Bíblia do Caminho Testamento Xavieriano

Antologia dos Imortais — Autores diversos — 3ª Parte


8n

Andradina de Oliveira


1

CONFIDÊNCIA DE MÃE

  1 Dei-te um berço de rendas e de flores,

  Adorei-te por nume excelso e amigo

  E inclinei-te, meu filho, a ser comigo

  Soberano de sonhos tentadores.


  2 Ordenava, no orgulho que maldigo:

  — “Não te curves nem sirvas, onde fores…” n

  Entreguei-te mentiras por louvores

  E enganosa fortuna por abrigo.


  3 Hoje, de alma surpresa, torno a casa;

  Tremo ao ver-te no luxo que te arrasa,

  Como quem dorme em trágico veneno !


  4 E choro, filho meu, choro vencida,

  Por guardar-te entre os grandes toda a vida,

  Sem jamais ensinar-te a ser pequeno.


2

SOLUÇO MATERNAL

  1 Perdoa-me a loucura, pobre filha,

  Entreguei-te ao salão, inerme criança, n

  E ao dizer-te: — “repousa, folga e dança”,

  Envolvi-te em meu logro, de partilha…


  2 Contemplo-te a bailar… O palco brilha…

  És volúpia, beleza, intemperança…

  Escuto em prece o aplauso que te alcança

  E lamento a vitória que te humilha…


  3 Ah! minha triste pérola perdida,

  Novamente daria sonho e vida

  Para furtar-te ao fogo em que te abrasas!


  4 Mas tudo agora é a mágoa que me entrega

  À imensa dor de ver-te rica e cega,

  Mariposa queimando as próprias asas!…


2-A

BRANDURA

  1 Asserena-te e vara a desventura

  No caminho de dor, áspero e azedo;

  Serenidade — o lúcido segredo

  Em que a vida se eleva e transfigura.


  2 Tudo cresce na força da brandura.

  A água desgasta os punhos do rochedo;

  Olha a chuva cantando no arvoredo,

  A transfundir-se em pão, bondosa e pura.


  3 De coração batido e lodo à face,

  Inda que o fel da injúria te traspasse,

  Semeia o bem que as mágoas alivia…


  4 Mesmo trazendo o peito por cratera,

  Suporta, ampara e crê, ajuda e espera,

  Que amanhã será sempre novo dia.


ANDRADINA América DE Andrada e OLIVEIRA — Poetisa, contista, romancista, iniciou sua vida literária, quase menina, conforme afirma sua filha Lola de Oliveira em Minha Mãe!, escrevendo em inúmeros periódicos sul-riograndenses. Foi também teatróloga e aplaudida conferencista. Professora pela Escola Normal de Porto Alegre, com distinção em todas as matérias, a poetisa de Folhas Mortas lecionou em cursos particulares, em várias cidades gaúchas, depois de nove anos dedicados ao magistério público. Fundou um jornal literário feminino, O Escrínio, mais tarde transformado em revista ilustrada, e formou, segundo Antônio Carlos Machado, entre as maiores feministas brasileiras de sua época. De 1920 até à sua desencarnação, residiu na capital paulista. (Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 12 de Junho de 1878 — S. Paulo, 19 de Junho de 1935.)

BIBLIOGRAFIA: Folhas Mortas; Preludiando, contos ; Cruz de Pérolas, contos; etc.



[1] As poesias de números ímpares foram recebidas pelo médium Francisco Cândido Xavier e as de números pares pelo médium Waldo Vieira. Dispomo-las assim, por sugestão dos Amigos Espirituais.

[2] onde. No Roteiro Literário do Brasil e de Portugal, vol. I, pág. 48, nota 5, lê-se: “onde: aonde. Nos melhores autores, antigos ou modernos, não se observa, em geral, a distinção entre onde e aonde que os gramáticos acham ser de rigor.”

[3] Ler com sinérese: crian-ça.


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