O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Brasil, coração do mundo, pátria do Evangelho — Humberto de Campos


9

A Restauração de Portugal

1 No primeiro quartel do século XVII, a situação de Portugal era de profunda decadência. Sob o reinado de Filipe III, de Espanha,  †  príncipe apático e doente, que entregara a direção de todos os negócios ao duque de Lerma,  †  os esplendores das conquistas portuguesas haviam desaparecido.

Aquele povo minúsculo e heroico, cuja coragem havia acendido uma nova luz em todos os departamentos de trabalho do Ocidente, encontrava-se agora reduzido à quase penúria.

2 Foi por esse tempo que Henrique de Sagres,  †  o antigo Helil, mensageiro de Jesus, que havia levantado as energias portuguesas com a sua escola de navegação, procurou o Senhor, tocado de compaixão e de angústia, a implorar a bênção de sua misericórdia para a nação de que se tornara o gênio renovador.

— “Mestre, — diz ele compungidamente, — venho pedir o vosso auxílio paternal para a terra portuguesa, cujas experiências amargas tocam, agora, ao auge das penosas provações coletivas. Humilhada e vencida ela implora a vossa divina providência, através de minhas palavras, no sentido de lhe ser possível aproveitar as forças derradeiras para uma reorganização política e econômica, que a possa esquivar dessa situação angustiosa…”

3 — “Helil, — replicou-lhe Jesus, — sabes que a minha piedade não se reveste de excessivas exigências. Enviei-te a Portugal com o fim de reerguer as suas energias, compensando os seus grandes esforços de povo humilde e laborioso. Infelizmente, apesar de suas grandes qualidades de coração, os portugueses não souberam corresponder à nossa expectativa, provocando, eles próprios, a situação em que se encontram, pela fraqueza com que se entregaram à sinistra embriaguez da fortuna e da posse… 4 Depois de ajudares a Vasco da Gama  †  para que se abrisse o caminho marítimo das Índias, as forças lusas, após receberem os favores da cidade de Calicut,  †  regressam ali, depois de algum tempo, para bombardeá-la, inundando-a num mar de crueldade e sangue… No Brasil, onde lançamos os fundamentos da pátria do Evangelho, introduziram o tráfico de homens livres, necessitando as falanges de Ismael  †  dispensar todos os esforços possíveis para que as ordens divinas não se subvertam com as iniquidades humanas… Em Lisboa, permitiram a entrada do terrível instituto da inquisição, que comete, no mundo, todos os crimes em meu nome, que deveria ser para todas as criaturas um sinônimo de brandura e de amor…”

5 — “É verdade, Senhor, — exclama Helil amargurado, — quando o primeiro português aprisionou, nas Canárias,  †  alguns pobres africanos para vende-los como escravos aos brancos da Europa, ordenei fossem imediatamente repatriados, enchendo-se-me o coração de amargura após tantos entusiasmos no período dos descobrimentos, quando eu vos confiava, no Restelo,  †  as lágrimas do meu reconhecimento e da minha esperança… 6 Mas, a grande pátria que me confiastes, Senhor, muito tem aprendido no caminho das experiências dolorosas. Nas suas cidades prestigiosas escasseiam os espíritos de eleição, aptos à tarefa do governo; as nações ambiciosas assenhoreiam-se de todas as suas possibilidades econômicas, suas riquezas são pilhadas pela pirataria do século; seu povo acha-se esmagado pelos impostos; seus filhos abatidos e humilhados… Apiedai-vos, meu Jesus, de tanta miséria, que nos enche o coração de infinita amargura!… Permiti possamos restaurar as suas forças políticas, a fim de que ela possa cumprir as vossas determinações sábias e justas, na terra do Evangelho!…”

7 — “Essas experiências amargas, — explicou-lhe o Divino Mestre, — dotarão Portugal de novos sentimentos, acrisolando as suas concepções de brandura e de fraternidade, a fim de que possa corresponder ao nosso esforço na edificação da pátria dos meus ensinamentos. Quais os elementos encarnados, a serem por ti utilizados nessa restauração?”

