Depois de regressar dos Estados Unidos, em Julho de 1966, Chico Xavier foi ouvido pelo programa radiofônico “Ondas de Luz”, de Uberaba, sobre assuntos doutrinários, respondendo a um questionário afetivo que se transformou, a nosso ver, em documento de muito interesse, na avaliação dos seus quarenta anos medianímicos. Em virtude disso, reproduzimos aqui essa conversação esclarecedora, que foi publicada pelo mensário “O Triângulo Espírita”, de 1º de Outubro de 1966, para a devida complementação de nosso trabalho.
ENTREVISTANDO CHICO XAVIER
Como todos irmãos sabem, nossos confrades e médiuns Chico Xavier e Waldo Vieira retomaram dos Estados Unidos, onde estiveram pela segunda vez. “Ondas de Luz” não poderia ficar alheio a esse acontecimento. Daí a presente entrevista que ora fazemos com nosso Irmão Chico Xavier, a propósito da citada viagem ao exterior.
Jarbas Varanda — Caro Chico, o microfone é seu para os seus cumprimentos e considerações iniciais.
Chico Xavier — Inicialmente, pedimos permissão para saudar a todos os nossos companheiros e ouvintes de “Ondas de Luz”, a todos desejando paz e alegria.
1 — Tendo você e o nosso caro Waldo retornado recentemente dos Estados Unidos da América do Norte, que impressões poderia nos dar dessa segunda viagem?
— Do ponto de vista espírita, nossas impressões foram as melhores. Sabemos que a edificação dos princípios kardequianos entre os nossos irmãos norte-americanos é obra ainda começante, embora reconheçamos que a mente popular dos Estados Unidos permanece arejada e aberta ao estudo de todas as grandes questões da Humanidade. Tivemos a satisfação de acompanhar o lançamento do primeiro livro psicográfico de nossos benfeitores espirituais, traduzido para o Inglês, pela “Philosophical Library”, em Nova Iorque e verificar o desenvolvimento promissor do “Christian Spirit Center”, fundado naquele país sob a inspiração de Emmanuel e André Luiz, no ano passado, cujo núcleo mais importante agora está sediado no Estado da Carolina do Norte, em Elon College. Indiscutivelmente esses dois acontecimentos foram para nós dois fatos culminantes da nossa viagem deste ano, ao encontro de nossos amigos do norte, mas não será justo esquecer os contatos edificantes que tivemos ambos com os nossos irmãos espíritas do México, dos quais destaco os companheiros kardecistas da Central Espírita Mexicana, os professores João e Pedro Gasca e a nossa irmã professora Amparita Morgado; e ainda o conforto que recebemos com a honrosa reportagem que a revista “Cosmic Star”, de Hollywood, publicou em torno das nossas atividades na Comunhão Espírita Cristã, aqui em Uberaba. De minha parte, não posso deixar de me referir também à alegria com que acompanhei a fundação de dois cultos de Evangelho, em bases espíritas-cristãs, em Nova Iorque, por nosso caro amigo e distinto médico uberabense, Dr. Eurípedes Vieira, atualmente em especialização no “Memorial Hospital of Cancer and Allied Diseases”, daquela grande cidade.
2 — Quais foram as principais atividades doutrinárias desenvolvidas por vocês junto ao movimento espírita estadunidense?
— Detivemo-nos muito especialmente na obra de desenvolvimento e consolidação do “Christian Spirit Center” que se define como sendo uma das mais valiosas esperanças do Espiritismo Evangélico do Brasil nos Estados Unidos. Para esse fim, foram realizadas diversas reuniões e publicadas várias mensagens de nossos Amigos Espirituais, psicografadas diretamente em Inglês.
3 — Quais as perspectivas doutrinárias para o Espiritismo nos Estados Unidos? Há necessidade ainda de visitas fraternais de outros companheiros nossos? Além dos E.E.U.U., entende você que o Espiritismo necessita ser dinamizado nos países latino-americanos?
