1 Fim do milênio. Anoitece.
No fulvo céu do Oriente,
A sombra avança envolvente,
Surgem sinistros bulcões;
No alto, lampejam raios,
O ódio se descortina,
Lembrando cinza e ruína,
Tumultos… Gritos… Canhões…
2 Permanece o grande embate:
O direito e a força bruta.
É Sócrates e a cicuta,
Jesus ante Barrabás…
Desde a Suméria distante,
De Ur ao fulgor do Egito,
O mundo rola em conflito,
Ganha a guerra e perde a paz.
3 Agora, porém, na Terra
Sem a fé age a Ciência
Nas grimpas da inteligência
E apoia o estranho festim;
O cérebro — águia cativa,
Obedecendo ao mais forte
Exalta o poder da morte
E aperfeiçoa Caim.
4 No parque dos armamentos,
Bombas de vários matizes
Querem lauréis infelizes
Em máquinas de terror;
Rente ao fogo que dormita,
Escuta-se, a cada hora,
A humanidade que chora
Perante o abismo a transpor.
5 Por isso, Brasil, enquanto
Nas urzes do sofrimento
Sopra o ciclone violento,
Temor e desolação
Levanta o próprio futuro
No trio que te ilumina:
Justiça, escola e oficina
Burilando o coração.
6 Falando aos nossos amigos,
Ante a grandeza que estampas,
Vozes suplicam das campas
Na bênção do eterno Pai:
— Bravos filhos do Cruzeiro,
O tempo não nos espera.
Ante o sol da Nova Era,
Uni-vos e trabalhai!
7 Recordemos a epopeia
Dos antigos bandeirantes,
Conquistadores gigantes,
Plantando o país no chão,
E os nobres inconfidentes
Atormentados, em bando,
Mortos-vivos, mas buscando
A paz da libertação.
8 Ide e criai vida nova
Onde o atrito sobrenade,
Mantendo a fraternidade
Que o vosso gênio produz,
Dizendo a todos os povos,
Na luz que se vos descerra,
Que, em qualquer luta, na Terra
O vencedor é Jesus. n
Castro Alves
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