Jovem inteligente e ativo, André destacava-se nos estudos, sempre entre os primeiros da classe, e nos esportes, vencedor de várias e honrosas medalhas.
Quando cursava com brilhantismo o 2º ano de medicina, da Fundação Educacional Souza Marques, no Rio de Janeiro, sofreu um mal súbito que o levou rapidamente à morte, na véspera de completar 19 anos de idade, aos 4 de janeiro de 1973. A causa do óbito seria constatada depois: uma ruptura de um traiçoeiro, e até então silencioso, aneurisma cerebral.
André Luiz Souza da Silva, nascido aos 5 de janeiro de 1954, era filho do casal Luiz Dantas da Silva — Nêumis Souza da Silva.
Mas ele voltaria…
Sim. Poucos anos depois da inesperada partida para o Mais Além, ele voltou a conversar com seus entes queridos que deixou na Terra, por abençoado correio mediúnico.
Chico Xavier foi o intérprete do pensamento desse filho amoroso, psicografando laudas e laudas de um verbo convincente, esclarecedor e, acima de tudo, consolador para desesperançados progenitores.
Em entrevista epistolar com os pais de André, atualmente residentes em Juiz de Fora, MG, não os interrogamos sobre o período difícil e aflitivo que passaram após a desencarnação do querido filho. Tomamos essa atitude para não provocar recordações de tempos amargos, como também pelo fato de o casal já ter prestado, em 1977, informações minuciosas ao confrade Rubens S. Germinhasi, incluídas
no livro Luz Bendita (F. C. Xavier, Emmanuel, Ed. IDEAL). Desse depoimento, transcreveremos, a seguir, alguns tópicos, úteis como preâmbulo à leitura das cartas mediúnicas de André publicadas no próximo Capítulo [do livro impresso]:
“Devo a minha existência a esse abnegado e incansável médium (Xavier), companheiro e orientador, pois pensava seriamente em desistir desta encarnação. As mensagens (de André) chegaram no momento mais crítico de minha vida. (…) Hoje, professando a Doutrina Espírita, encontrei o lenitivo que muito esperava.” (Declaração de D. Nêumis)
“Com o meu endosso às palavras de minha esposa, gostaria de levar o meu reconhecimento de público a tão ilustre figura de Chico Xavier. (…) Meu desejo sempre foi muito grande em conhecê-lo pessoalmente, mas em situações mais alegres. Mesmo assim, nossa alegria é eterna por tudo o que representou para nossa família, na sua transformação ao encontro do Caminho, da Verdade e da Vida.” (Declaração do Sr. Luiz Dantas)
PRIMEIRA CARTA
1 Mãezinha querida, meu pai.
Primeiro, abençoem-me. É o que lhes peço.
2 Venho pedir forças às forças maternas. Muito estranho que isso aconteça. 3 Mas a ideia de independência absoluta, a meu ver, é franca ilusão. Todos somos interdependentes. n Mesmo depois da morte do corpo. 4 Saudade é isso: dependência do concurso de alguém que amamos. Gravitação entre os mundos e atração no campo dos átomos não são outra cousa. Interdependência atuante. É por isso, mãezinha, que lhe rogo coragem para viver.
5 Meus companheiros não se formam sozinhos, em nos referindo, a nós outros, os acadêmicos que voltamos para a Vida Maior. Somos apenas transferidos. Meu ideal de Medicina está realizado. Agora, meu pai, é só trabalho que me conferirá a necessária especialização e por isso preciso agir e servir tanto quanto possível a fim de consolidar o que andei estudando aí e aqui.
6 Mãezinha, o esforço no bem nunca se perde. Peço seja isso dito à nossa estimada Neyle, n para quem rogo a Deus a bênção da felicidade.