— A esse respeito, cremos que o artigo do nosso digno companheiro Haddad, sob o título “Por que Estados Unidos?”, publicado pela Federação Espírita Brasileira, em “Reformador” de agosto deste ano (1966), responde perfeitamente ao problema [Vide o artigo citado no final do capítulo]. A seara da Doutrina Espírita, qual é sentida, vista e praticada no Brasil, é um serviço de suma importância moral e está naturalmente aberta a quantos se proponham a colaborar na divulgação de nossos princípios, seja nos Estados Unidos, nos países irmãos da América Latina ou em outras nações do Mundo.
4 — Entende você que a difusão do livro espírita em Inglês, Francês ou Espanhol tem regime de urgência muito antes que o Esperanto?
— Guardo a certeza de que precisamos da divulgação do Espiritismo Evangélico do Brasil tanto em Esperanto, quanto em outras línguas da Humanidade. Certamente que, considerando o presente e o futuro; o Esperanto é o idioma ideal, mas em se tratando dos problemas aflitivos do presente, em toda parte, o socorro espírita-cristão do Brasil é tão importante como água no incêndio… Simbolizemos o Esperanto como sendo o serviço de assistência legal. Por ele, será possível apagar-se o fogo mental da angústia que domina coletividades inteiras, mas até que ele chegue à eficiência total, é justo que se espalhe o socorro através de outras línguas… Penso que a imagem define o nosso respeito e carinho pelo Esperanto, sem desconsiderar o trabalho da divulgação dos princípios espíritas-evangélicos em outros idiomas, nos múltiplos setores da Humanidade Terrestre.
5 — Nas duas viagens, quais os companheiros e atividades espíritas que mais o impressionaram?
— Dentre os médiuns distintos que conhecemos, posso destacar Gordon Burroughs e Brooks, que atuam no “Templo Espírita dos Dois Mundos” e no “Templo Espírita de Cristo”, respectivamente, em Washington; Mrs. Argos e Mrs. Trussler, em New York; Mr. Maurice Barbanell e esposa Mrs. Sílvia Barbanell, em Londres; madame Gisele Klecka, em Paris, Dona Maria Bacelar, em Lisboa, em nos referindo às nossas tarefas espíritas-cristãs fora do Brasil, em 1965. Em matéria de mediunidade, porém, guardo no coração, como sendo ponto mais alto para mim, em nossa visita aos Estados Unidos, este ano de 1966 o contato mais íntimo, em várias reuniões semanais com as notáveis faculdades de Mrs. Phyllis Haddad, abnegada médium do “Christian Spirit Center”, em Elon College, através de quem tive provas inequívocas da presença de minha mãe Maria João de Deus, que me falou através dela, sobre os meus problemas íntimos e tarefas espíritas no Brasil, sendo de salientar também as várias vezes em que o Espírito de Meimei, devotada amiga espiritual, se dirigiu a mim, por intermédio dela, com inesquecíveis mensagens de carinho e reconforto. Das atividades espíritas propriamente consideradas, várias foram as ocorrências marcantes que me trouxeram profunda alegria, nos países que visitamos em 1965, mas devo mencionar, por marcos indeléveis em minha vida mediúnica, acontecimentos inolvidáveis como sejam nossa primeira visita ao “Templo Espírita dos Dois Mundos”, em Washington, na tarde do penúltimo domingo de maio de 1965, quando um amigo espiritual, por médium que nos ficou inteiramente desconhecido, nos falou em Inglês da responsabilidade e significação da tarefa espírita-cristã que nos levava aos Estados Unidos, estimulando-nos a cumpri-la; a fundação do “Christian Spirit Center”, destinado a divulgar o Espiritismo Evangélico do Brasil, cuja primeira reunião se verificou igualmente em Washington; o contato com os devotados médiuns ingleses Mr. Maurice Barbanell e sua digna Esposa, que nos trataram com inesquecível generosidade em sua residência de Londres; os encontros com vários grupos de companheiros espíritas, no Père Lachaise, junto do túmulo de Allan Kardec, em Paris, nas várias visitas que efetuamos a esse monumento; as visitas que realizamos à “Casa dos Espíritos” e à “Sociedade de Estudos Psíquicos Gabriel Delanne”, igualmente em Paris; o entendimento com os nossos amigos espíritas de Portugal, comandante Isidoro Duarte Santos e sua Esposa Dona Maria Raquel e o casal Sr. Mário e D. Maria Bacelar, em Lisboa; em 1966, saliento por fatos inesquecíveis para mim, o lançamento do primeiro livro de nossos Benfeitores Espirituais do Brasil, em Inglês, “The World of the Spirit”, no dia 17 de maio deste ano em New York; e o encontro com a mediunidade consoladora de Mrs. Phyllis Haddad, em Elon College, no Estado da Carolina do Norte.
