1 Ao Homem Triste que se rebelara
Contra as imposições da disciplina
Deus permitiu que ele pudesse
Escutar, de surpresa,
As notas e lições da Natureza,
No âmbito de sala pequenina.
2 Contrariando as queixas que lhe ouvira,
Disse-lhe grande mesa:
— Eu fui, aos ares livres da floresta,
Um palácio vibrante em júbilos de festa,
Entre ninhos e pássaros cantores!
Que músicas de paz!… Que beleza de flores!…
Veio, porém, um dia,
Um homem de machado…
Decepou-me sem dó!…
E depois de entregar-me à serraria,
Onde amarguei desprezo, lama e pó,
Vendeu-me para outro companheiro…
Era um singelo carpinteiro
Que me malhou durante muitas horas,
Para que eu seja a mesa em que te escoras!…
3 O mármore do piso
Exclamou, de improviso:
— Adorava meu berço em formosa montanha!…
A minha independência era tamanha
Que não sei descrever!…
Descendente de lindas pedras raras,
Formamo-nos em séculos de luta…
Um homem, certa vez, descobriu-nos a gruta,
Separou-me dos meus,
À força me arrastou sobre os seus próprios passos,
Conduziu-me à oficina,
Fez-me em vários pedaços…
Depois disso, vim eu, de revés em revés,
Até fazer-me escravo e servir aos teus pés…
4 A lâmpada informou sem pretensão:
— A fim de combater a escuridão
E doar-me em vida e luz,
Sem o menor desvio,
É necessário que me ajuste ao fio
Que me guarda e conduz!…
5 Um belo jarro à frente,
Esclareceu, humildemente:
— Fui um bloco de argila,
Sossegado e feliz numa gleba tranquila!…
Quando fazia sol
Adorava mirar as borboletas
E sentir os perfumes
De próximo jardim…
E, à noite, admirava os vaga-lumes
Que acendiam lanternas para mim…
No entanto, certa feita,
Valente caçador de barro fino
Arrancou-me do lar e mudou-me o destino…
A calor desumano, em fúria desumana,
Que enlouquece e que arrasa,
Mumificou-me em fria porcelana
Para enfeitar-te a casa!…
6 Nisso, falou antiga porta:
— Nunca pude viver como quisera,
Devo permanecer em todo instante, à espera
De ordenações e impulsos que me dás…
A fim de resguardar-te os bens e garantir-te a paz,
Protegendo-te a vida,
Cabe-me obedecer e sempre obedecer
Para cumprir contigo o meu próprio dever!…
7 Houve silêncio e o Homem transformado
Fitou, lá fora, o chão recentemente arado,
Depois ergueu o olhar para os astros distantes
E exclamou para os Céus,
Em êxtase profundo:
— Sê bendito, Senhor,
Pela escola do Mundo!…
Tudo o que serve, apoia, aprimora e ilumina,
Tudo o que a evolução entesoura e contém,
Vejo agora na luz da disciplina!…
Ajuda-me a servir para o Infinito Bem!.…
Valoriza, Senhor, os dias meus
E por tudo o que a vida me oferece
Seja no dom da fé por bênção que me aquece,
Ou na fonte do amor que me renova e ensina,
Obrigado, meu Deus!…
Maria Dolores
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