O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano X — Março de 1867.

(Idioma francês)

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS.


Lumen.

RELATO EXTRATERRENO.
(Por Camille Flammarion, Professor de Astronomia, adido ao Observatório de Paris.)  † 
(Sumário)

1. — Isto não é um livro, mas um artigo que poderia constituir um livro interessante e, sobretudo, instrutivo, porque os seus dados são fornecidos pela ciência positiva e tratados com a clareza e a elegância que o jovem sábio exibe em todos os seus escritos. O Sr. Camille Flammarion é conhecido de todos os nossos leitores por sua excelente obra sobre a pluralidade dos mundos habitados e por artigos científicos que publica no Siècle. Este de que vamos dar conta foi publicado na Revue du XIXe Siècle - Google Books, de 1º de fevereiro de 1867.  n

O autor imagina um diálogo entre um indivíduo vivo chamado Sitiens, e o Espírito de um de seus amigos, chamado Lúmen, que lhe descreve seus últimos pensamentos terrestres, as primeiras sensações da vida espiritual e as que acompanham o fenômeno da separação. Este quadro é de perfeita conformidade com o que os Espíritos nos ensinaram a respeito; é o mais genuíno Espiritismo, menos a palavra, que não é pronunciada. Poder-se-á julgá-lo pelas citações seguintes:


2. — “A primeira sensação de identidade que se experimenta depois da morte assemelha-se à que se sente ao despertar durante a vida, quando, recobrando pouco a pouco a consciência pela manhã, ainda se é atravessado pelas visões da noite. Solicitado pelo futuro e pelo passado, o Espírito busca ao mesmo tempo retomar plena posse de si mesmo e captar as impressões fugidias do sonho que acabara de ter, que ainda perduram com seu cortejo de quadros e acontecimentos. Por vezes, absorvido por esta retrospecção de um sonho cativante, ele sente nas pálpebras que se fecham a corrente da visão se restabelecendo, e o espetáculo continuando; cai ao mesmo tempo no sonho e numa espécie de semisono. Assim se equilibra a nossa faculdade pensante ao sair desta vida, entre uma realidade que ainda não compreende e um sonho que não desapareceu completamente.”


Observação. – Nesta situação do Espírito, nada há de surpreendente que alguns não se julguem mortos.


“A morte não existe. O fato que designais sob esse nome, a separação entre o corpo e a alma, a bem dizer não se efetua sob uma forma material comparável às separações químicas dos elementos dissociados, observada no mundo físico. Quase não se percebe esta separação definitiva, que nos parece tão cruel, mas que o recém-nascido não percebe ao nascer; fomos concebidos para a vida futura, como nascemos para a vida terrena. Apenas a alma, não mais estando envolvida nas vestes corporais, que a revestiam aqui, adquire mais prontamente a noção de seu estado e de sua personalidade. Contudo, essa faculdade de percepção varia essencialmente de uma alma a outra. Umas há que, durante a vida do corpo, nunca se elevaram para o céu e jamais se sentiram ansiosas por penetrar as leis da criação. Estas, ainda dominadas pelos apetites corporais, ficam muito tempo num estado de perturbação inconsciente. Felizmente há outras que, desde esta vida, alçam voo nestas aspirações aladas para os cimos da beleza eterna; estas veem chegar com calma e serenidade o instante da separação; sabem que o progresso é a lei da existência e que entrarão, no além, numa vida superior à de cá; seguem passo a passo a letargia que lhes sobe no coração, e quando a última batida, lenta e insensível, o detém em seu curso, já estão acima do corpo, cujo adormecimento observam e, libertando-se dos laços magnéticos, sentem-se rapidamente transportadas, por uma força desconhecida, para o ponto da criação onde suas aspirações, seus sentimentos, suas esperanças as atraem.


3. — “Os anos, os dias e as horas são constituídos pelos movimentos da Terra. Fora desses movimentos o tempo terreno não existe mais no espaço; é, pois, absolutamente impossível ter noção desse tempo.”


Observação. – Isto é rigorosamente certo. Assim, quando os Espíritos querem especificar uma duração inteligível para nós, são obrigados a se identificarem novamente com os hábitos terrestres, a se refazerem homens por assim dizer, a fim de se servirem dos mesmos pontos de comparação. Logo depois da Libertação, o Espírito Lúmen é transportado com a rapidez do pensamento para o grupo de mundos que compõem o sistema da estrela designada em astronomia sob o nome de Capela ou Cabra n A teoria que ele dá da visão da alma é notável.


