1 Surgiu certo momento em que compus
Um cântico de amor, de vida e luz
Para louvor do rei que em sonhos eu revia.
E foi tal minha alegria
A erguer-me o coração, precípite e suspenso,
Perante o soberano a quem pertenço
Que lembrei um poema
De beleza imortal
Que me brilhava na lembrança:
2 O rei me resguardava
Como se eu fosse uma criança
E, através de seu hálito divino,
Punha em meu coração humilde e pequenino
Um mundo tão formoso e tão perfeito
Que tive a ideia da felicidade
Ser a força do rei, palpitando em meu peito.
3 Tendo lido o poema
Ao soberano amado,
Dono de minha vida,
Senti o coração triste e partido…
4 Teria, acaso, cometido
Uma falta ante o rei?
Seria desrespeito
Falar-lhe de um poema,
Em que havia sentido a grandeza suprema
De sua majestade,
Doando-me o endereço,
Ponto, número e rumo da felicidade?
5 Tanta veneração guardo comigo
Pelo meu soberano, terno e amigo,
Que sofri ao pensar tê-lo afastado
E orei rogando proteção…
6 Foi quando doce voz disse ao meu lado,
Uma voz de mentor, sábio e profundo:
— Sendo para o teu rei, só para ele,
Escreve os teus poemas…
Inês de Castro
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