6 — Tendo nosso querido Waldo Vieira transferido sua residência para o Rio de Janeiro, “Ondas de Luz”, que sempre os viu juntos em suas entrevistas, perguntaria: como você viu essa mudança?
— Vi a mudança do nosso caro Waldo para o Rio com o pesar de todos os companheiros e amigos de Uberaba, principalmente os da “Comunhão Espírita Cristã” que sempre encontramos nele um apoio e um exemplo, inspirando-nos e sustentando-nos em serviço. Waldo não é tão somente o médico abnegado e o médium espírita que conhecemos e admiramos, mas igualmente o amigo e o condutor de quem não estimaríamos separar. Acontece, porém, que em se especializando no Japão, desejou ele ampliar horizontes e estudos no Rio e, de nossa parte, não podíamos transformar afeição e agradecimento em egoísmo e cativeiro. Conquanto sentindo imensamente a falta dele, vimo-lo partir reconfortados, todos nós, por vê-lo feliz, seguindo ao encontro de novas conquistas e experiências. Estamos, porém, convencidos de que ele continuará sendo o missionário da luz e do bem, tanto no Rio ou em outras cidades do Brasil ou do Mundo, como tem sido junto de nós em Uberaba, e desejamos reafirmar que ele prossegue, em qualquer parte, na condição de credor de nossa veneração, reconhecimento, apreço e carinho, para quem rogamos diariamente as bênçãos de Deus.
Francisco Cândido Xavier
Emmanuel
A propósito do assunto, [Questão 3] transcrevemos o texto do mencionado artigo de S. J. Haddad, nosso digno confrade residente em Elon College, Estado da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, para que nos compenetremos quanto à importância da divulgação do Espiritismo, como é praticado no Brasil, nos demais países do mundo:
“A História nos tem demonstrado que os grandes movimentos, que tinham por finalidade abrir novos horizontes do pensamento e do sentimento, ultrapassaram sempre as fronteiras dos países onde tiveram seu berço.
A isso não poderia escapar a Doutrina Espírita.
O caro leitor sem dúvida concordará conosco que a Doutrina dos Espíritos, no seu desdobramento evangélico, está indiscutivelmente enquadrada na categoria dos grandes movimentos da Terra. Em tempo algum da vida no Planeta existiu doutrina tão admiravelmente racional, simples e acessível e que, no dizer de distinto confrade, “tem uma resposta para todas as perguntas”.
As luzes e consolações que há um século vêm sendo derramadas sobre a bendita terra brasileira, aliadas às obras do bem, constituem fenômeno quiçá único na História da Humanidade.
Senão, vejamos se, em alguma época, houve na Terra um influxo, se houve, na História, algo que se pudesse comparar com a caridade e o amor fraterno e desinteressado que o Espiritismo cristão tem produzido e distribuído na Terra de Santa Cruz, em semelhantes condições; ou se houve, no passado, uma eclosão de fenômenos mediúnicos, dos mais variados e maravilhosos, com objetivos essencialmente espirituais, no país inteiro.
