilizamos as dádivas da vida e é, em seu nome, que distribuímos esperanças e consolações. Estamos empenhados à sua inesgotável misericórdia. Somos d’Ele e nessa circunstância reside nosso título mais alto. Por que, então, o pessimismo e o desespero, quando a calúnia ou a ingratidão nos ataquem de rijo, trazendo-nos a possibilidade de mais vasta ascensão? Se estamos totalmente empenhados ao amor infinito do Mestre, não será razoável compreendermos pelo menos alguma particularidade de nossa dívida imensa, dispondo-nos a aceitar pequenina parcela de sofrimento, em memória de seu nome, junto de nossos irmãos da Terra, que são seus tutelados igualmente? Devemos refletir que quando falamos em paz, em felicidade, em vida superior, agimos no campo da confiança, prometendo por conta do Cristo, porquanto só Ele tem para dar em abundância. Em vista disso, caso sintas que alguém se converteu em devedor de tua alma, não te entregues a preocupações inúteis, porque o Cristo é também teu credor e deves colocar os danos do caminho em sua conta divina, passando adiante. (13)


5. Epístola aos hebreus


Hebreus é um termo étnico, aplicado aos antigos israelitas ou judeus, como são denominados no Novo Testamento. Os judeus convertidos ao Cristianismo preservavam, em geral, traços de sua herança judaica e falavam a língua hebraica ou aramaica. (8)

Discute-se, ainda hoje, o verdadeiro gênero literário desse documento, escrito e dirigido aos hebreus: carta, discurso, tratado escrito sob forma epistolar? Há pontos que sugere um discurso espontâneo, característico da língua falada. (4)

Ao contrário de todas as precedentes, a epístola aos hebreus teve a sua autenticidade posta em dúvida desde a Antiguidade. Raramente se contestou sua canonicidade, mas a Igreja do Ocidente (romana), até o fim do século IV, recusou atribuí-la a Paulo. A Igreja Ortodoxa aceitou com reservas a sua forma literária, conforme escritos de Clemente de Alexandria e de Orígenes. Com efeito, a linguagem e o estilo desta carta possuem uma pureza e elegância diferentes dos demais escritos de Paulo. Pode-se, todavia, reconhecer a ressonância do pensamento paulino onde foi desenvolvido o tema fé. (2)


Essas considerações levaram muitos católicos e protestantes a admitir um redator que se inscreve na ambiência paulina, mas não há acordo quando se trata de identificar o autor anônimo. Todos tipo de nomes foram propostos, tais como Barnabé, Aristião, Silas, Apolo, Priscilla e outros. Parece simples tentar traçar seu retrato: trata-se de um judeu de cultura helenística, familiar na arte oratória, atento a uma interpretação pontual das passagens veterotestamentárias que utiliza, frequentemente segundo versão dos LXX [Bíblia dos setenta sábios ou Septuaginta], para apoiar os seus argumentos. […] Parece que o escrito tenha sido na Itália […] e que tenha sido redigido antes da destruição de Jerusalém [ano 70 d.C.]. (2)


Emmanuel, entretanto, nos afiança que enquanto Paulo aguardava o seu julgamento, em Roma, gozando de relativa liberdade por ser cidadão romano, manteve um encontro com os judeus que residiam na cidade imperial. O esclarecido benfeitor, autor do livro Paulo e Estevão, nos informa que após o referido encontro, o apóstolo dos gentios iniciou o registro de sua Epístola aos hebreus.

Aproveitando […] as últimas horas de cada dia, os companheiros de Paulo viram que ele escrevia um documento a que dedicava profunda atenção. As vezes, era visto a escrever com lágrimas, como se desejasse fazer da mensagem um depósito de santas inspirações. Em dois meses entregava o trabalho a Aristarco [cooperador de e companheiro de prisão, em Roma] dizendo: — Esta é a Epístola aos hebreus. Fiz questão de grafá-la, valendo-me dos próprios recursos, pois que a dedico aos meus irmãos de raça e procurei escrevê-la com o coração. (17)


5.1 Síntese dos principais ensinos da epístola aos hebreus


As preocupações destacadas na epístola são: o perigo da apostasia (Hb 6.4-8; 10.19-39); necessidade de confortar os convertidos que lamentam o abandono do esplendor dos cultos judaicos; fortalecer e tranquilizar as jovens comunidades cristãs. (2)

Os destinatários da epístola são judeus convertidos que viviam no meio helenístico ou gentios fascinados pela cultura hebraica. De alguma forma, esses leitores estavam familiarizados com a Septuaginta, assim como com certas interpretações tradicionais. (Hb 7.1-3; 11.17-19) (3)

  • A SUPERIORIDADE DO CRISTO

“Havendo Deus, antigamente, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos, nestes últimos dias, pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de tudo, por quem fez também o mundo. O qual, sendo o resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, havendo feito por si mesmo a purificação dos nossos pecados, assentou-se à destra da Majestade, nas alturas; feito tanto mais excelente do que os anjos, quanto herdou mais excelente nome do que eles. […] Pelo que, irmãos santos, participantes da vocação celestial, considerai a Jesus Cristo, apóstolo e sumo sacerdote da nossa confissão, sendo fiel ao que o constituiu, como também o foi Moisés em toda a sua casa. […] Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa confissão.” (Hb 1.1-4; 3.1,2; 4.14)

