I
1 Adriano Gonçalves de Macedo,
Homem de cabedais e alma sem siso,
Penetrou no seu quarto com um sorriso
Às dez horas da noite, muito a medo.
2 Uma carta de amante — era um segredo —
Ia abri-la, e, assim, era preciso
Que a sua esposa, dama de juízo
Não na visse nem mesmo por brinquedo:
3 Dona Corália Augusta Colavida
Estaria nessa hora recolhida?
Levantou a cortina, devagar…
4 Mas, que tragédia após esse perigo…
Viu que a esposa beijava um seu amigo,
Sobre o divã da sala de jantar.
II
1 No belo palacete do Furtado,
Palestrava a galante Mariquita
Com um pelintra afetado, assaz catita,
Bacharel delambido e enamorado.
2 De sobre a grande cômoda bonita,
Toma o moço um livrinho encadernado,
Revirando-o nas mãos, interessado,
Mas a jovem retoma-o, muito aflita:
3 — «Esse livro, Antonico, é meu breviário!»
Diz inquieta. E ele, cínico e falsário,
Arrebata-o às frágeis mãos trementes:
4 Abriu-o. Mais o olhava e mais se ria…
Era um compêndio de pornografia,
Recamado de quadros indecentes.
III
1 Dom Castilho, notável latinista,
Realizara alentada conferência,
Sobre rígido assunto moralista,
Protegido dos membros da regência.
2 Foi um sucesso. E a esposa Ana Fulgência,
Nele via uma grande alma de artista,
Louvando-lhe a utilíssima existência
De homem probo e notável publicista.
3 Que primor de moral! E os companheiros
Escritores, poetas, conselheiros,
Foram levar-lhe um abraço camarada.
4 Numa corrida louca, esses senhores
Foram achá-lo em seus trajes menores,
No apartamento escuro da criada…
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