A Carta aos efésios constitui um escrito com características que a tornam um caso quase particular em todo o Novo Testamento. A sua temática mais geral e a ausência de elementos específicos que possibilitem uma identificação precisa dos destinatários tem suscitado, ao longo dos séculos, as mais diversas opiniões e teorias sobre os aspectos de autenticidade, tema e datação. Quatro elementos se destacam como raízes dessa problemática: 1) Os manuscritos mais antigos não trazem a indicação de “aos efésios” no texto; 2) Esse escrito guarda um grande conjunto de hapax legomenon, n 35 ao todo. Em relação às outras cartas de Paulo, existem 41 palavras usadas exclusivamente em Efésios; 3) O estilo peculiar salta aos olhos, como já observara Erasmo de Rotherdan, tanto quanto as suas semelhanças com Colossenses; 4) Diferentemente das demais cartas, não é possível identificar, de maneira indiscutível, um problema ou circunstância que lhe tenha dado origem.
Apenas como exemplificação da variedade de opiniões que essa carta suscitou, ao longo do tempo, Marcião considerava que ela se destinava à comunidade de Laodiceia e não de Éfeso; há quem defenda que a carta não tinha uma indicação do destinatário para que fosse copiada e endereçada a muitas comunidades, tratando-se, assim, de uma carta circular; embora, até o século XVIII, a autoria da carta tivesse pouco ou quase nenhum questionamento, a partir daí as opiniões que a consideravam uma carta pseudopaulina foram se articulando, de forma que, hoje em dia, a imensa maioria dos estudiosos não a considera como uma carta de Paulo. Essa diversidade de opiniões e propostas refletem as dificuldades e riscos com os quais os estudiosos têm se debatido ao longo do tempo ao abordar esse escrito.
Apesar de tudo isso, a Carta aos efésios é conhecida e reconhecida desde a Antiguidade. Ireneu, Clemente, Policarpo, Orígenes, Cipriano, dentre outros, a conhecem e a utilizam.
Estrutura e temas
Remetente: Paulo | Capítulos: 6 | Versículos: 155
Destinatários e saudações. | 1.1,2
Desde o início, Deus tem um plano para a redenção. | 1.3-14
Gratidão e desejo que os membros da comunidade continuem progredindo no Evangelho. | 1.15-23
A situação anterior dos membros da comunidade e a ação transformadora do Cristo. | 2.1-22
O trabalho de Paulo. | 3.1-13
Oração pelos membros da comunidade. | 3.14-21
Pedido de união, humildade e bondade na comunidade. | 4.1-7
Como as bênçãos são dispensadas pelo Cristo. | 4.8-11
Objetivo das bênçãos dispensadas. | 4.12,13
Pela verdade e amor, amadurecemos e não somos mais crianças. | 4.14-16
Exortação a uma vida nova. | 4.17-32
Exortação a agir como filhos de Deus. | 5.1-20
As esposas em relação aos esposos - a comunidade em relação a Cristo. | 5.21-24
Os esposos em relação às esposas Cristo em relação à comunidade. | 5.25-33
Deveres dos filhos. | 6.1-3
Deveres dos pais. | 6.4
Deveres dos servos. | 6.5-8
Deveres dos senhores. | 6.9
Fortalecimento no Senhor para enfrentar os dias maus. | 6.10-13
Como deve sempre estar o cristão. | 6.14-17
Exortação e pedido de orações. | 6.18-20
Tíquico é enviado como portador e para dar notícias de Paulo. | 6.21,22
Bênção final. | 6.23,24
A comunidade
Éfeso fica localizada no território da atual Turquia. À época de Paulo, era uma cidade próspera que contava com o famoso templo a Ártemis, considerado uma das sete maravilhas do mundo antigo. Possuía uma sinagoga (ver Atos, 18.19 e 19.8) em que tanto Paulo quanto Apolo pregaram. Lá residiram João Evangelista e Maria, mãe de Jesus.
Paulo passa por Éfeso em sua segunda viagem no retorno para Jerusalém e, por ocasião da terceira viagem, ali permanece, durante, aproximadamente, três anos, ensinando primeiramente na sinagoga local e depois da escola de Tirano.
Origem e data
Os problemas de autoria geram, consequentemente, problemas na datação da carta. Entre os que advogam que ela seja de Paulo, as datas variam de 62 a 67. Já para os que defendem que ela não é de autoria de Paulo, as datas variam de 80 a 100. Não há qualquer informação na carta que possibilite uma identificação de onde ela tenha sido escrita, por isso também há uma diversidade de opiniões que variam de Roma a Éfeso.
O portador da carta, como indicado em Efésios, 6.21 e 22, é Tíquico. Como ele também aparece em Atos, 20.4, como sendo da Ásia, e, em 2 Timóteo, 4.12, como tendo sido enviado para Éfeso por Paulo, acredita-se que estes sejam indícios que confirmam a destinação da carta como sendo a Éfeso.
Perspectiva espírita
Em relação aos aspectos de origem, datação e destinatário, Emmanuel traz nos comentários a Efésios, 4.1 uma indicação clara de que Paulo estava em Roma quando elaborou a carta, que ela foi endereçada de fato à comunidade de Éfeso e que ele a redigira depois de seu discurso diante de Nero, quando estava sendo acompanhado de perto pelos guardas do Império.
A Carta aos efésios contém, proporcionalmente, um conjunto muito maior de recomendações práticas para a comunidade do que os demais escritos de Paulo, o que demonstra a intenção de indicar, no cotidiano, as ações que caracterizam uma conduta cristã que se estende para muito além das paredes dos templos de oração, englobando todos os aspectos da vida cotidiana de uma pessoa.
A Doutrina Espírita nos esclarece que as diversas circunstâncias que nos rodeiam não são o resultado de conjunções fortuitas, mas o desejo da Divindade a nosso respeito e às necessidades que trazemos de crescimento e progresso. Saber aproveitá-las, aquilatando o seu devido valor, é passo decisivo no nosso amadurecimento espiritual, capacitando-nos a ser servidores do Cristo em toda parte, porque “Somente assim, abandonaremos a caverna da impulsividade primitiva, colocando-nos a caminho do mundo melhor.” n
[1] Palavras que são encontradas uma única vez em todo o Novo Testamento. (Nota do organizador)
[2] Emmanuel, comentário a Efésios, 4.1 intitulado “Obediência construtiva”. (Nota do organizador)
Saulo Cesar Ribeiro da Silva