O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Notáveis reportagens com Chico Xavier reproduzidas do jornal O Globo — Autores diversos


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Em plena sessão espírita, Chico Xavier psicografa uma nova crônica de Humberto de Campos!

“Quanto a mim, digam que eu estava por detrás do Véu de Ísis” — Escreve na referida mensagem o escritor morto.

O início dos trabalhos — A surpresa do engenheiro — Chegam os mortos — O “Modus Operandi” dos Espíritos — A assistência agita-se e o jornalista perde a mais sensacional das entrevistas…


PEDRO LEOPOLDO,  †  25 — (Do enviado especial do GLOBO, Clementino de Alencar) — Continuação — Passam-se três ou quatro minutos de silêncio profundo.

Lá de fora, do mundo dos vivos, chega-nos apenas, abafada, de uma casa distante a “Voz de São Paulo” — novecentos quilômetros ao sul através do rádio: milagre para o século XVI, vulgaridade de hoje…

Vencendo em parte a emoção inicial, ponho um olhar furtivo no médium. Sua cabeça pende um pouco, para frente. Ligeira palidez acentua-lhe o moreno do rosto e, sob as pálpebras semi-cerradas, percebem-se-lhe os olhos imóveis. A mão inerte, armada de lápis, descansa sobre o papel. No rosto, como de cera, apagou-se o sorriso, já não há uma expressão.

E, sobre esse rosto e aquela mão, vela o olhar da assistência.


A Rubrica


Por fim, percebo no médium ligeira palpitação. Seus lábios se abrem, num sopro, e deixam cair esta frase, como em resposta a uma exigência que ainda nem fora feita:

— Emmanuel diz que podem rubricar as folhas…

Emmanuel é o Espírito-guia do médium.

Procuro com os olhos o engenheiro Andrade Pinto e o promotor Washington Floriano. Duas leves expressões de surpresa.

José Cândido me estende o bloco de folhas virgens, ao alto das quais deixo a minha rubrica.

O mesmo fazem o promotor e o engenheiro.

O bloco volta ao médium. De novo seu rosto e seus olhos se imobilizam na inexpressão.

Mais um minuto de silêncio, e a mão do médium reanima-se, procura o alto da primeira folha.


Os mortos chegam


São “os mortos que chegam”, segundo a imagem que nos sugerira, há pouco, a expressão de um dos presentes ante a casa cheia de vivos.

O lápis desliza, rápido, e o seu rasto, sobre o papel, é uma letra grande, bonita, redonda.

São versos. De lá, pois, no mundo misterioso e distante das sombras invisíveis um poeta de outros tempos desceu e canta agora sobre o silêncio das nossas almas.

José Cândido vai virando as folhas. A mão do médium grafa a primeira assinatura e, depois de ficar um instante suspensa no ar, prossegue, rápida. Mais versos. A letra torna-se então miúda, reta. Outra assinatura. Outro poeta. Outra pausa ligeira. E a mão retorna ao papel. A letra arredonda-se, de novo, mas já não tão grande e bonita como a primeira. É ainda um poeta — ou melhor, uma poetisa, conforme verificamos depois — o terceiro iluminado que nos envia o seu canto, a sua mensagem, a sua confidência.

O “modus operandi” dos Espíritos


Tudo o mais, no médium, é imobilidade. E, enquanto a mão corre ágil, sobre o papel, a atenção com que a acompanhamos se dilui por vezes, numa indagação muda e profana do nosso entendimento, seduzido pelo fenômeno.

Será mesmo, aquele que ali está à nossa frente, o caixeirinho simplório de “seu” Zé Felizardo?… Mas então e aquela imprevista faculdade criadora que a mão calosa revela?!…

Consultando na véspera, o arquivo de Chico Xavier, lemos, numa daquelas mensagens do Além esta passagem em que Emmanuel, o Espírito guia do médium, nos dá uma explicação sobre o “modus operandi” dos Espíritos:

“Enviam aos homens a sua mensagem luminosa dos cimos resplandecentes em que se encontram e, formulando o desejo de ação nos planos da materialidade, a sua vontade superior atua imediatamente sobre o cérebro visado, o qual se encontra em afinidade com as suas vibrações e através de forças teledinâmicas, as quais podeis vagamente avaliar com os fluidos elétricos, cuja utilização encetais na face do vosso mundo, influenciam sobre a natureza do sensitivo, afetando-lhe o sensório, atuando sobre os seus centros ópticos e aparelhos auditivos, desaparecendo perfeitamente as distâncias que se não medem; na alma do “sujet” começa então a se operar a série de fenômenos alucinatórios sob a atuação consciente do Espírito que o guia dos planos intangíveis.

