O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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O Evangelho por Emmanuel — Volume V — 2ª Parte ©

Textos paralelos de Atos dos apóstolos e Paulo e Estêvão

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Fim da viagem para Roma

Os irmãos dali, ao ouvirem [coisas] a nosso respeito, vieram ao nosso encontro até ao Foro de Ápio e Três Tabernas. Paulo, ao vê-los, deu graças a Deus e tomou ânimo. — (Atos 28:15)


20 […] O pequeno grupo partiu acompanhado de mais de cinquenta cristãos de Pouzzoles, que seguiram o ex-rabino até Fórum de Ápio †  em cavalos resistentes, montando carinhosa guarda aos carros dos guardas e prisioneiros. Nessa localidade, distante de Roma quarenta e poucas milhas, aguardava o Apóstolo dos gentios a primeira representação dos discípulos do Evangelho na cidade imperial. Eram anciães comovidos, cercados por alguns companheiros generosos, que, por pouco, carregavam o ex-rabino nos braços. Júlio não sabia como disfarçar a surpresa que lhe ia nalma. Jamais viajara com um prisioneiro de tamanho prestígio. De Fórum de Ápio a caravana demandou o sítio denominado “As Três Tavernas”,  †  acrescida agora do grande veículo que levava os anciães romanos, e sempre rodeada de cavaleiros fortes e bem dispostos. Nessa região, singularmente nomeada, em vista do grande conforto de suas hospedarias, outros carros e novos amigos esperavam Paulo de Tarso com sublimes demonstrações de alegria. O Apóstolo, agora, contemplava as regiões do Lácio  †  empolgado por emoções suaves e doces. Tinha a impressão de haver aportado a um mundo diferente da sua Ásia  †  cheia de combates acerbos.


21 Com permissão de Júlio, a figura mais representativa dos anciães romanos tomara assento junto de Paulo, naquele jubiloso fim de viagem. O velho Apolodoro, depois de certificar-se da simpatia do chefe da coorte pela doutrina de Jesus, tornou-se mais vivo e minucioso no seu noticiário verbal, atendendo às perguntas afetuosas do Apóstolo dos gentios.

— Vindes a Roma em boa época — acentuava o velhinho em tom resignado —; temos a impressão de que nossos sofrimentos por Jesus vão ser multiplicados. Estamos em 61, mas há três anos que os discípulos do Evangelho começaram a morrer nas arenas do circo pelo nome augusto do Salvador.

— Sim — disse Paulo de Tarso solicitamente. — Eu ainda não havia sido preso em Jerusalém,  †  quando ouvi referências às perseguições indiretas, movidas aos adeptos do Cristianismo pelas autoridades romanas.

— Não são poucos — acrescentou o ancião — os que têm dado seu sangue nos espetáculos homicidas. Nossos companheiros têm caído às centenas, aos apupos do povo inconsciente, estraçalhados pelas feras ou nos postes do martírio…


22 O centurião, muito pálido, interrogou:

— Mas como pode ser isso? Há medidas legais que justifiquem esses feitos criminosos?

— E quem poderá falar em justiça no governo de Nero?  †  — replicou Apolodoro com um sorriso de santa resignação. — Ainda agora, perdi um filho amado nessas horrorosas carnificinas.

— Mas, como? — tornou o chefe da coorte admirado.

— Muito simplesmente — esclareceu o velhinho —: os cristãos são conduzidos aos circos  †  do martírio e da morte, como escravos faltosos e misérrimos. Como ainda não existe um fundamento legal que justifique semelhantes condenações, as vítimas são designadas como cativos que mereceram os suplícios extremos.


23 — Mas não existe um político, ao menos, que possa desmascarar o torpe sofisma?

— Quase todos os estadistas honestos e justos estão exilados, para não falar dos muitos induzidos ao suicídio pelos prepostos diretos do Imperador. Acreditamos que a perseguição declarada aos discípulos do Evangelho não tardará muito. A medida tem sido retardada somente pela intervenção de algumas senhoras convertidas a Jesus, que tudo têm feito pela defesa de nossos ideais. Não fora isso, talvez a situação se revelasse mais dolorosa.

— Precisamos negar a nós mesmos e tomar a cruz — exclamou Paulo de Tarso, compreendendo o rigor dos tempos.

— Tudo isso é muito estranho para nós outros — ponderou Júlio acertadamente —, pois não vemos razão para tamanha tirania. É um contrassenso a perseguição aos adeptos do Cristo, que trabalham pela formação de um mundo melhor, quando por aí medram tantas comunidades de malfeitores, a reclamarem repressão legal. Com que pretexto se promove esse movimento sorrateiro?