“A visão de minha alma tinha um poder incomparavelmente superior à dos olhos do organismo terrestre, que eu acabava de deixar; e, observação surpreendente, seu poder me parecia submetido à vontade. Basta que vos faça pressentir que, em vez de ver simplesmente as estrelas no céu, como as vedes na Terra, eu distinguia claramente os mundos que gravitam em volta; quando eu desejava não mais ver a estrela, a fim de não ficar incomodado pelo exame desses mundos, ela desaparecia de minha visão e me deixava em excelentes condições para observar um desses mundos. Além disso, quando minha vista se concentrava num mundo particular, eu chegava a distinguir os detalhes de sua superfície, os continentes e os mares, as nuvens e os rios. Por uma intensidade particular de concentração na visão de minha alma, eu conseguia ver o objeto sobre o qual ela se concentrava, por exemplo, uma cidade, um campo, os edifícios, as ruas, as casas, as árvores, os atalhos; reconhecia mesmo os habitantes e seguia as pessoas nas ruas e nas habitações. Para isto bastava limitar o meu pensamento ao quarteirão, à casa ou ao indivíduo que eu queria observar. No mundo nas proximidades do qual eu acabava de chegar, os seres, não encarnados num invólucro grosseiro como na Terra, mas livres e dotados de faculdades de percepção elevadas num eminente grau de poder, podem perceber distintamente detalhes que, a essa distância, escapariam absolutamente aos olhos das organizações terrestres.

Sitiens — Para isto eles se servem de instrumentos superiores aos nossos telescópios?

Lúmen — Se, por ser menos rebelde à admissão desta maravilhosa faculdade, vos é mais fácil concebê-los munidos de instrumentos, teoricamente o podeis. Mas devo advertir-vos que esses tipos de instrumentos não são exteriores a esses seres, e que pertencem ao próprio organismo de sua vista. É claro que essa construção óptica e esse poder de visão são naturais nesses mundos e não sobrenaturais. Pensai um pouco nos insetos que gozam da propriedade de contrair ou de alongar os olhos, como os tubos de uma luneta, de inflar ou aplanar o cristalino para dele fazer uma lente de diferentes graus, ou ainda concentrar no mesmo foco uma porção de olhos assestados como outros tantos microscópios, para captar o infinitamente pequeno, e podereis mais legitimamente admitir a faculdade desses seres extraterrenos.”

O mundo onde se acha Lúmen está a uma distância tal da Terra que a luz não chega de um ao outro senão ao cabo de setenta e dois anos. Ora, nascido em 1793 e morto em 1864, à sua chegada em Capela, de onde lança o olhar sobre Paris, Lúmen não conhece mais a Paris que acaba de deixar. Os raios luminosos partidos da Terra, só chegando a Capela depois de setenta e dois anos, trar-lhe-iam a imagem do que aí se passava em 1793.


4. — Eis a parte realmente científica do relato. Todas as dificuldades aí são resolvidas da maneira mais lógica. Os dados, admitidos em teoria pela Ciência, aí são demonstrados pela experiência; mas não podendo essa experiência ser feita diretamente pelos homens, o autor supõe um Espírito que dá conta de suas sensações, e colocado em condições de poder estabelecer uma comparação entre a Terra e o mundo que habita.

A ideia é engenhosa e nova. É a primeira vez que o Espiritismo verdadeiro e sério, embora anônimo, é associado à ciência positiva, e isto por um homem capaz de apreciar um e outra, e de captar o traço de união que um dia os deverá ligar. Este trabalho, ao qual reconhecemos, sem restrição, uma importância capital, parece-nos ser um daqueles que os Espíritos nos anunciaram como devendo marcar o presente ano. Analisaremos esta segunda parte num próximo artigo.


[Revista de maio.]

5. LUMEN.


Por Camille Flammarion.
(2º artigo. – Vide o número de março.)

Deixamos Lúmen em Capela, ocupado em considerar a Terra, que acabava de deixar. Estando este mundo situado a trilhões e 392 bilhões de léguas da Terra, e percorrendo a luz 70.000 léguas por segundo, esta não pode chegar de um a outro senão em 71 anos, 8 meses e 24 dias, ou seja, cerca de 72 anos. Disso resulta que o raio luminoso que leva a imagem da Terra só chega aos habitantes de Capela ao cabo de 72 anos. Tendo Lúmen morrido em 1864, e lançando o olhar sobre Paris, a viu tal qual era 72 anos antes, isto é, em 1793, ano de seu nascimento.

