1 Meu pai do coração,
Minha mãezinha querida,
Retornei dos vossos braços
Para a bênção de outra vida.
2 Agradeço o vosso amor
No berço que o Céu me fez,
Convosco encontrei meu sonho
De ser criança outra vez.
3 Renasci de vossas preces
Na paz que hoje me alcança,
Bendita a meditação
Que me refez a esperança.
4 Tenho saudades de tudo
Que compõe o nosso lar,
Saudade de vosso afeto,
Saudade de vosso olhar…
5 Sinto ainda o vosso colo
Forrado de amor sem fim,
O calor de nossa casa,
Os irmãos junto de mim…
6 Recordo: Margaridinha
Relê trabalhos da escola,
A palavra do Flavinho
Faz-se ouvir e me consola.
7 Luisinho me traz flores,
Depois, com muito carinho,
Escuto, maravilhado,
As leituras do Celsinho!…
8 Mamãe perfuma o meu leito,
Depois a envolver-me em luz,
Acaricia-me o rosto,
Falando-me de Jesus!…
9 Depois, papai, rememoro
Antigas conversas nossas,
Vossas mãos tocando as minhas
E as minhas falando às vossas!…
10 De nossos entendimentos
Nenhum se passou em vão,
Tudo aquilo que dissestes
Carrego no coração!…
11 Outra fonte de ternura
De meu peito se extravasa:
Revejo vovó Maria,
O anjo de nossa casa…
12 Agradeço-vos, contente,
O apoio, a vida, o carinho,
As luzes que reacendestes
Clareando-me o caminho!…
13 A sombra passou… Agora,
Esquecer para servir,
É a senha de que disponho
Para buscar o porvir…
14 Que paz! Que felicidade!
Afeiçoar-me ao dever,
Abraçar a estrada nova
Em forma de alvorecer!
15 Seguir à frente rogando
Trabalho nobre e sereno,
Guardar-me grato a Jesus
Pelo dom de ser pequeno!…
16 Anseio, meus pais queridos,
Astros do meu coração,
Construir as próprias asas
Da grande libertação!…
17 Jesus vos guarde e abençoe,
Amados paizinhos meus,
Sois para sempre comigo
Dois anjos do amor de Deus!…
Carlinhos
(Uberaba, 21 de julho de 1973)
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De propósito, deixamos o poema de Carlinhos, impregnado de ternura, “Carta aos meus Pais”, para o último capítulo deste livro, a fim de que pudéssemos encerrá-lo, agora, com chave de ouro.
Sim, leitor amigo.
Pretendemos rematar Entre Duas Vidas com algo de surpreendente valor para os estudiosos da literatura mediúnica, especialmente a psicográfica.
Trata-se, com efeito, de expressiva carta-relatório do distinto escritor patrício Clovis Tavares, autor de obras notáveis que se revestem de suma importância doutrinária, documento esse em torno do poema recebido pelo médium amigo, Chico Xavier. Não apenas quanto ao poema atual, mas igualmente com referência a outros obtidos medianimicamente através do mesmo lápis de Chico Xavier, e de autoria do Espírito que antes de retornar à arena terrestre tomou o pseudônimo de Lill e aqui, veio a chamar-se Carlos Vítor Mussa Távares, Carlinhos.
Sem perda de tempo, voltemo-nos para o documentário, do qual separamos o poema que sai situado nas páginas anteriores, em capítulo especial:
Campos, 30 de julho de 1973
Meu caro Amigo e Irmão Dr. Elias.
Jesus seja conosco, em plenitude de paz!
De retorno ao lar, apresso-me a remeter-lhe a mensagem de nosso querido Carlinhos, recebida pelo nosso admirável e imensamente amado Chico. Agradeço-lhe, de todo o coração, e comigo todos os meus familiares, seu propósito de incluir a carinhosa carta espiritual de meu inesquecível filhinho em seu próximo livro.
Jesus o abençoe e permita que seu bom coração e seu labor cultural continuem a enriquecer, em Seu nome, as nossas almas, sempre necessitadas do pão espiritual que muitas vezes nos tem vindo por suas mãos.
Como conversamos na noite de 22 último, o Carlinhos (desencarnado na noite de 10 de fevereiro deste ano), antes de sua reencarnação em nosso lar, pelo lápis de nosso Chico, também produziu alguns poemetos, quais estes, até agora inéditos:
Mensagem
Paizinho meu, se a jornada
É a vida sacrificada,
Continuemos assim.
Apesar dos sofrimentos,
Sigamos de pés sangrentos,
Que Jesus brilha no fim.
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E usava o pseudônimo de Lill, de caráter recordativo, como explico no Trinta Anos com Chico Xavier. n
Também este:
Mãezinha
1 Ouve, mãezinha querida,
Teu regaço acolhedor,
É meu refúgio de amor,
Encanto dos dias meus.
2 Na estrada de minha vida,
És minha fada de luz,
Anjo bom que me conduz
Às bênçãos do amor de Deus.
