Fala ao “Globo” um professor da Universidade de Belo Horizonte
PEDRO LEOPOLDO, † 23 (Especial para O GLOBO, por Clementino de Alencar) — Antes de prosseguirmos na focalização de fatos novos, queremos reservar aqui espaço para o registro de algumas impressões, colhidas logo após a sessão de ontem à noite.
De uma forma geral, a reunião e seus resultados agradaram a todos. Há mesmo os que, sem serem nem inimigos nem amigos do Espiritismo, mas simples curiosos ou estudiosos de fenômenos como o em apreço, confessam a desconfiança que os trouxera à reunião e também o desejo de não admitir ou negar apenas de oitiva. Queriam “ver”. Viram. E não percebemos de quem quer que fosse uma palavra de restrição à sinceridade e honestidade do médium. Pelo contrário, mostravam-se todos otimamente impressionados com a maneira simples, espontânea e precisa como se desenvolveram os trabalhos. Aliás, conforme temos observado mais de uma vez, Chico Xavier não costuma adotar subterfúgios em face das questões e consultas que lhe são apresentadas. Vai direta e resolutamente ao encontro das perguntas.
Diante de tudo isso, sente-se o repórter no dever de anotar, já agora, aqui esta impressão: torna-se cada vez mais remota a ideia de fraude grosseira que tenha porventura surgido com as primeiras notícias relativas ao jovem médium de Pedro Leopoldo.
O observador tenaz
Um dos observadores mais pertinazes que teve Chico Xavier, durante a sessão, e um também dos mais esclarecidos, foi, sem dúvida, o Dr. Melo Teixeira. O distinto mestre de Psiquiatria da Universidade de Belo Horizonte sentara-se próximo ao médium e deste não tirava o olhar atento.
Quando se encerraram os trabalhos foi ele o primeiro a dirigir-se a Chico Xavier, indagando sobre as sensações que esse acaso guardasse do transe.
Chico refere-se ao torpor característico de que já nos havia falado e cita ainda a sensação vaga de um círculo de ferro que lhe envolvesse a cabeça. Às vezes, também, parece que as ideias lhe escorrem quentes pela mente.
Pergunta-lhe ainda o professor Melo Teixeira se ele tivera alguma sensação de tato ou de impulso estranho a lhe conduzir a mão sobre o papel.
Chico Xavier diz que não: apenas julga ter percebido, de sua mão, no transe, mas muito vagamente, uma tênue irradiação. Quanto à vidência, nenhuma.
“É um fenômeno lídimo”
Deixando, logo a seguir a sala da sessão, o professor Melo Teixeira dirigiu-se, em visita de amizade, à residência do Sr. Zoroastro Passos.
Ali fomos pouco depois procurá-lo e colher suas impressões.
— “Não se pode negar: estamos diante de um fenômeno lídimo, visto, presenciado — diz-nos o professor patrício. — Haverá, naturalmente, os que acusam esse rapaz de fabricar pastiches. É uma hipótese para observador distante e superficial, mas não para os que presenciem e se inteirem, como o fizemos hoje, do fenômeno.”
Discorrendo sobre a citada hipótese, o Dr. Melo Teixeira admite a possibilidade de se imitar um estilo.
Acha, porém, inadmissível, incrível que se possa imitar, simultaneamente, vários estilos e, mais do que isso, várias culturas como no caso de Chico Xavier.
“Não há possibilidade de elaboração individual”
“Assim — prossegue S.S.a. [Sua Senhoria] — sentimo-nos diante de uma força ultra normal. Dadas a variedade de estilos e cultura e as circunstâncias em que vimos o médium grafar os trabalhos, e considerada ainda a sua pouco instrução, sente-se que não há possibilidade de elaboração individual, no caso.”
Quanto menos se creia, mais sensacional é o caso
Em outra roda de assistentes colhemos também impressões e opiniões que resumiremos nisto:
— Evidenciado o fenômeno temos que: para os espíritas, que o veem sob um ponto de vista dogmático, tudo é muito natural, não surpreende. Mas para os não-espíritas, os que não admitem o dogma da comunicação com os mortos, então é que o caso tem de se apresentar surpreendente. Sendo o determinismo do fenômeno desconhecido para o descrente, quanto menos se creia mais sensacional o caso se torna…
Um esclarecimento sobre Perasso
Foi ainda ao fim dessa reunião que José Cândido nos pediu fizéssemos público um esclarecimento sobre Perasso, ao que prontamente aqui atendemos:
Em nossa reportagem de 24 do corrente na qual contamos um pouco da história de Chico Xavier, há uma passagem, a da doença da irmã do médium, em que aparece um senhor de nome Perasso, n chamado às pressas para, com exorcismos, curar a moça, visto que o tratamento médico não dera resultados imediatos. Dada a maneira como nos fora narrado o aparecimento de Perasso, no episódio, usamos, referindo-nos a ele, a expressão “o feiticeiro”.
Eis o esclarecimento que José Cândido nos pede: Perasso não era feiticeiro e sim um espírita fervoroso; e só se dispusera a tentar aquela cura por amizade à família Xavier. Tendo sido uma espécie de pioneiro do Espiritismo na zona de Pedro Leopoldo, vive presentemente em Belo Horizonte, dedicando-se exclusivamente à sua profissão de chofer.
(O Globo, 31/5/1935)
Clementino de Alencar