24 Apolodoro pareceu concentrar-se e replicou:

— Acusam-nos de inimigos do Estado, a solapar-lhe as bases políticas com ideias subversivas e destruidoras. A concepção de bondade, no Cristianismo, dá azo a que muitos interpretem mal os ensinamentos de Jesus. Os romanos abastados, os ilustres, não toleram a ideia de fraternidade humana. Para eles o inimigo é inimigo, o escravo é escravo, o miserável é miserável. Não lhes ocorre abandonar, por um momento sequer, o festim dos prazeres fáceis e criminosos, para cogitar da elevação do nível social. Raríssimos os que se preocupam com os problemas da plebe. Um patrício caridoso é apontado com ironias. Num tal ambiente, os desfavorecidos da sorte encontraram no Cristo Jesus um Salvador bem-amado, e os avarentos um adversário a eliminar, para que o povo não alimente esperanças. Examinada essa circunstância, podemos imaginar o progresso da doutrina cristã, entre os aflitos e pobres, tendo-se em vista que Roma sempre foi um enorme carro de triunfo mundano, que segue com os verdugos autoritários e tirânicos na boleia, cercado de multidões famintas, que vão apanhando as migalhas de sobejo. As primeiras pregações cristãs passaram despercebidas, mas, quando a massa popular demonstrou entender o elevado alcance da nova doutrina, começaram as lutas acerbas. De culto livre em suas manifestações, o Cristianismo passou a ser rigorosamente fiscalizado. Dizia-se que nossas células eram originárias de feitiçarias e sortilégios. Em seguida, como se verificaram pequenas rebeliões de escravos, nos palácios nobres da cidade, nossas reuniões de preces e benefícios espirituais foram proibidas. As agremiações foram dissolvidas à força. Em vista, porém, das garantias de que gozam as cooperativas funerárias, passamos a nos reunir alta noite no âmago das catacumbas. Ainda assim, descobertos pelos sequazes do Imperador, nossos núcleos de oração têm experimentado pesadas torturas.

— É horrível tudo isso! — exclamou o centurião compungido — e o que admira é haver funcionários dispostos a executar determinações tão injustas!…


25 Apolodoro sorriu e acentuou:

— A tirania contemporânea tudo justifica. Não levais, vós mesmo, um apóstolo prisioneiro? Entretanto, reconheço que sois dele um grande amigo.

A comparação do velho e arguto observador fez empalidecer ligeiramente o centurião.

— Sim, sim — murmurava ele, tentando explicar-se.

Paulo de Tarso, todavia, reconhecendo a posição e o embaraço do amigo, acudiu esclarecendo:

— Mas a verdade é que não fui encarcerado por malvadez ou inópia dos romanos, desconhecedores de Jesus-Cristo, mas por meus próprios irmãos de raça. Aliás, tanto em Jerusalém como em Cesareia, encontrei a mais sincera boa vontade dos prepostos do Império. Em tudo isso, amigos, preponderam as injunções do serviço do Mestre. Para o êxito indispensável dos seus esforços remissores, os discípulos não poderão caminhar no mundo sem as marcas da cruz.

Os interlocutores entreolharam-se satisfeitos. A explicação do Apóstolo vinha elucidar completamente o problema.


26 O grupo numeroso alcançou Alba Longa,  †  onde novo contingente de cavaleiros esperava o valoroso missionário. Daí até Roma,  †  a caravana moveu-se mais vagarosa, experimentando sublimadas sensações de alegria. Paulo de Tarso, muito sensibilizado, admirava a beleza singular das paisagens desdobradas ao longo da Via Ápia.  †  Mais alguns minutos e os viajores atingiam a Porta Capena,  †  onde centenas de mulheres e crianças aguardavam o Apóstolo. Era um quadro comovente!

O cortejo parou para que os amigos o abraçassem. Eminentemente emocionado, o centurião acompanhou a cena inesquecível, contemplando anciãs de cabelos nevados osculando as mãos de Paulo, com infinito carinho.


27 O Apóstolo, enlevado naquelas explosões de afeto, não sabia se havia de contemplar os panoramas prodigiosos da cidade das sete colinas, se paralisar o curso das emoções para prosternar-se em espírito, num preito justo de reconhecimento a Jesus.

Obedecendo às ponderações amigas de Apolodoro, o grupo dispersou-se. […]


Emmanuel



(Paulo e Estêvão, FEB Editora. Segunda parte. Capítulo 9, pp. 448 a 452. Indicadores 20 a 27)


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