8 — “Senhor, com o vosso apoio e com o vosso amparo, esperamos realizar essa reorganização buscando para o trono os descendentes de D. Afonso,  †  primeiro duque de Bragança, que atualmente detêm a maior fortuna portuguesa e em cuja casa vivem mais de oitenta mil vassalos. Quanto ao nosso plano, ele se constituirá de uma larga ação dos agrupamentos espirituais sob a minha direção, combinados com as falanges de Ismael, no sentido de intensificarmos o pensamento cristão em Portugal, projetando as mais nobres realizações no Brasil, disseminando-nos entre os colonizadores, a fim de que as concepções de fraternidade se intensifiquem, cimentando as bases da pátria das vossas lições divinas. Nossos apelos se estenderão aos companheiros reencarnados que se encontram nas cortes espanholas e nas selvas americanas, para levantarmos a bandeira de Ismael sobre todas as frontes, como sublime legado do vosso coração compassivo e misericordioso…”

9 — “Sim, Helil, — retrucou Jesus, com bondade, — teu plano será realizado com a minha bênção, efetuando-se essa ação espiritual conforme idealizas; temos, porém, de considerar que os elementos a serem utilizados são os mais representativos, mas não constituem os mais necessários. Não espero que a casa de Bragança esteja preparada, espiritualmente, para a sublime realização; todavia, somos obrigados, igualmente, a reconhecer as pesadas trevas que invadem atualmente todas as atividades políticas da Terra, e tu te esforçarás por ampará-la nos grandes deveres que assumirá, neste e nos próximos séculos. Terás o cuidado de inspirá-la, no propósito de se organizarem as precisas combinações com as outras nacionalidades do mundo, para que a pátria do Evangelho não sofra outros choques de raças, além daqueles até agora sofridos.  10 Bem sabes que, enquanto os homens não se integrarem no conhecimento pleno da minha doutrina de amor e de fraternidade, os tratados comerciais são os necessários jogos de interesses que equilibram as ambições, em proveito dos setores da verdadeira evolução espiritual. Auxiliarei os teus empreendimentos com a minha misericórdia, pedindo a Nosso Pai que se digne de guardar-nos sob a sua bondade infinita.”

11 Henrique de Sagres  †  organizou as suas falanges e, em 1640, Portugal era restaurado, subindo ao trono D. João IV,  †  chamado dos seus regalos e prazeres de Vila Viçosa, para os cuidados do trono.

A um período de lutas angustiosas, a restauração se consolida na batalha de Montijo  †  e a grande nação do Ocidente prossegue em seu labor abençoado por Jesus, na formação da pátria do Cruzeiro.

12 Sob a orientação do Mundo Invisível, Portugal estabelecia tratados comerciais como mais tarde se verificou o de Methween,  †  ruinoso para a indústria portuguesa, mas que vinha colocar o Brasil a salvo de lutas com o poderio da Inglaterra.

13 Toda uma ação espiritual se conjuga, harmoniosamente, nessa época, e as falanges de Ismael e de Helil buscam, no silêncio e na obscuridade, o grande coração de Antônio Vieira,  †  que representou um poderoso organismo medianímico para as revelações de suas verdades.

Vieira toma a sua posição ascendente na corte de D. João IV e, daí a algum tempo, contra a vontade do soberano, que desejava conservar a sua palavra de sabedoria e de amor junto do seu coração, o grande missionário embarca para o Brasil.

14 Sua voz, saturada de um suave magnetismo, ilumina todas as consciências, esclarecendo todos os corações. Nos seus instantes de sagrada eloquência, exclama ele: — “No Evangelho de Jesus, ofereceu o demônio todos os seus reinos pela posse de uma alma; mas, no Maranhão não é necessário ao demônio tanta bolsa para comprá-las todas. Basta acenar o diabo com um tijupar de pindoba n e dois tapuias,  †  para que seja adorado com ambos os joelhos.”

15 E não foram poucos os senhores, tocados dessas claridades divinas cuja origem profunda estava nas suaves lições de Ismael e seus abnegados mensageiros, que correram às suas propriedades, envergonhados do crime de manter como escravos os seus irmãos, devolvendo aos pobres cativos a liberdade, para sempre.


Humberto de Campos

(Irmão X)


[1] [Tijupar de pindoba. Tejupaba; o mesmo que tejupar, (do tupi teyu'pab): pequena choça ou palhoça, menor que a oca. Pindoba ou pindova, é uma palmeira típica das regiões Nordeste e Centro-Oeste do Brasil, sendo comum em Pernambuco, Paraíba e Alagoas.]


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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