O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Pontos e contos — Irmão X


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Em sessão prática

1 A situação no grupo doutrinário apresentava anormalidades significativas. Desentendiam-se os companheiros entre si. Olvidando obrigações respeitáveis, confiavam-se a críticas acerbas. Acentuavam-se hostilidades mal-disfarçadas de cizânia, orientadas pela incompreensão. Ninguém se lembrava d’Aquele humilde e divino servidor que lavara os pés dos próprios companheiros. Cada aprendiz da comunidade chamava a si a posição de comando e o direito de julgar asperamente.

2 Debalde os mentores espirituais da casa convidavam à ponderação e ao entendimento recíproco.

Os operários descuidados recebiam-lhes as palavras, sem maior atenção pelas advertências educativas.

3 É que Cláudio e Elias, os dois abnegados diretores invisíveis do agrupamento, não se inclinavam a exortações contundentes.

4 Entre os desencarnados de nobre estirpe, há também fidalguia, cavalheirismo e gentileza e, na opinião deles, não deviam tratar os irmãos de trabalho como se fossem crianças inconscientes.

5 Certa noite em que as vibrações antagônicas se fizeram mais fortes, anulando os melhores esforços no campo da espiritualidade edificante, Elias dirigiu-se a Cláudio, sugerindo, esperançoso:

— Creio de grande eficácia a visita de alguns sofredores ao núcleo dos nossos amigos encarnados. Poderiam assim observar, de perto, os efeitos escuros da vaidade e da indisciplina. Amanhã, teremos sessão prática, de há muito tempo esperada, e admito a oportunidade de semelhante lição.

6 — Excelente medida! — Exclamou o colega, satisfeito, — não seria razoável recordar obrigações comuns, de modo direto, a cooperadores nossos que estudam o Evangelho, todos os dias. Afinal de contas, não obstante mergulhados na carne, possuem tantos deveres para com Jesus quanto nós, e, se já receberam inúmeras mensagens sobre as necessidades de ordem e concurso fraterno, como insistir com eles no serviço a fazer? O alvitre é, portanto, providencial. Traremos à reunião alguns infelizes, desviados da reta conduta. Observando-lhes os padecimentos, é provável que sintam a lição, com segurança, tornando aos rumos legítimos…

7 Com efeito, na noite imediata, duas entidades perturbadas foram trazidas à sessão.

Mais de trinta frequentadores passaram a ouvir a palestra dolorosa.

O doutrinador Silvério Matoso fazia paciente esforço para acalmar os desventurados que choravam ruidosamente, através das organizações mediúnicas.

8 — Desgraçado de mim! — Comentava um deles, — sou um réprobo, amaldiçoado de todos! Onde o meu equilíbrio? Perdi tudo… Não tenho recursos para a locomoção, quanto antigamente!… Vivo no seio de tempestade sem bonança…

9 Enquanto as lágrimas lhe corriam, copiosas, da face, clamava o outro:

— Que será de mim, relegado às trevas? Para onde se foram os miseráveis que me ataram ao poste do martírio? Malditos sejam!.

10 Acostumado à doutrinação, Matoso dizia, fraternalmente:

— Meus amigos, abstende-vos da desesperação e da revolta! Confiemos no Divino Poder!

11 Inspirado diretamente por Elias, o benfeitor espiritual que se esforçava intensamente por gravar a lição da hora, prosseguia, enérgico:

— Viveis presentemente as realidades da alma. Notastes agora que o relaxamento interior no mundo ocasiona grandes males. Desditosos todos aqueles que conhecem o bem e o não praticam! Desventurados os rebeldes, os hipócritas e os indiferentes, porque a morte do corpo revela a verdade pura, e as almas transviadas não encontram senão abismos e trevas, lágrimas e tormentos. Jesus, porém, é a fonte inesgotável das bênçãos de paz renovadora. Tende calma e esperança!…

12 — Sou, todavia, um infame, — soluçava uma das entidades comunicantes, — repetidamente escutei palavras da fé santificante e do bem salvador, mas nunca cedi a ninguém. Quis viver as minhas fraquezas, alimentá-las e defendê-las com todas as forças. Nunca ponderei, intimamente, quanto às realidades eternas. Ao alcance de meu coração, fluíam ensinamentos e socorros de toda sorte. Fui muita vez convidado ao Evangelho do Cristo; entretanto, zombei de todas as oportunidades de renovação espiritual. Considerava meus melhores amigos, no capítulo da religião, tão egoístas e mentirosos quanto eu mesmo. Agora… Quantas lágrimas devo chorar, eu que desprezei a paz divina e preferi as vibrações infernais?

