O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Vozes da Outra Margem — Familiares diversos


CAPÍTULO 2


Reconforto e paz em sonhos reais

Casto Luiz Alves Barco, jovem de 20 anos de idade, estudante de computação e cursando o 2.º Colegial, perdeu sua vida física em acidente de automóvel, entre as cidades paranaenses Marilândia do Sul e Apucarana, aos 21 de janeiro de 1983.

Sua mãe, D. Zirley Alves Barbosa Ianês, atualmente residente em São José do Rio Preto, SP, ficou profundamente traumatizada com o doloroso e imprevisto acontecimento. Mas, após dois meses, curiosamente, passou a sentir pequena melhora em seu estado físico e mental nos dias em que acordava após vivenciar lindos sonhos. Eram sonhos diferentes dos que até então tivera: bem mais nítidos e expressivos. E, quando acordava, tinha uma sensação diferente, uma impressão de que se encaixava no corpo novamente após algum tempo de afastamento.

O que sonhava? Os locais dos sonhos transmitiam-lhe muita paz e eram lindos. Quando visitava campos, esses se apresentavam sempre emoldurados de montanhas e flores. Alguns detalhes interessantes de seus sonhos foram assim descritos pela D. Zirley, em carta a nós dirigida, datada de 3 de junho de 1986:

“No desespero e na esperança dormia sempre orando, pedindo a Jesus que me ajudasse.

(…) Em sonho, me mostraram a imagem de Jesus muitas vezes, colorida ou em branco-e-preto. (…) Sonhei que estava num jardim todo gramado e sentei-me num banco de ferro todo branco. Disseram-me que ia assistir televisão e, de fato, apareceu numa tela uma senhora linda, toda vestida de branco, que se curvou e apanhou uma flor, sorrindo para mim. Tive a intuição de que era a Virgem Maria. (…) Quase todos os meus sonhos eram repletos de rosas de todas as cores. (…) O que me confortava, naquela época, eram os meus sonhos.”


Na esperança de receber notícias de Casto, sua mãe compareceu à reunião pública do GEP, em Uberaba, na noite de 13 de abril de 1984, pouco mais de um ano após o acidente fatal, quando recebeu longa carta do filho amado, explicando-lhe, entre outros temas, o eficiente trabalho assistencial desenvolvido no Mundo Espiritual em favor dela, e que ficou registrado em sua memória como simples sonhos.

A seguir, as palavras de Casto Luiz:


CARTA DE CASTO LUIZ


1 Querida mãezinha Zirley, n abençoe-me.

2 Estou aqui em companhia da vovó Ana, ou Mariana Pereira, n para falar lhe, tanto quanto ao papai Álvaro, que vou seguindo bem.

3 No início da vida nova a que fui trazido num choque de trânsito que nós dois avaliamos sem a possibilidade de descrever, as minhas dificuldades foram muito grandes.

4 Quando me refiro a nós ambos, sem meios de minudenciar o que se passou no acidente que motivou o meu despojamento do corpo físico, é que eu mesmo não conseguiria enumerar as ocorrências.

5 Quando me senti dentro do estouro que me recordava uma bomba de guerra, imaginei que poderia socorrer os companheiros Ulisses e Maia n que estavam comigo; entretanto, não encontrei recurso algum para movimentar-me.

6 O cérebro como que se me obscurecera de modo total e não me sentia dono das mãos e dos pés, a fim de cumprir o meu dever de fraternidade para com os amigos que me partilhavam aquele deslizar pelos caminhos, despreocupadamente. 7 Não vi, porém, nem o Ulisses e nem o Silião Maia, pois parecia que uma cegueira repentina me tomara os olhos e o próprio discernimento. 8 Era muita agitação para que eu pudesse concatenar ideias para a oração, mas, instintivamente, entreguei-me a Deus, na condição de menino frágil que se recolhe ao regaço materno em momento de perigo.

9 Um leve sopro de brisa que não compreendi me acalmou quase que de repente, à maneira das criaturas perturbadas que a injeção misericordiosa costuma sedar repentinamente. Uma voz amiga me pedia dormir. Dormir!

10 Era tudo o que me restava fazer, porque, a suportar as alucinações que me tomaram de assalto, era preferível o esquecimento de mim mesmo.

11 Senti que dois braços me tomavam com carinho semelhante ao seu e alcancei o torpor que me conduziu ao sono pesado e real que se sucedeu ao baque de forças do qual fôramos vítimas.

12 Mais tarde, sem que eu possa precisar o tempo em que perdurou a minha auto-omissão, despertei sob os cuidados de alguém que me velava pacientemente.

13 Achava-me ainda incapaz de falar, ao modo de alguém que jazia no fundo de um poço, sendo içado vagarosamente por energias que até hoje não pude penetrar.

14 Tive a ideia de estar regressando a mim mesmo. Abri os olhos com dificuldades e notei que não me encontrava em nossa casa.

15 Espantado, dirigi-me, em pensamento, à senhora que me amparava e ela explicou-me com bondade que fora transferido de uma vida para outra.