7 A luta prossegue. E prossegue sob os laços espirituais a que me reportei. Se aqueles que deixamos na Terra esmorecem na luta, é preciso ser muito forte aqui para não cairmos em depressão. Tristeza é contagiosa, entre os que se amam. 8 O que foi feito, mãezinha, para a restauração de suas forças nos tempos últimos, seu filho não sabe descrever. Recorri a todos os amigos experientes que conheço para ajudar-nos; o nosso amigo Dr. Alcides de Castro n e eu mesmo, recordando o nosso caro amigo Dr. Raphael, n não repousamos, ao lado de outros médicos amigos para assegurar as suas melhoras. 9 E isso não foi fácil, porque, lá no fundo de seus exames, em nosso lado espiritual, destacava-se a marca de sua quase desistência da vida terrestre. n Mãezinha, isso fica nas forças chamadas inconscientes e são registradas aqui. Peço-lhe hoje para que revivifique. Lembre o papai, aflito, pedindo a Deus por nós. 10 E rogo-lhes — pedindo isso aos dois — para que desejem viver por tempo tão longo quanto nos seja possível, porque preciso preparar-me, com mais segurança, a fim de esperá-los.
11 Sou novo, de novo, na vida nova. Experimentem compreender isso. Devo trabalhar muito para criar méritos, de modo a recebê-los um dia com o amor e a segurança com que me acolheram na Terra.
12 Mãezinha, um médico pode fazer uma palestra sobre células e doenças, empregando terminologia adequada, para que se faça sentir habilitado ao conhecimento que entesourou em si mesmo; no entanto, concorde comigo, que não existem médicos sem mães, ainda mesmo que estejam no mundo em plena ancianidade. 13 Por isso, quero esquecer os assuntos em que me detive nas páginas anteriores para pedir a meu pai que proteja a nossa querida Miúda, porque tenho necessidade de recorrer à intimidade familiar, recordando a minha própria infância, quando comecei a chamar você, querida mãezinha, por Miúda e Chupetinha. n
14 Às vezes, o Espírito fora da matéria mais densa deseja planar em linguagem sempre mais alta, mas para os pais e especialmente para as mães, em muitos lances de nossos apelos, necessitamos recorrer às passagens do lar que ficam sendo somente nossas. Pois viva, querida Miúda, para nós, viva para a execução das Leis de Deus que não desejam a desencarnação prematura para ninguém. Viva, mãezinha, e se trate como é necessário.
15 Venho com a Bisa e com o vovô Martinez n pedir a você reagir contra o desalento. Desânimo de lutar e de viver é doença grave. n Sei que você dirá que não desanimou, mas o que vem a ser a tristeza, senão desânimo disfarçado? 16 A vida do lado de cá é muito mais ativa e, para quem aqui aporta no momento justo, apresenta oportunidades maravilhosas de elevação e de alegria. 17 Na Terra, devemos ser descobertos pela morte, mas nunca devemos pensar em descobri-la. Se a morte nos encontra em serviço, melhor. Passaremos de uma estrada para outra, como quem atravessa um trevo complicado seguindo a sinalização certa.
18 Não se agaste se o filho recorda o doce nome de Chupetinha. É o anseio de acordar as suas energias mais íntimas para continuarmos em nossas tarefas. Mãezinha, recordemos nossas crianças e nossos doentes. Cooperarei nos tratamentos e você com papai zelarão pela assistência. Trabalhemos. Peço-lhe para que mantenha pontualidade nos remédios. Isso é necessidade clara e simples, tanto quanto necessidade clara e simples é a exigência da alimentação regular.
19 Agradeço à nossa irmã Nelita por nos haver acompanhado. O amigo Paulo Barbosa, n nosso querido amigo e compositor de belas inspirações está presente e deixa para ela o coração de companheiro. Estamos todos vivos, prosseguindo na boa luta, isto é, trabalhando sempre para melhorar situações e cousas de modo a melhorar-nos.
20 Mãezinha e meu querido pai, perdoem-me tantas lembranças, mas precisava conversar com mãezinha para fazer-lhe notar que o médico de hoje não mudou o filho de ontem.
21 Mãezinha, fique alegre, porque confiança em Deus é o maior remédio para a saúde do corpo e da alma. E com os nossos amigos que nos acolhem aqui, numa carta despretensiosa de filho reconhecido, recebam o abraço em que os reúno, a ambos, canto a canto do peito, em meu próprio coração.
22 Deus nos fortaleça e nos proteja. Nesta oração final, ofereço aos pais queridos todo o carinho do filho que não os esquece, sempre o filho da esperança e do coração, sempre e cada vez mais reconhecido, n
André Luiz.
