1 Disse Jesus na Terra: “Eu sou o pão da vida”.
E ansiando seguir os passos do Senhor,
Quis ser, de minha parte, a migalha sem nome
De algo que alimentasse a estranha fome
Dos que morrem no mundo à carência de amor.
2 Indaguei do mentor que me assistia,
Quanto a ideia de que me via presa
E ele apenas me disse: “Se procuras
Nutrir o coração das criaturas,
Ouve as informações da Natureza”.
3 Interroguei a Terra e a Terra falou calma:
— “Para a manutenção dos seres que acalento
Preciso tolerar enxadas e tratores
E abrir-me em golpes dilaceradores
Sem que ninguém me veja o sofrimento”.
4 Velho tronco explicou-me: “Vivo ao tempo,
Trabalhando sem perda de minutos,
Renovo o ar, produzo fartamente,
Mas padeço agressões de muita gente,
Sem que eu possa contar meus próprios frutos”.
5 Entrevistando o Trigo, ei-lo a dizer-me:
— “Devo entregar-me sem explicação
À mó que me constringe e me tritura,
Fazendo-me farinha clara e pura,
Que assegure na mesa o júbilo do pão”.
6 Em tudo achei no alento para a vida
O extremo sacrifício em constante processo
Plantas gemendo em todos os instantes
E óleo a queimar-se em máquinas gigantes,
Sustentando a energia do progresso.
7 Reconheci então ser preciso esquecer-me,
Apagar-me ao servir, alegrar-me na dor,
Aprender humildade, amparar sem barulho
E despojar-me, enfim, de todo o humano orgulho
Para ser luz e paz, auxílio e amor.
Maria Dolores
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