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Do meu Trinta Anos com Chico Xavier, transcrevo uma página em que uma outra mensagem de Carlinhos, antes de seu retomo último à Terra, é reproduzida:
Retiro ainda do meu arquivo xavieriano — perdoe-me o leitor — uma página muito íntima, tão só para assinalar que, além do imenso conforto espiritual que ela me trouxe, foi recebida inesperadamente, em condições excepcionais. Sob o céu estrelado de Pedro Leopoldo, numa clara noite de março de 1944, meditávamos e orávamos, Chico e eu, tecendo confidências e recordações, na paz do “Santuário”, pequeno bosque, não longe da “Pedra-Pão”, à margem de sussurrante regato. Nesse momento, Chico sente a presença de carinhoso Amigo Espiritual, que lhe aparecia, uma vez mais, com o aspecto de uma criança. Embora identificado, esse devotado Benfeitor de minha vida, preferia usar o pseudônimo de Lill, de caráter recordativo. Desejando escrever-me e não havendo, no momento e no local, papel disponível, serviu-se o médium de duas folhas em que João de Deus e Auta de Souza, horas antes, em reunião íntima no “Luiz Gonzaga” já haviam grafado dois sonetos. E no verso das páginas, o querido Chico psicografou esta bela mensagem, à luz branda do luar e ao sopro acariciante da brisa da madrugada:
De um filhinho espiritual
1 Papai, quando chega a noite,
Diz mamãe, banhada em luz:
— Vamos, Lill, orar por “ele”
Em preces ao bom Jesus!
2 Ajoelhados na fé,
No caminho redentor,
Novamente, de mãos postas,
Oramos por “nosso amor”.
3 Diz mamãe: — Dai-lhe, Jesus,
De vosso divino pão!
Eu eu digo: — Do pão de luz
Da vossa consolação!
4 Mamãe roga: — Dai-lhe, Mestre,
O espírito de servir.
E eu peço: — Com forças novas
Para as glórias do porvir.
5 Mamãe pede: — Mestre Amado,
Ajudai-o a caminhar.
E eu digo: — Inspirai-lhe a vida
Nas bênçãos de nosso lar.
6 E assim, nós ambos pedimos
Na fé que nunca se esvai
A bênção do Bom Jesus
Às suas provas de pai.
7 Que Deus lhe conceda sempre
Coragem para a missão.
É o que deseja, papai,
O filho do coração. n
Lill
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Lill reencarnou-se, abrindo os olhos para uma nova romagem terrestre, no dia 3 de março de 1956, Carlos Vítor Mussa Tavares, seu nome. Na intimidade, Carlinhos.
Quase ao completar nove meses de idade, foi vítima de uma queda de um carrinho. Sobreveio febre e por longos meses foi submetido a cuidadoso tratamento, que não impediu uma superveniente hemiplegia. Embora consciente, não mais pôde falar: já pronunciava algumas poucas palavras (papá, mamã…). Reconhecia-nos a todos, entretanto, e nunca deixou de manifestar aguda sensibilidade ao carinho recebido no lar. Pouco antes de completar 17 anos, inesperadamente; uma parada cardíaca o conduz novamente à Vida Maior. Foi na noite de 10 de fevereiro deste ano.
Em sua mensagem, psicografada por Francisco Cândido Xavier, na reunião pública da noite de 21 de julho de 1973, ele se identifica plenamente, assinalando pequeninos episódios da vida doméstica, pequeninos fatos da intimidade do lar, absolutamente desconhecidos do médium. Sua mensagem é uma fotografia espiritual de nosso ambiente doméstico, onde ele era, qual continua sendo, o centro polarizador de nossa imensa ternura, de um imenso afeto e de constante cuidado e atenção. É esse quadro que ele retrata em sua bela mensagem, recordando a irmãzinha, Margarida, a espalhar livros e apostilas junto à sua caminha; o Flavinho, cuja voz, ao ouvi-la, lhe despertava a imensa alegria, que buscava a todo transe manifestar; as florinhas que Luisinho lhe trazia, florinhas silvestres depositadas em seu leito; as leituras e conversas do Celsinho, que lhe relatava as historietas de “Jesus no Lar” e “Alvorada Cristã”, de Neio Lúcio, que Chico Xavier psicografou… Hilda, realmente, perfumava sua caminha com essências suaves e conversava com ele sobre as belezas do Evangelho. E diariamente, trazendo-o ao colo para refeição ou lanche, também eu conversava com ele e ele me respondia apertando-me os dedos e sorrindo, como se quisesse transmitir-me as esperanças do Céu.
A mensagem é toda ela de uma autenticidade absoluta. Exatíssimas suas referências, inclusive à bondade de sua avó materna. É uma descrição da intimidade do lar onde ele viveu dezessete anos, legando-nos o exemplo de indefinível amor, de ternura e de humilde resignação. Deixou-nos inesquecível exemplo de estoicismo nas dores dos primeiros meses de tratamento. E durante sua curta peregrinação na Terra, o exemplo de paciência, de carinho e de imenso e intraduzível afeto.
Sua mensagem é retrato fiel de sua alma delicada e bondosa, imensamente rica de humildade e ternura.
Só no dia seguinte à recepção do comovente poema, pude dizer ao nosso querido Chico da absoluta exatidão de todas as referências e particularidades do texto mediúnico. É mais uma prova a acrescentar-se às centenas de outras, do imenso amor que os nossos afetos espirituais nos dedicam, além de significar irrefutável testemunho da imortalidade da alma e da mediunidade de nosso querido Chico.
Caríssimo Dr. Elias: pode usar em seu livro o que quiser do relato que lhe ofereço.
E receba, com os agradecimentos de meus familiares e nossas recomendações a todos os seus, o coração reconhecido de seu menor irmão e servidor em Jesus,
.Clovis Tavares
Elias Barbosa
[14] Clovis Tavares, Trinta Anos com Chico Xavier, Edição Calvário, São Paulo, 1967 (1ª edição).
[15] Idem, ibidem, pp. 121-123 — (Notas do Organizador).