1 Querida mãezinha Sonia. Quatro anos estão à porta. Penso que para nós todos a hora é mais para agradecer.
2 As lágrimas nos visitam, entretanto, a certeza da imortalidade superou o sofrimento. Estamos mais tranquilos, sentimo-nos amadurecidos para a experiência da vida.
3 O pensamento se me desloca do cérebro, à procura do pensamento do querido papai David, a fim de orarmos juntos.
4 Sei que o papai ainda chora, que a mãezinha Sonia se desfaz no pranto da saudade materna, que os irmãos me oferecem flores à memória.
5 Tudo isso me sensibiliza, no entanto, ousaria afirmar que de todas as bênçãos recolhidas na ânfora do espírito, as ideias do serviço em favor das crianças desamparadas me parecem o primeiro fruto sazonado de nosso reencontro.
6 Estaremos mortos, quando testemunhamos tanta vida? Permitir-se-nos-ia o regresso aos entes amados, unicamente para exibir a personalidade além das cinzas?
7 As mensagens são muitas, os comunicantes se sucedem uns com os outros, e a divulgação das ideias em torno da imortalidade se espalham em todas as direções. Entretanto, as vozes proféticas de todos os tempos nos previram a volta. Retorno com finalidades fundamentais.
8 Os vivos da Imortalidade também pedem. Solicitam serviço na construção do bem para os outros.
9 Não teríamos consentimento para rever os entes amados, unicamente como expressão romântica de nosso reerguimento da horizontalidade no chão a que se nos confiaram as últimas lembranças. Não só para redizer as formosas palavras da Lei, ( † ) mas para que nos disponhamos a cumpri-la.
10 Sei que o papai David e mesmo o seu coração de mãe vão realizando o máximo em favor dos doentes e das crianças necessitadas, no entanto, as nossas ações esporádicas no bem ao próximo estão circunscritas ao mundo pessoal de nós mesmos.
11 Esperam-se de nós obras e tarefas estáveis no espaço e no tempo. Ainda mesmo que a nossa edificação signifique um pingo de serviço permanente aos companheiros do mundo, temos um ponto de apoio para deslanchar ao encontro daqueles a quem proporcionaremos consolação e socorro.
12 Por isso, neste quarto aniversário de Vida Espiritual, venho confirmar-lhe que estamos disponíveis para servir na cantina do leite, em benefício diário dos meninos, nossos irmãos que estão abordando a Terra à procura de amparo, a fim de que se solidifiquem na fé.
13 Nossa palavra não expressa intimação, nem cobrança. Prometemos. E a nossa instituição singela começará a produzir o suprimento das bênçãos para muitas crianças que marcharão no rumo do porvir, conduzindo a mensagem de bondade humana de que nos sentimos portadores.
14 Sem dúvida, as belas frases são tentadoras, mas, depois de tempo certo, é indispensável transformá-las em boas obras que colaborem com o levantamento do novo mundo.
15 Mãezinha Sonia, isso é o que eu desejava escrever, expressando não só os meus pensamentos, mas também as reflexões da vovó Rachel, da querida bisa Malke, do Boris, do Moyses que se encontram presentes. n
16 Palavras gerando serviço, ideais formando construções. Assim, os nossos natalícios da Vida Espiritual serão celebrados com mais calor humano, na bênção divina que fomos chamados a expressar.
17 Sigamos ao encontro do nosso recanto do cálcio, através do leite, destinado às crianças que requisitam saúde para a continuidade da própria vivência no mundo. Auxiliá-las sem pretensão, apoiá-las sem títulos de benfeitores, já que, consoante os nossos princípios, a proteção do próximo é dever.
18 Agradeço as flores encomendadas para o 14 próximo n e os equipamentos em que a nossa ternura recíproca se revele na saudade que sofremos juntos, mas que essas emoções não caiam no terreno do vazio e, sim, na força espiritual empenhada na edificação do mundo novo.
19 Fala-se de promessas formuladas na cúpula da governança, quanto ao socorro aos que necessitam, entretanto, o assunto não se resume a cifras geladas ou congeladas no papel.
20 Tudo evolui, tudo cresce e a nossa confiança mútua produzirá os frutos que nos correspondam ao propósito de agradecer.
21 Tudo isso apenas se consegue com trabalho sem fadiga e sem pausa. Desse modo, ao externar-lhes os nossos agradecimentos do coração, pedimos para que a nossa atenção se volte para a concretização do bem de que nos confessamos portadores.
22 Envie parabéns aos irmãos queridos pelo triunfo legitimo nos estudos. Renato e Rosana conquistaram a palma da equação perfeita obtida com a junção do ideal transfigurado em realidade. n
23 Mãezinha Sonia, isso é tudo o que lhe desejaria transmitir, a nossa expectativa por serviço definitivo que nos justifique as mensagens de amor e paz.
24 Nossos amigos e familiares se despedem, endereçando votos de paz a todos os nossos e a todos a quem devemos solidariedade e união.
25 E reunindo-a com o papai David em meu profundo amor, sou como sempre o filho, sempre seu,
Roberto Muszkat
12 de março de 1983.
NOTAS
1) Malke Golcman, bisavó materna, falecida durante a Segunda Guerra Mundial.
2) 14 de março, data de seu falecimento.
3) Renato ingressara nas Faculdades de Direito e Economia e Rosana, na Faculdade de Direito.
David Muszkat