  • INUTILIDADE DOS CULTOS EXTERIORES

“Mas, vindo Cristo, o sumo sacerdote dos bens futuros, por um maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação, nem por sangue de bodes e bezerros, mas por seu próprio sangue, entrou uma vez no santuário, havendo efetuado uma eterna redenção. Porque, se o sangue dos touros e bodes e a cinza de uma novilha, esparzida sobre os imundos, os santificam, quanto à purificação da carne, quanto mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus, purificará a vossa consciência das obras mortas, para servirdes ao Deus vivo? E, por isso, é Mediador de um novo testamento, para que, intervindo a morte para remissão das transgressões que havia debaixo do primeiro testamento, os chamados recebam a promessa da herança eterna.” (Hb 9.11-15)

  • É NECESSÁRIO PERSEVERAR NA FÉ

“Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar no Santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne, e tendo um grande sacerdote sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé; tendo o coração purificado da má consciência e o corpo lavado com água limpa, retenhamos firmes a confissão da nossa esperança, porque fiel é o que prometeu. E consideremo-nos uns aos outros, para nos estimularmos à caridade e às boas obras […]. Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que se não veem. Porque, por ela, os antigos alcançaram testemunho. Pela fé, entendemos que os mundos, pela palavra de Deus, foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente.” (Hb 10.19-24; 11.1-3)

  • NÃO TEMER AS PROVAÇÕES

“Portanto, nós também, pois, que estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo embaraço e o pecado que tão de perto nos rodeia e corramos, com paciência, a carreira que nos está proposta, olhando para Jesus, autor e consumador da fé, o qual, pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a cruz, desprezando a afronta, e assentou-se à destra do trono de Deus. Considerai, pois, aquele que suportou tais contradições dos pecadores contra si mesmo, para que não enfraqueçais, desfalecendo em vossos ânimos. Ainda não resististes até ao sangue, combatendo contra o pecado. […] Portanto, tornai a levantar as mãos cansadas e os joelhos desconjuntados, e fazei veredas direitas para os vossos pés, para que o que manqueja se não desvie inteiramente; antes, seja sarado.” (Hb 12.1-4,12,13)

  • SER CARIDOSO PERMANENTEMENTE

“Permaneça a caridade fraternal. Não vos esqueçais da hospitalidade, porque, por ela, alguns, não o sabendo, hospedaram anjos. Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles, e dos maltratados, como sendo-o vós mesmos também no corpo. […] Sejam vossos costumes sem avareza, contentando-vos com o que tendes; porque ele disse: Não te deixarei, nem te desampararei. […] E não vos esqueçais da beneficência e comunicação, porque, com tais sacrifícios, Deus se agrada.” (Hb 13.1-3,5,16)


Aceitar o poder de Jesus, guardar certeza da própria ressurreição além da morte, reconfortar-se ante os benefícios da crença, constituem fase rudimentar no aprendizado do Evangelho. Praticar as lições recebidas, afeiçoando a elas nossas experiências pessoais de cada dia, representa o curso vivo e santificante. […] Não basta situar nossa alma no pórtico do templo e aí dobrar os joelhos reverentemente; é imprescindível regressar aos caminhos vulgares e concretizar, em nós mesmos, os princípios da fé redentora, sublimando a vida comum. […] Existem milhares de crentes da Boa Nova nessa lastimável posição de estacionamento. São quase sempre pessoas corretas em todos os rudimentos da doutrina do Cristo. Creem, adoram e consolam-se, irrepreensivelmente; todavia, não marcham para diante, no sentido de se tornarem mais sábias e mais nobres. Não sabem agir, nem lutar e nem sofrer, em se vendo sozinhas, sob o ponto de vista humano. Precavendo-se contra semelhantes males, afirmou Paulo, com profundo acerto: — “Deixando os rudimentos da doutrina de Jesus, prossigamos até a perfeição, abstendo-nos de repetir muitos arrependimentos porque então não passaremos de autores de obras mortas.” (16)



ORIENTAÇÃO AO MONITOR: Formar grupos para o estudo dos principais ensinos existentes nas epístolas citadas neste Roteiro. Apresentar, ao final da reunião, uma síntese dos principais ensinamentos, analisados à luz da Doutrina Espírita.




ANEXO


Citação de 1 Pedro, 4.8



Referências:

1. BÍBLIA DE JERUSALÉM. Nova edição, revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2002. Item: Introdução às epístolas de são Paulo, p. 1963.

2. Idem - Item: Introdução a epístola aos hebreus, p. 2083.

3. Idem, ibidem - p. 2083-2084.

4. Idem, ibidem - p. 2084.

5. ENCICLOPÉDIA MIRADOR INTERNACIONAL. São Paulo: Melhoramentos, 1995. Volume 4 (verbete Bíblia: As epístolas), p. 1347.

6. Idem, ibidem - p. 1347-1348.

7. DICIONÁRIO DA BÍBLIA. Vol. 1. as pessoas e os lugares. Organizado por Bruce M. Metzger, Michael D. Coogan. Traduzido por Maria Luiza X. De A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2002, Item: Filêmon, p. 92-93.

8. Idem - Item: Hebreus, p. 107.

9. Idem - Item: Tessalônica, p. 317-318.

10. Idem, ibidem - p. 318.

11. Idem - Item: Timóteo, p. 322.

12. Idem - Item: Tito, p. 323.

13. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Capítulo 17 (Por Cristo), p. 49-50.

14. Idem - Fonte Viva. Pelo Espírito Emmanuel. 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Capítulo 23 (Não é de todos), p. 61-62.

15. Idem - Capítulo 34 (Guardemos o cuidado), p. 85-86.

16. Idem - Capítulo 83 (Avancemos além), p. 217-218.

17. Idem - Paulo e Estevão: episódios históricos do Cristianismo primitivo. Pelo Espírito Emmanuel. 3. ed. Especial. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Segunda parte, Capítulo 9 (O prisioneiro do cristo), p. 558.

18. Idem - Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 25. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Capítulo 79 (Em combate), p. 181-182.


Abrir