13 — E eu? — Exclamava o mais revoltado, — poderá haver trevas mais densas que as minhas? Haverá dor maior que esta a devastar-me? Sinto-me desequilibrado, sem direção… Um náufrago perdido no abismo é mais feliz que eu… Rodeiam-me quadros de horror… Experimento fogo e gelo ao mesmo tempo… Podereis, acaso, compreender-me, a mim que penetrei o vale fundo da desgraça?!…

14 Matoso, porém, orientado espiritualmente por Elias, interferiu, solícito:

— Olvidai, meus irmãos, as algemas da vida material e ligai-vos ao Senhor, pelo coração. É indispensável extirpar a raiz dos enganos adquiridos na Terra! A vida não se resume a impressões físicas, a fantasia corporal; é vibração da eternidade, da divina eternidade! Acalmai os sentimentos em desequilíbrio para recolherdes a dádiva dos conhecimentos superiores. Esquecei o mal, tornai ao caminho reto! Atravessais, agora, a zona escura das consequências do erro. É necessário renovar as próprias forças, a fim de reacenderdes a lâmpada da fé.

15 Nesse diapasão, Matoso, devagarinho, convenceu as pobres almas desiludidas e desesperadas. Exaltou a necessidade de disciplina, com a desistência do egoísmo e da vaidade, azorragando os maus costumes e os vícios vulgares.

16 Em terminando a longa palestra, ambos os comunicantes se revelavam diferentes. Despediram-se, revestidos de coragem, esperança e bom ânimo.

A assembleia de ouvintes encarnados mantinha-se sob forte impressão e, entre os invisíveis, Elias e Cláudio aguardavam, ansiosos, a colheita de ensinamentos.

17 Teriam os circunstantes compreendido que as lições se destinavam a eles mesmos? Que ainda se encontravam na carne, com sublimes oportunidades em mão? Guardariam as experiências ouvidas? Ponderariam sobre as lutas que aguardam os rixosos e imprevidentes, além do túmulo? Modificariam as diretrizes?

18 Ambos os orientadores, benevolentes e sábios, esperavam a manifestação dos amigos, por identificarem o aproveitamento havido, quando a Senhora Costa quebrou o silêncio, murmurando:

— Viram vocês quanta dureza e intransigência?

— É… é… — Comentou o velho Silva Torres, — pregam eles numerosas peças neste mundo para chorarem no outro..

19 — E nós, os médiuns, — acrescentou Dona Segismunda Fernandes, — devemos suportar semelhantes Espíritos como se fôssemos caixas de pancada.

— Esses infelizes não chegaram a ser identificados, — observou Alberto Lima, um dos companheiros mais entusiastas do núcleo, — e foi pena. Pareciam muito cultos e, sobremaneira, versados em matéria religiosa.

20 — Notei, porém, — aduziu outro confrade, — que se não fora a palavra convincente de Matoso teríamos sofrido desastre. Tenho a ideia de que tratamos com entidades não somente sofredoras, mas igualmente perversas.

21 E o próprio doutrinador da casa,, que recebera a inspiração brilhante de Elias, partilhando a conversação, afiançou, contente:

— Em suma, estou satisfeito. Guardo a convicção de que esses desventurados integram a falange perturbadora que me persegue o lar.

22 Elias e Cláudio, invisíveis ao raio de observação comum, entreolhavam-se com indizível desapontamento.

23 Os companheiros encarnados mantinham-se prontos para o comentário cintilante e vivo. Qualificavam os comunicantes, queixavam-se dos sacrifícios a que eram obrigados por semelhantes visitas, reclamavam-lhes a ficha individual, situavam-nos entre os verdugos da vida privada; todavia, não houve um só que entendesse a lição legítima da noite, nela reconhecendo uma advertência do Alto para reajustamento de roteiro, enquanto era tempo.

24 Ninguém percebeu que, doutrinando os Espíritos, o grupo estava sendo igualmente doutrinado.


Irmão X

(Humberto de Campos)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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