1 A história não é nossa. É um fragmento do folclore dos primeiros amigos de Jesus, a fim de que observemos as dificuldades do Cristianismo nascente.
2 O Mestre, seguido por Simão Pedro, fora visitar alguns doentes nos arredores de Bethânia.
3 Os enfermos se multiplicavam pedindo-lhe socorro e a noite desceu sobre a região, coberta de nuvens densas. E era preciso voltar a Cafarnaum, onde Pedro mantinha a própria moradia.
4 Fosse pela jornada a pé ou pelas tarefas executadas, a verdade é que Jesus demonstrava grande cansaço. Pedro notou-lhe a fadiga e sustentou a marcha vagarosa, conquanto temendo as nuvens que se adensavam, prenunciando aguaceiro próximo.
5 Ao longe, no escuro da noite, os viajantes lobrigaram um ponto de luz.
Seria uma estalagem? Não lhes seria lícito tentar o refúgio por ali?
6 Para lá se dirigiram a passo lento.
Pedro, desenvolto bateu à porta e um homem rude atendeu.
7 Não, aquilo não era estalagem e sim uma casa isolada, mantida por jogadores de Sephoris, ( † ) para distrações casuais.
8 Simão Pedro implorou abrigo para ele e o companheiro.
9 O áspero anfitrião voltou ao interior para consulta e retornou com a resposta.
10 Os chefes da casa somente dispunham de um leito largo, formado de almofadões. Se os viajores aceitassem… poderiam descansar ali por uma noite.
11 Em vista da chuva iminente poderiam aceitar o oferecimento. Era somente para aquela noite difícil.
12 Jesus e Simão entraram, naturalmente acanhados.
Os jogadores tentavam a sorte, numa espécie de dados da atualidade, com grande alarido.
13 Os dois recém-chegados, porém, recolheram-se ao quarto onde se achavam os almofadões, com evidente humildade e dormiram quase que de imediato.
14 Depois de algumas horas, um dos homens de Sephoris exclamou com ênfase:
— Será que pusemos dois vagabundos dentro de casa?
— Serão ladrões? — Perguntou um dos circunstantes.
15 Um mais afoito se adiantou:
— Apliquemos uma surra em um deles, como advertência.
— Um deles, qual? — Inquiriu um jovem presente.
16 Alegou um outro:
— Arrastem para cá aquele que estiver à beira dos almofadões.
17 Esse era Simão que foi acordado com desrespeito e trazido à sala, em que dois dos anfitriões lhe aplicaram golpes de azorrague.
18 Simão tudo aceitou em silêncio e, após a inesperada agressão, regressou ao leito, onde choramingou, narrando a Jesus o sucedido.
— Conserva a paciência, Simão pediu-lhe Jesus — a paciência é uma luz perante o Pai Celestial.
19 E, com muito cuidado, alojou Pedro no canto dos almofadões, onde o Mestre acreditava fosse o lugar mais acolhedor.
Pedro acomodou-se. Jesus veio para a beira da cama.
20 Decorridos alguns minutos, um dos jogadores reclamou:
— Com respeito a estes hóspedes, nossa medida não foi justa. Tragam o vagabundo que está no canto do leito para que se lhe apliquem algumas bastonadas. Não é razoável que a advertência seja dirigida a um só.
21 Simão foi arrancado, de novo, do recanto em que jazia e, embora gemendo, tomou várias bastonadas que lhe machucaram as pernas.
22 Voltou à cama, a lamuriar-se e Jesus lhe repetia:
— Simão, tenha paciência. A paciência é registrada nos Céus…
Pedro lamentando-se em voz baixa, nada respondeu.
23 Ao amanhecer pagaram pequena taxa a um moço de serviço e colocaram-se a caminho de Cafarnaum.
24 Jesus, procurando quebrar o silêncio, disse a Pedro que manquitolava penosamente:
— Simão, pense em nossos compromissos. Você foi agredido, apanhou e sofreu, mas é justamente assim que o Pai, que está nos Céus, manda tratar os meus seguidores… ( † )
25 Simão lançou em Jesus um olhar estranho e falou com evidente desagrado:
— É por isso, Mestre, que vós os tendes tão poucos.
Augusto Cezar