Tudo isso, caro Leitor, está indicando que, pela força mesma das coisas, esses acontecimentos no Brasil haveriam de repercutir para além das suas fronteiras. Podemos ir mais adiante, em supor que a Doutrina Espírita cristã, que teve como berço principal, na vivência do Evangelho, as terras brasílias, sob a respeitável liderança da Federação Espírita Brasileira, fora ali como que providencialmente abrigada e nutrida, para fins universais.
Assim também o foi a missão do Evangelho de Nosso Senhor Jesus-Cristo, cuja mensagem ultrapassou as acanhadas fronteiras da Palestina, indo às mais longínquas partes do mundo, nos tempos ainda de navegação à vela.
Não estranhemos, pois, se, pelos conselhos de seus Guias Espirituais, dois muito conhecidos e queridos médiuns brasileiros seguiram de bom ânimo os apelos do Alto, fazendo a caridade de estender mãos fraternas a irmãos de outros países, tão necessitados de nossa confortadora Doutrina quanto os irmãos de sua terra natal. E, muito compreensivelmente, a sementeira dos princípios espíritas-evangélicos do Brasil é, agora, iniciada nos Estados Unidos da América do Norte, aproveitando-se o veículo da língua inglesa, hoje a mais lida e falada no Planeta, de modo a difundir-se o Cristianismo redivivo na Doutrina Espírita, através do maior número de comunidades humanas, com a urgência desejada, embora aceitemos, em todas as nações, a excelência do Esperanto, destinado a ser a ponte de comunhão linguística de todos os povos do futuro.
Foi assim que Chico Xavier e Waldo Vieira nos vieram dar a mão aqui nos Estados Unidos da América, começando pelo lançamento do livro intitulado “The World of the Spirit”, seguido de traduções mediúnicas de mensagens, e de mensagens recebidas diretamente em Inglês.
As suas duas breves visitas tiveram repercussão de incalculável alcance, lançando as bases de uma obra que, embora ainda pequena, poderá com as bênçãos do Alto, atingir proporções respeitáveis.
Se as notícias das suas primeiras visitas causaram surpresas nos meios espíritas brasileiros, nós também, os domiciliados nesta terra generosa, as recebemos agradavelmente surpreendidos, agradecendo-lhes a cooperação fraternal, especialmente em relação ao nosso caro Chico Xavier, que sabemos pouco viajara, mesmo no seu próprio Estado de origem.
Em seguida, porém, foram-se clareando os panoramas, tanto para nós outros como para muitos dos nossos bondosos confrades no Brasil. Principiamos também a notar que, de parceria com as atividades de divulgação no Plano físico, houve também aproximações na Esfera invisível, conforme mensagens do Irmão X e outras comunicações recebidas, aqui, em Elon College no “Christian Spirit Center”.
As traduções psicográficas de mensagens se intensificaram, bem como a recepção de páginas em língua inglesa. Entretanto, os Guias Espirituais dos dois infatigáveis médiuns apontaram-lhes a necessidade de aprendizado da língua inglesa, a fim de que as recepções de mensagens neste idioma se tornem menos difíceis e mais rápidas. Daí também a necessidade de suas ausências do Brasil e do seu treinamento intensivo em estudos do inglês, o que vêm fazendo com admirável progresso, pontualidade e dedicação.
Não nos esqueçamos de que, nós outros, os cristãos de todas as correntes religiosas, nos achamos atualmente numa civilização fulgurante, sob o ponto de vista da inteligência, mas ameaçada, no cerne, pelo materialismo destruidor, a corromper-lhe as mais robustas energias do coração.
Auxiliemos, pois, e estimulemos tanto quanto nos seja possível, esses incansáveis obreiros na seara do Senhor, com as nossas preces e nosso apoio fraterno, para que eles possam vencer, com a sua parte, nesta nova e ingente tarefa da mensagem espírita cristã do Brasil ao mundo angustiado de hoje.
Ellon College, 6 de julho de 1966.”
Elias Barbosa
[11] “Reformador” de agosto de 1966.