NOTAS E IDENTIFICAÇÕES
1 - Carta recebida pelo médium Francisco C. Xavier, em reunião pública do Grupo Espírita da Prece, na noite de 11/6/1977, em Uberaba, Minas.
2 - Todos somos interdependentes. Mesmo depois da morte do corpo. — Uma grande verdade, que merece a nossa meditação.
3 - Neyle — Dra. Neyle Maria das Neves Maia, residente no Rio de Janeiro, foi sua colega de Faculdade e de classe. Era sua colega predileta, por quem nutria uma profunda amizade.
4 - Dr. Alcides de Castro — Dr. Alcides Neves Ribeiro de Castro, médico desencarnado há mais de 20 anos. Foi presidente do Grupo Espírita Regeneração, no Rio, fundado pelo Dr. Bezerra de Menezes. “Era nosso grande amigo e foi ele que me levou à Doutrina Espírita.” (Sr. Luiz)
5 - Dr. Raphael — O Sr. Luiz acredita tratar-se do Dr. Raphael de Souza Paiva, médico e amigo de seu filho, residente no Rio.
6 - Destacava-se a marca de sua quase desistência da vida terrestre. — De acordo com o depoimento de D. Nêumis.
7 - Quando comecei a chamar você, querida mãezinha, por Miúda e Chupetinha. — “Apesar do nosso respeito ao médium, tínhamos acertado que só consideraríamos “autêntica” a mensagem em que ele se referisse a esses apelidos, só por nós conhecidos. Quando Chico leu a mensagem foi um dia de grande emoção, não só para nós, como também às pessoas presentes, pois muitos choraram, fato registrado inclusive pela revista Manchete, cujos repórteres se encontravam lá naquela noite. (Sr. Luiz)
8 - Venho com a Bisa e com o vovô Martinez — Maria Ribeiro Martinez e Manoel Martinez, seus bisavós. D. Maria faleceu em 13/3/1964 e o seu marido há mais de 60 anos.
9 - Desânimo de lutar e de viver é doença grave. (…) Na Terra devemos ser descobertos pela morte, mas nunca devemos pensar em descobri-la. — No trabalho do Bem, Entidades Espirituais alertam para o perigo do suicídio, que sempre acarreta grave desequilíbrio espiritual e perispiritual após a morte física. Aqui vemos um amoroso filho socorrendo sua progenitora, quando enferma, com orientações preciosas para todos nós.
10 - Nelita e Paulo Barbosa — Paulo Barbosa, desencarnado há muitos anos, foi um grande compositor. A maioria de suas músicas foram gravadas por Carlos Galhardo. D. Nelita, sua esposa, residente no Rio, estava presente à reunião em companhia dos pais de André.
11 - Ao final da mensagem impressa e divulgada pela família, os pais de André colocaram a seguinte “Declaração: Declaramos, para os devidos fins, que o teor desta mensagem — fatos, nomes e situações — é absolutamente autêntico, pois era completamente desconhecido do médium Francisco C. Xavier.
“(a) Luiz Dantas da Silva / Nêumis Souza da Silva.”
“Prossigamos juntos, procurando mais luz que nos guarde em Jesus.”
1 Senhora Dona Nêumis,
não me sinto feliz,
ao saber
o que vai acontecer. n
2 Querida mãezinha, essa roupa que eu tinha, de nome corpo humano quase que já se desfez. Entretanto, sem temer reencontrar-me no recanto da Velha Penitência os restos da existência, n você já se prepara, ante a estranha visita. Peço ao papai Luiz não impedi-la em seu desejo, porque pelo que vejo a coragem de minha Chupetinha é a coragem real, irmã da minha. 3 Fique, porém, sabendo, que é melhor fazer-se acompanhar por vovó Vitalina, porque a sua emoção decerto lhe será no coração, tão estranha e tão forte que você, mamãe, recordará, chorando, a minha própria morte. Lembre-se, porém, de que estará o seu Dezinho n ao seu lado e tão pertinho que lhe peço pensar em meu progresso e não em nossa retaguarda…
4 Veja o que fui e fique habilitada para saber por fim que em minha nova estrada tudo é vida e beleza, esperança, alegria, natureza e que a morte é somente um retrato infeliz que se guarda no mundo daquilo que se foi e que não volta mais, de vez que todos somos imortais.