16 Aquilo me chocou de modo indefinível.

17 No íntimo, trazia a revolta de quem se visse sequestrado à distância do lar; entretanto, a mesma criatura generosa esclareceu-me que eu devia me considerar na posição do viajante que atravessara um grande rio, de margem a margem, a favor de mim próprio. Por enquanto não dispunha de corpo físico para permanecer no mundo dos homens, de que fizera parte.

18 Chorei, sem palavras. Era muito difícil renunciar aos meus projetos de moço que apenas começara a viver; entretanto, a enfermeira dedicada prosseguia me aclarando a mente, dizendo que, se me tornasse forte e valoroso, poderia visitar a nossa casa, em tempo breve.

19 Pediu-me chamá-la por vovó Mariana e comecei no tremendo esforço de autossuperação. Compreendi que não me seria lícito rebelar-me contra uma condição que assinala todas as criaturas mais tarde ou mais cedo. 20 Reaprendi a orar, em companhia de minha avó que me adotara como sendo um pupilo da abnegação de que dava mostras e, depois de alguns dias, pude voltar a vê-la.

21 É verdade que nem as suas percepções, nem as de meu pai Álvaro me registravam a presença, mas com a permissão da vovó Mariana, quanto me era possível, passei a esperar-lhe o sono e, sem que o seu carinho me percebesse a presença, n fizemos, tanto quanto efetuamos até hoje, longas excursões no Espaço que envolve a Terra n e vimos junto espetáculos artísticos de imensa beleza, já que fomos admitidos, por obséquio, em muitos lugares em que pintores exímios ensaiavam recriar a imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo e de outros Espíritos veneráveis.

22 Tudo em novas dimensões, de vez que as figuras se faziam móveis e cada vez mais belas, pelo colorido com que eram plasmadas pelos artistas da Vida Maior. 23 Isso funcionou, por muito tempo, para seu reconforto, qual se fosse viagens de grande significação, das quais o seu coração retornava ao nosso lar com mais coragem para viver e aceitar os problemas da existência terrestre.

24 Mãe querida, muito grato por sua fé comunicando-me renovação espiritual.

25 A luta tem sido enorme para nós, mas estamos vencendo, sob a serenidade do papai Álvaro que nos auxilia a refletir na vida sob prismas novos.

26 Muito teria ainda a dizer; entretanto, a vovó Mariana considera que já escrevi o suficiente para ser entendido.

27 Querida mãezinha, as vibrações de Ariete n me auxiliam na Vida Espiritual e aqui registro o meu carinho aos irmãos Júnior e Alex. n

28 Agora, é terminar; entretanto, a saudade é um imã que me prende ao papel. Mãe querida e meu pai, quero falar-lhes de amor, do amor que lhes consagro; no entanto, a palavra se retrai.

29 Não consigo dizer senão que continuo sendo o filho amigo e reconhecido que não os esquece.

30 As lágrimas de enternecimento, ao ver-lhe a resignação, me sobem do peito para os olhos e sinto que a névoa do pranto de alegria não me permite ser mais extenso.

31 Mãezinha Zirley e querido papai Álvaro, recebam os dois tudo de bom que eu possa sentir sem ainda ter algo de bom para lhes doar e aceitem, como sempre, a tristeza alegre e a alegria triste de que Deus fez a saudade, com todo o amor e toda a dedicação do filho sempre reconhecido,


Casto Luiz Alves Barco.


NOTAS E IDENTIFICAÇÕES


1 — mãezinha Zirley (…) papai Álvaro — Zirley Alves Barbosa Ianês e Álvaro Barco Ianês, seus pais, residentes em São José do Rio Preto, SP.

2 — vovó Ana ou Mariana Pereira — Bisavó, que Casto a chamava, carinhosamente, por vovó. Desencarnou em 1978.

3 — companheiros Ulisses e Maia — Ulisses Martins e Francisco Jorge Silião Maia, companheiros de viagem, falecidos no mesmo acidente, a 21/1/1983.

4 — tanto quanto efetuamos até hoje, longas excursões no Espaço que envolve a Terra — À luz do Espiritismo esse é um dos tipos de sonho, diremos um sonho real, isto é, fundamentado em vivências reais da criatura, parcialmente desligada do corpo físico, no Mundo dos Espíritos. Nessas oportunidades, os Benfeitores prestam a nós, encarnados, várias modalidades de auxílio. (Ver O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, Segunda Parte, cap. 8; Conduta Espírita, André Luiz, W. Vieira, cap. 30, FEB; Estudando a Mediunidade, Martins Peralva, cap. 17, FEB.) Após o recebimento dessa Carta, com suas emoções mais reequilibradas, D. Zirley passou a não ter, com a mesma frequência, esses sonhos nítidos, tornando-se, com o tempo, mais raros.

5 — passei a esperar-lhe o sono e sem que o seu carinho me percebesse a presença — De fato, sua mãe recorda-se apenas de um sonho nítido, no qual dialogou com o filho desencarnado.

6 — Ariete — Noiva.

7 — Júnior e Alex — Irmãos.


Hércio Arantes


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