1 Eis-me a trazer-vos a história,
Estranha como se diz,
Do fato que sucedeu
A um amigo — o Téo Muniz.
2 Ele chegara aos quarenta…
Morava com garbo e graça
Com velha tia, contando
Noventa e lá vai fumaça.
3 Ela, viúva, fizera
Testamento em pergaminho,
Sem outros quaisquer parentes,
Deixara tudo ao sobrinho.
4 O moço, olhando o futuro,
Pela ambição desmedida,
Dava-lhe os nomes mais ternos:
— “Meu tesouro”, “mãe querida…”
5 Ele adulava a velhinha,
Ela adorava o rapaz,
Unidos, constantemente,
Viviam em doce paz.
6 Mas veio um dia difícil…
A tia surgiu doente,
O rapaz fez-se-lhe apoio
No carinho permanente.
7 Exames. Medicamentos.
Inquietações. Agonias.
Problemas multiplicados
Chegavam, todos os dias.
8 A velhinha, certa noite,
Em silêncio, estremeceu…
Notando-a imóvel, de todo,
Disse a enfermeira: “morreu…”
9 O sobrinho desolado
Debruçou-se sobre a tia;
Chorando, viu-a parada,
O coração não batia.
10 Veio o médico. No exame,
Faz testes, explica, exorta…
Num colapso profundo
A doente estava morta.
11 Entretanto, quis mais provas,
Um companheiro traria;
Então, daria o atestado
De óbito no outro dia…
12 A casa, de imediato,
Transformou-se num velório,
Testemunhos de pesar,
Condolências. Falatório.
13 Téo chorava na aparência,
Pois, ganhando o paparico
De quantos vinham a ele,
Sabia-se muito rico.
14 A herança era muito grande.
A tia deixava rendas,
Muitas lojas de aluguel,
Terras, galpões e fazendas.
15 Entretanto, ao dia claro,
A morta estava a mexer,
Aquele corpo cansado
Começara a reviver.
16 Veio médico. Auscultou-a,
Dizendo com alegria
Que ela somente sofrera,
Grave catalepsia.
17 Desiludido e assustado,
Téo caiu, em desconforto…
Dando entrada no hospital,
O coitado estava morto.
Jair Presente
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