5 Transladação, mudança e novo apartamento, afinal eu não sei para que renovar o nosso sofrimento. Mas enfim meus pais querem e nunca serei eu quem vá contrariar quem tanto me deu. 6 Um dia a cremação n conduzida a preceito fará sobre este mundo, um campo mais perfeito para instalar nossas recordações… Esperemos, porém, mas com calma e esperança, o tempo que vem longe, em que a fé nos resguarde em plena segurança…
7 De qualquer modo, mãe, agora o que mais me interessa é a outra mudança, em que papai junto a você ganhará nova ideia, nova saúde e nova paz, à distância da boa Dulcineia, n e mais longe daquele coração que se nos faz tão caro à nossa própria fé, nossa querida tia e irmã, irmã do coração, a Maria José. Sigamos, pois, em frente, buscando um novo lar e prossigamos juntos, procurando mais luz que nos guarde em Jesus.
8 Nosso Paulo Barbosa está presente e entrega à nossa irmã, a querida Nelita, o brinde de uma rosa que ele trouxe de nobres melodias, que ele somente sabe compreender, numa rosa de estrelas formando o coração que ele guarda sempre para a esposa querida que lhe inspirou a vida.
9 E agora, até breve na antiga Penitência, que parece ser a terceira. Olhe, mamãe Miúda, que a visita não será brincadeira. Mas você quer fazer o rápido confronto entre aquilo que fui e aquilo que hoje sou; isso me deixa quase tonto, com receio de vê-la amargurada, mas já não posso agir de modo diferente. Você irá e eu irei, o papai talvez não; ficará no portão numa prece por nós, mas note bem que lhe espero o valor para vencer com amor a prova a que se dá…
10 E pense que a espero tão sadia e feliz quanto a vejo e tanto quanto a quero, para irmos em paz, respirar, renovar, modificar a vida na luz de outro lugar onde estejamos como sempre, sempre unidos em Deus.
11 Receba, mãe querida, os pensamentos meus, com papai e com todos — todos os que nos formam o ramo de carinho e de saudade, tanto na Terra, quanto nas luzes da imortalidade.
12 E aqui termino, minha santa Nêumis,
Com um beijo de ternura,
Que vem da fonte oculta e sempre bela e pura,
Do amor sempre feliz
Do seu filho de sempre, do seu André Luiz.
NOTAS E IDENTIFICAÇÕES
12 - Carta recebida pelo médium Francisco C. Xavier, em reunião pública do Grupo Espírita da Prece, na noite de 19/8/1978, em Uberaba, Minas.
13 - O leitor observará que nesta carta André usa um estilo diferente de linguagem — uma agradável prosa rimada, — embora continue a dar as mesmas provas de sua presença espiritual junto à família, como fez na mensagem anterior.
14 - Sem temer reencontrar-me no recanto da Velha Penitência os restos da existência, você já se prepara ante a estranha visita. (…) é melhor fazer-se acompanhar por vovó Vitalina — O pai de André esclarece-nos: “Na ocasião da mensagem, estávamos para fazer a transladação dos ossos para uma urna perpétua que adquirimos, e como acreditávamos que nossa emoção seria forte demais, buscamos encontrar forças espirituais ao lado do amigo Chico, sem nada lhe dizer do nosso receio. Fomos surpreendidos pela mensagem. Velha Penitência, a que ele se refere, é o cemitério da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, no Rio, onde seu corpo foi sepultado. André era irmão da Ordem. Tínhamos combinado que Nêumis iria assistir ao ato junto com sua mãe, D. Vitalina. Eu ficaria no portão para qualquer eventualidade. Posteriormente, conforme programado, a transladação foi efetuada.”
15 - Dezinho — Era assim chamado pelos familiares.
16 - Um dia a cremação (…) — Em vida material, André achava que a cremação era uma necessidade do mundo atual.
17 - Dulcineia e Maria José — Parentes com quem os pais de André residiam, no Rio. Na época, estavam de mudança para Juiz de Fora.
Hércio Arantes