De início ficou muito surpreso por encontrar tudo diferente do que tinha visto, de ver ruelas, conventos, jardins, campos, em lugar de avenidas, novos bulevares, estações ferroviárias, etc. Viu a Praça da Concórdia ocupada por uma imensa multidão e foi testemunha ocular do advento de 21 de janeiro.   n A teoria da luz lhe deu a chave deste estranho fenômeno. Eis a solução de algumas dificuldades que ele levanta. n


Sitiens — Mas, então, se o passado pode confundir-se com o presente; se a realidade e a visão se casam do mesmo modo; se pessoas mortas há muito tempo ainda podem ser vistas representando na cena; se as construções novas e as metamorfoses de uma cidade como Paris podem desaparecer e deixar ver em seu lugar a cidade de outrora; enfim, se o presente pode apagar-se para a ressurreição do passado, sobre que certeza, de agora em diante, podemos confiar? Em que se tornam a Ciência e a observação? Em que se tornam as deduções e as teorias? Em que se fundam os nossos conhecimentos, que nos parecem os mais sólidos? E se essas coisas são verdadeiras, não devemos, doravante, duvidar de tudo ou crer em tudo?

Lúmen — Estas considerações e muitas outras, meu amigo, me absorveram e atormentaram, mas não impediram de ser a realidade que eu observava. Quando tive a certeza de que tínhamos presente sob os olhos o ano de 1793, pensei imediatamente que a própria Ciência, em vez de combater esta realidade – porque duas verdades não podem opor-se entre si -devia me dar a sua explicação. Então interroguei a física e esperei sua resposta. (Segue a demonstração científica do fenômeno.)

Sitiens — Assim, o raio luminoso é como um correio, que nos traz notícias do estado do país que o envia, e que, se levar 72 anos para nos chegar, dá-nos o estado desse país no momento de sua partida, isto é, cerca de 72 anos antes do momento em que nos chega.

Lúmen — Adivinhastes o mistério. Para falar mais exatamente ainda, o raio luminoso seria um correio que nos trouxesse, não notícias escritas, mas a fotografia, ou mais rigorosamente ainda, o próprio aspecto do país de onde saiu. Quando, pois, examinamos ao telescópio a superfície de um astro, ainda não vemos esta superfície tal qual é no momento mesmo em que a observamos, mas tal qual era no momento em que a luz que nos chega foi emitida por essa superfície.

Sitiens — De sorte que se uma estrela cuja luz leva, suponhamos, dez anos para chegar até nós, fosse subitamente aniquilada hoje, nós a veríamos ainda durante dez anos, pois seu último raio só nos chegaria em dez anos.

Lúmen — É exatamente isto. Há, pois, aí, uma surpreendente transformação do passado em presente. Para o astro observado é o passado, já desaparecido; para o observador é o presente, o atual. O passado do astro é rigorosa e positivamente o presente do observador.


6. — Mais tarde Lúmen vê a si mesmo, menino, com seis anos, brincando e discutindo com um grupo de outros meninos na Praça do Panthéon.  † 


Sitiens — Confesso que me parece impossível que se possa ver assim a si mesmo. Não podeis ser duas pessoas. Já que tínheis 72 anos quando morrestes, vosso estado de infância tinha passado, desaparecido há muito tempo. Não podeis ver uma coisa que não mais existe. Não se pode ver em duplicata, menino e velho.

Lúmen — Não refletis bastante, meu amigo. Compreendestes muito bem o fato geral para o admitir; mas não observastes suficientemente que este último fato particular entra absolutamente no primeiro. Admitis que o aspecto da Terra leva 72 anos para vir a mim, não é? que os acontecimentos não me chegam senão com este intervalo de tempo depois de sua atualidade? Numa palavra, que eu veja o mundo tal qual era naquela época. Igualmente admitis que, vendo as ruas daquela época, eu veja, ao mesmo tempo, os meninos que corriam naquelas ruas? Pois bem! desde que vejo este grupo de crianças, do qual fazia parte, por que quereis que não me veja tão bem quanto vejo os outros?

Sitiens — Mas não estais mais naquele grupo.

Lúmen — Ainda uma vez, este grupo mesmo não mais existe agora, mas eu o vejo tal qual existia no instante em que partia o raio luminoso que hoje me chega e, já que distingo os quinze ou dezoito meninos que o compunham, não há razão para que o menino que era eu desapareça, só porque sou eu quem o olha. Outros observadores o veriam em companhia de seus camaradas.

Por que quereis que haja exceção quando sou eu quem olha? Eu os vejo todos, e me vejo com eles.

Lúmen passa em revista a série dos principais acontecimentos políticos, ocorridos desde 1793 até 1864, quando ele próprio se vê em seu leito de morte.

Sitiens — Estes acontecimentos passaram rapidamente sob os vossos olhos?

