1 Um grande senhor que soubera amontoar sabedoria, além da riqueza, auxiliava diversos amigos pobres, na manutenção do bom ânimo, na luta pela vida.
2 Sentindo-se mais velho, chamou o filho à cooperação. O rapaz deveria aprender com ele a distribuir gentilezas e bens.
3 Para começar, enviou-o à residência de um companheiro de muitos anos, ao qual destinava trezentos cruzeiros mensais.
O jovem seguiu-lhe as instruções.
4 Viajou seis quilômetros e encontrou a casa indicada. Contrariando-lhe a expectativa, porém, não encontrou um pardieiro em ruínas. O domicílio, apesar de modesto, mostrava encanto e conforto. Flores perfumavam o ambiente e alvo linho vestia os móveis com beleza e decência.
5 O beneficiário de seu pai cumprimentou-o, com alegria efusiva, e, depois de inteligente palestra, mandou trazer o café num serviço agradável e distinto. Apresentou-lhe familiares e amigos que se envolviam, felizes, num halo enorme de saúde e contentamento.
6 Reparando a tranquilidade e a fartura, ali reinantes, o portador regressou ao lar, sem entregar a dádiva.
— Para quê? — Confabulava consigo mesmo, — aquele homem não era um pedinte. Não parecia guardar problemas que merecessem compaixão e caridade. Certo, o genitor se enganara.
7 De volta, explicou ao velho pai, particularizadamente, quanto vira, restituindo-lhe a importância de que fora emissário.
8 O ancião, contudo, após ouvi-lo calmamente, retirou mais dinheiro da bolsa, dobrou a quantia e considerou:
— Fizeste bem, tornando até aqui. Ignorava que o nosso amigo estivesse sob mais amplos compromissos. Volta à residência dele e, ao invés de trezentos, entrega-lhe seiscentos cruzeiros, mensalmente, em meu nome, de ora em diante. A sua nova situação reclama recursos duplicados.
9 — Mas, meu pai, — acentuou o moço, — não se trata de pessoa em posição miserável. Ao que suponho, o lar dele possui tanto conforto, quanto o nosso.
— Folgo bastante com a notícia — exclamou o velho.
10 E, imprimindo terna censura à voz conselheiral, acrescentou:
— Meu filho, se não é lícito dar remédio aos sãos e esmolas aos que não precisam delas, semelhante regra não se aplica aos companheiros que Deus nos confiou. 11 Quem socorre o amigo, apenas nos dias de extremo infortúnio, pode exercer a piedade que humilha ao invés do amor que santifica. 12 Quem espera o dia do sofrimento para prestar o favor, muita vez não encontrará senão silêncio e morte, perdendo a melhor oportunidade de ser útil. 13 Não devemos exigir que o irmão de jornada se converta em mendigo, a fim de parecermos superiores a ele, em todas as circunstâncias. Tal atitude de nossa parte representaria crueldade e dureza. Estendamos-lhe nossas mãos e façamo-lo subir até nós, para que nosso concurso não seja orgulho vão. 14 Toda gente no mundo pode consolar a miséria e partilhar as aflições, mas raros aprendem a acentuar a alegria dos entes amados, multiplicando-a para eles, sem egoísmo e sem inveja no coração. O amigo verdadeiro, porém, sabe fazer isto. 15 Volta, pois, e atende ao meu conselho para que nossa afeição constitua sementeira de amor para a eternidade. Nunca desejei improvisar necessitados, em torno de nossa porta e, sim, criar companheiros para sempre.
16 Foi então que o rapaz, envolvido na sabedoria paterna, cumpriu quanto lhe fora determinado, compreendendo a sublime lição de amizade real.
Neio Lúcio