1 O caminhão estacara à frente de grande supermercado da rua 48, em Nova Iorque, em que Doug Sanford trabalhava.
2 Solteirão, aos cinquenta de idade, Sanford era conhecido pela condição de espírita distinto e laborioso. Por isso mesmo, notando que ele acompanhava, algo preocupado, a preciosa mobília austríaca que a máquina transportava, aproximou-se dele Bobby Best, colega de serviço e companheiro de fé, a observar-lhe, curioso:
— Você tem razão de resguardar cuidadosamente estas peças…
3 E acariciando espelhos, lustres, almofadas e cortinas, acrescentava:
— Que beleza de mobília! Ah! se eu pudesse, adquiriria uma igual… Que bom gosto!…
Porque Doug nada dissesse, retornou Bobby ao assunto:
— Olhe os altos relevos! Admiráveis filigranas!… Como eu seria feliz se possuísse um tesouro assim!… Você, naturalmente, me dá, razão…
Doug apenas afirmava: — “é… é…”
4 À vista disso, Bobby indagou, direto:
— Para onde vão estas raridades?
E o amigo:
— Vão para um lar de velhos menos felizes…
— Meu Deus! — Gritou Bobby, espantado, — quem fez semelhante doação? De onde vem tanta riqueza?
— Esta mobília, — falou Doug, — foi comprada por meus avós, pertenceu à minha mãe, recentemente desencarnada, e está largando enfim a nossa casa…
— Porque você diz assim?
5 E o amigo explicou:
— Tenho duas irmãs casadas que se puseram a disputá-la com tamanha ambição, que os maridos, revólver em punho, se atiraram um contra o outro, na semana passada, a ponto de se ferirem e de sermos todos detidos pela polícia… Com sacrifício, adquiri todo este material para oferecê-lo aos velhinhos necessitados… Sem dúvida, que é uma relíquia do bom gosto de nossos avós…
6 E, ante as manobras do carro que se afastava, terminou:
— Mas toda relíquia material, quando capaz de conturbar a família ou arrasar a nossa paz de espírito, deve sair de nosso ambiente com a misericórdia de Deus.
Hilário Silva
(Nova Iorque, NI., EUA., 1, julho, 1965.)