1 — Se alguém de outra vida pudesse materializar-se aos meus olhos, — dizia Germano Parreira, em plena sessão no próprio lar, — decerto que a minha fé seria maior… Um ser de outro planeta que me obrigasse a pensar… Tanta gente se reporta a visões dessa natureza! Entretanto, semelhantes aparições não passam do cérebro doentio que as imagina. Quero algo de evidente e palpável. Creio estarmos no tempo da elucidação positiva…
2 Ouvindo-o, o Irmão Bernardo, mentor espiritual da reunião, que senhoreava as energias mediúnicas, aventou, sorridente:
— Você deseja, então, espetacular manifestação de Cima… Alguém que caia das nuvens à feição de um paraquedista do Espaço, em trajes fantasmagóricos, usando idioma incompreensível… um itinerante de outras constelações, cuja inopinada presença talvez ocasionasse enorme porção de mal, ao invés do bem que deveria trazer…
3 — Não, não é tanta a exigência, — aduziu Parreira, desapontado. — Bastaria um ser materializado na forma humana, sem a descida visível do firmamento. Não será preciso que essa ou aquela entidade se converta em bólide para acentuar-me a convicção. Poderia surgir em nossa intimidade doméstica, sem qualquer passe de mágica, revelando-se no lar fechado em que antes não existia, a mostrar-se igual a nós outros, sendo, contudo, estranho ao nosso conhecimento…
4 — No entanto, sabe você que toda concessão envolve deveres justos. Um Espírito, para materializar-se na Terra, solicita meios e condições. Imaginemos que a iniciativa transformasse o hóspede suspirado numa criatura doente e débil, requisitando cuidado, até que pudesse exprimir-se com segurança. Incumbir-se-ia você de auxiliar o estrangeiro, acalentando-o com tolerância e bondade, até que venha a revelar-se de todo? Estaria disposto a sofrer-lhe as reclamações e as necessidades, até que se externe, robusto e forte?
5 — Oh! isso mesmo. Perfeitamente…. — Gritou Parreira, maravilhado. — Contemplar um Espírito assim, de modo insofismável, sem que eu lhe explique a existência no mecanismo oculto, consolidaria, sem dúvida, a riqueza de minha fé na imortalidade. Isso é tudo quanto peço, tudo, tudo…
6 Bernardo sorriu, filosoficamente, e acrescentou:
— Mas, Parreira, isso é acontecimento de todo dia e tal manifestação é recente sob o teto que nos acolhe. Ainda agora, na quinzena passada, você recebeu semelhante bênção, asilando no próprio lar um viajante de outras Esferas, com a obrigação de ajudá-lo até que se enuncie sem vacilação de qualquer espécie… Esse gênio bondoso e amigo corporificou-se quase em seus braços. Bateu-lhe à porta, que você abriu generosamente. Entrou. Descansou. Permaneceu. E, ainda agora, ligado a você, espera por seu carinho e devotamento, a fim de atender plenamente à própria tarefa…
7 — Como assim? Como assim? — Irrompeu Germano, incrédulo. — Nada vi, nada sei, não pode ser…
Mas o Benfeitor Espiritual, controlando o médium, ergueu-se a passo firme e, demandando aposento próximo, de lá regressou, trazendo leve fardo.
8 Ante a surpresa dos circunstantes, Bernardo depositou-o com respeitosa ternura no regaço do amigo que ainda argumentava.
Parreira desenovelou curiosamente o pequenino volume e, entre aflito e espantado, encontrou, em plácido sono de recém-nato, o corpo miúdo e quente do próprio filho…
Irmão X
(Humberto de Campos)
Essa mensagem foi publicada originalmente em 1964 pela FEB e é a 25ª lição do
livro “Contos desta e doutra vida.”