Isabel, a Rainha Santa, ( † ) é personagem essencial neste livro. Vemo-la e a sentimos em todo o desdobramento dos fatos históricos e de suas consequências.
Recolhe Inês de Castro ( † ) na Vida Maior, após a tragédia de 7 de janeiro de 1355, amparando-a no Plano Espiritual, do mesmo modo que socorre o neto no Plano físico.
Inspira o filho D. Afonso IV ( † ) e sua esposa, D. Beatriz de Castela, ( † ) a compreenderem a necessidade do entendimento com D. Pedro, ( † ) o que leva ao acordo sedimentado nas Pazes de Canaveses. ( † )
Diz a história, bem como o próprio espírito de Inês de Castro, em uma de suas mensagens, que a Rainha Santa adotou Afonso Sanches ( † ) (filho de D. Dinis ( † ) e de D. Aldonça Rodrigues Telha) qual filho do coração, rogando-lhe que perdoasse ao irmão, Afonso IV, que o hostilizava, enciumado da especial afeição que lhe devotava o rei.
Por causa desse irmão, D. Afonso IV envolveu-se em disputas com o progenitor, o que provocou cinco anos de guerra civil.
A rainha sempre tratou bem os filhos do marido, assim como as respectivas mães. Conhecedor do caráter da esposa, antes de falecer, D. Dinis a nomeou testamenteira de seus filhos ilegítimos.
Foi companheira de D. Dinis durante o longo reinado de quase meio século e sobreviveu a ele por onze anos.
Um dos mais conhecidos episódios ocorridos com a Rainha Santa no reinado de D. Dinis é o reproduzido no quadro cujas cópias se popularizaram em Portugal e no Brasil:
A célebre pintura eterniza a transformação dos pães — que distribuía às gentes humildes — em rosas, quando, certa feita, D. Dinis, voltando a palácio, a surpreende em contato com a população sofrida.
Guardo uma edição desse quadro em minha sala de trabalho, com imenso carinho, presente de Chico Xavier, que sempre frisou seu respeito e admiração por Isabel de Aragão.
Colhi, a propósito, a uma culta senhora portuguesa, residente no Brasil, muito afeita às tradições de sua terra, o relato tal qual ela o ouvira em sua distante infância, nos arredores de Coimbra.
Conta-se em Portugal que a rainha Isabel ajudava os pobres nos fundos do palácio e trazia os pães amontoados no avental, quando chegou o rei, retornando de uma caçada, acompanhado de seus cavaleiros.
D. Dinis, afeito aos gestos caridosos da esposa, indaga-lhe:
— O que trazes aí, Senhora?
— São rosas, Senhor!
— Rosas em janeiro? Isso é um milagre. Deixa-me ver.
Isabel abre o avental, e rosas se espalham pelo chão…
E o povo todo se ajoelhou diante da nobre senhora.
Isabel reconstruiu, nos idos de 1317, com muita dificuldade, o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, ( † ) em Coimbra, e, a respeito, Mário Domingues nos fala de outro milagre, cultivado pelo imaginário popular:
A sua dedicação cria lendas, como a que se conta de certa vez que, não tendo dinheiro com que pagar a féria aos cantoneiros, lhes pediu que se contentassem em aceitar cada um, como sinal de boa vontade em pagar, uma simples flor. E quando eles voltaram aos seus lares, viram que a flor se transformara num dobrão de ouro.
Dignificou sua condição de rainha, seguindo os ditames do coração e da fé. Enquanto D. Dinis administrava sabiamente o reino, Isabel se dedicava aos pobres, ao socorro de mães e crianças, semeando na alma do povo o amor que, desde aqueles tempos, enaltece a gente portuguesa.
Eduardo de Matos, em O Anjo de Portugal, chama-lhe Anjo da Caridade, descrevendo situações que enfatizam sua condição de Missionária de Jesus na Terra.
Entre outros relatos, lembra que, aos pobres que a visitavam com frequência no palácio real, recebia-os a todos e dava ordens aos seus mordomos para que nunca deixassem sem assistência pessoa alguma que a procurasse.
Visitava os enfermos em seus lares e nos hospitais, pensava-lhes as feridas e fazia, pessoalmente, os curativos e serviços mais humildes.
A referência à cura que coloco a seguir com pequena simplificação de texto é de José Joaquim Nunes e foi-nos gentilmente relatada por Maria José Cunha, de Portugal, docente de História e estudiosa de Isabel de Aragão:
No dia da Ceia do Senhor, todos os anos, a Rainha lavava os pés a certas mulheres. Numa das vezes, quando ainda D. Dinis era vivo, atendeu uma das mulheres que tinha um pé com gangrena e os dedos quase se desprendendo, mas a mulher queria apenas colocar na bacia o outro pé saudável, ao que a Rainha disse:
— Amiga, ponde o outro pé na bacia.
E a pobre respondeu:
— Senhora, não é para lavar.
A Rainha ordenou que fosse colocado o pé doente da mulher na bacia. Quando o fez, as presentes assustaram-se com o aspecto do mesmo e recuaram, mas a Rainha lavou-o, sem hesitar, limpou com a toalha e o beijou. A mulher, sentindo-se sã e curada do pé, retirou-se, comentando que desde o beijo da rainha deixara de sentir dor.
Fundou em Coimbra o Hospital Santa Isabel de Hungria, ( † ) sua tia avó, em que pessoalmente assistia os enfermos.
Respeitada também como Anjo da Paz, Isabel não apenas promoveu a harmonia entre o marido, D. Dinis, e o filho e sucessor Afonso IV, como buscou de todas as formas o entendimento entre Afonso IV e seu irmão bastardo, Afonso Sanches, e procurou selar alianças de paz entre os reinos da Península Ibérica (Portugal, Castela e Aragão), governados por familiares seus.
Procurou incutir no coração do neto, D. Pedro, o amor à paz, à justiça e aos deserdados da fortuna.
Nasceu Isabel em Saragoça, ( † ) reino de Aragão, ( † ) em 1271 e faleceu em Portugal, ( † ) já durante o reinado do filho, em 1336, na cidade de Estremoz, ( † ) a mesma em que morreria mais tarde o neto D. Pedro.
Filha do rei Pedro III de Aragão ( † ) e de Constança, ( † ) rainha da Sicília, dois de seus cinco irmãos foram reis aragoneses e um, soberano da Sicília.
Casou-se com D. Dinis ( † ) em 1282 e, com o falecimento do marido, aproximou-se ainda mais do convento de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra, que, graças a Isabel, pôde ser erigido para albergar a Ordem das Clarissas, ( † ) por ela introduzida em Portugal.
Beatificada em 1516, foi declarada santa em 1625.
De seus milagres, de suas curas e de sua santificação falam com exuberância os conceituados hagiológios.
Ao longo dos séculos que sucedem aos episódios narrados neste livro, do Plano Espiritual, a par de suas elevadas funções, acompanha a trajetória do filho, do neto e de Inês de Castro, que se tornou sua dedicada companheira na implantação da mensagem de Nosso Senhor Jesus Cristo na Terra.
Caio Ramacciotti