“Este, segundo a sua necessidade, indu-lo a ver essa ou aquela imagem, em vibrações que o envolvem, as quais o sensitivo traduz de acordo com as suas possibilidade intelectivas e sentimentais.”

Dos Planos intangíveis… Eis de onde nos chegam, segundo a explicação espírita, aquelas “mensagens luminosas”, o brinde imprevisto daqueles versos. E mais se nos aguçam as faculdades perceptivas, a ideia daquelas “vibrações que envolvem o médium”, que, pois de certo, já ali palpitam, invadem o ambiente, alagam de estranhos eflúvios o silêncio transformando, de improviso, a residência pobre de um seleiro do sertão, numa espécie de parlatório maravilhoso onde vão conversar a Vida e a Morte.

A impressão é tão forte que, instintivamente, erguemos a cabeça e olhamos em redor, na esperança — talvez também com o pobre receio humano — de um sinal mais perceptível daquele mistério que nos tenta e assombra.


Dez minutos


Nada. Em redor, tudo é silêncio e imobilidade. A vida resume-se numa grande e atenta mudez. E, do Além só o milagre daquela mão que corre na vertigem do cursivo redondo.

Súbito uma pausa, mais demorada um pouco do que as antecedentes.

José Cândido põe de lado as folhas já escritas.

A vida faz então uma observação quase ciciada pela boca do promotor Washington Floriano:

— Dez minutos…

Foi o quanto durou a corrida do lápis sobre o papel.


Por detrás do véu de Ísis


A pausa, porém, é muito curta. Logo o lápis retorna ao papel, veloz como sempre. Agora, é prosa. Parece que a vertigem aumentou. As páginas se sucedem com rapidez. Em dado momento conseguimos ler, mas apenas frases esparsas, entre as quais esta que gravamos logo:

“Quanto a mim, digam que eu estava por detrás do véu de Ísis.”

Quem será que agora nos fala, dos cimos resplandecentes?…

Há um momento em que minhas ideias se confundem, entre a curiosidade e a atenção. Esta, desviada, pára na voz abafada do rádio que nos manda aos ouvidos um trecho de opereta. Mas a voz de José Cândido me surpreende:

— Concentrem-se, irmãos. A corrente está fraca…

Realmente a mão do médium estacara. Mas foi tudo um instante. A “corrente”, de certo, intensificou-se outra vez, porque o lápis retoma o cursivo.

Intimamente, me ocorre:

— Teria sido eu a causa do enfraquecimento… O trecho de opereta?… o rádio?… a atenção erradia?…

Vem-me a curiosidade de verificar. Torno a atentar na música. Mas o acidente não se renovou. A “corrente” sustentou o médium até ao fim. E quando ele pôs ao fim da mensagem em prosa, o nome de Humberto de Campos, a assistência não se contém mais. Começa a agitar-se um pouco. Mãos ansiosas se estendem e apanham as páginas escritas.

Um sussurro de comentários abafados invade o silêncio. O presidente da sessão pede que se renove a concentração:

— Há duas consultas sobre a mesa, para serem respondidas. Mas o sussurro não cessa. Pelo contrário, acentua-se.

Ergo a mão e faço um sinal ao José Cândido. Esse é para mim o momento decisivo. Eu tenho algumas perguntas a fazer àquele que — mistério e milagre — lá dos “Planos inatingíveis”, assina ainda na terra Humberto de Campos, pela mão humilde de Chico Xavier.

 Mas é tarde. A assistência continua a agitar-se. A “corrente” quebrou, de vez.

O médium deixa cair a cabeça sobre as mãos, como que exausto. Sob os meus lábios borbulham inutilmente as perguntas que eu trazia.

Eu perdera a mais sensacional das entrevistas…


Clementino de Alencar


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