Lúmen — Eu não poderia apreciar a medida do tempo. Mas todo esse panorama retrospectivo se sucedeu certamente em menos de um dia… talvez em algumas horas.

Sitiens — Então não compreendo mais. Se 72 anos terrestres passaram sob vossos olhos, deveriam ter gasto exatamente 72 anos para vos aparecer, e não algumas horas. Se o ano de 1793 só vos apareceu em 1864, em compensação o de 1864 não vos deveria aparecer senão em 1936.

Lúmen — Vossa objeção é fundada e me prova que compreendestes bem a teoria do fato. Por isso, vou explicar-vos por que não me foi necessário esperar 72 novos anos para rever minha vida, e como, sob o impulso de uma força inconsciente, de fato a revi em menos de um dia.


Continuando a seguir minha existência, cheguei aos últimos anos, notáveis pela transformação radical que sofreu Paris; vi meus últimos amigos e vós mesmo; minha família e meu círculo de relações; enfim chegou o momento em que me vi deitado em meu leito de morte e onde assisti à última cena. É dizer-vos que tinha voltado à Terra.

Atraída pela contemplação que a absorvia, rapidamente minha alma tinha esquecido um montão de velhos e Capela. Como se o sente por vezes em sonho, ela voava para o objetivo de seus olhares. De início não me apercebi, tanto a estranha visão cativava todas as minhas faculdades. Não vos posso dizer nem por que lei, nem por que força as almas podem transportar-se tão rapidamente de um a outro lugar; mas a verdade é que eu tinha voltado à Terra em menos de um dia, e que penetrava em meu quarto no exato momento de meu enterro.

Porque, nesta viagem de volta, eu ia à frente dos raios luminosos, eu diminuía incessantemente a distância que me separava da Terra, a luz tinha cada vez menos caminho a percorrer e abreviava assim a sucessão dos acontecimentos. Em meio do caminho, não me mostravam mais a Terra de 72 anos antes, mas de 36. Aos três quartos do caminho, os aspectos eram atrasados apenas 18 anos. Na metade do último quarto, chegavam-me apenas após passados 9 anos, e assim por diante; de sorte que a série inteira de minha existência se achou condensada em menos de um dia, devido à rápida volta de minha alma, indo à frente dos raios luminosos.


7. — Quando Lúmen chegou em Capela, viu um grupo de velhos ocupados em considerar a Terra, e dissertando sobre o acontecimento de 1793. Um deles disse aos companheiros: [v. 2ª nota de rodapé.]


“De joelhos! meus irmãos; peçamos indulgência ao Deus universal. Esse mundo, essa nação, essa cidade estão manchados por um grande crime; a cabeça de um rei inocente acaba de cair.” Aproximei-me do ancião, diz Lúmen, e lhe pedi que me fizesse o relato de suas observações.

“Informou-me que, pela intuição de que são dotados os Espíritos do grau dos que habitam este mundo, e pela faculdade íntima de apercepção que receberam em partilha, possuem uma espécie de relação magnética com as estrelas vizinhas. Estas estrelas são em número de doze ou quinze; são as mais próximas; fora dessa região a apercepção torna-se confusa. Nosso Sol é uma dessas estrelas vizinhas. n Eles conhecem, pois, vagamente mas sensivelmente, o estado das humanidades que habitam os planetas dependentes desse sol e o seu relativo grau de elevação intelectual e moral.

“Além disso, quando uma grande perturbação atravessa uma dessas humanidades, quer na ordem física, quer na ordem moral, eles sofrem uma espécie de comoção íntima, como se vê uma corda vibrante fazer entrar em vibração uma outra corda situada a distância.”

“Há um ano – o ano deste mundo é igual a dez dos nossos – eles se tinham sentido atraídos por uma emoção particular para o planeta terrestre, e os observadores tinham seguido com interesse e inquietude a marcha deste mundo.”


8. — Laboraríamos em erro se inferíssemos do que precede que os habitantes das diferentes esferas, do ponto de vista onde estão, lançam um olhar investigativo sobre o que se passa nos outros mundos, e que os acontecimentos que aí se realizam passam sob seus olhos como no campo de uma luneta. Aliás, cada mundo tem suas preocupações especiais, que cativam a atenção de seus habitantes, conforme suas próprias necessidades, seus costumes completamente diferentes e seu grau de adiantamento. Quando os Espíritos encarnados num planeta têm motivos pessoais para se interessarem pelo que se passa em outro mundo, ou por alguns dos que o habitam, sua alma para lá se transporta, como fez a de Lúmen, em estado de desprendimento, e então se tornam momentaneamente, a bem dizer, habitantes espirituais desse mundo, ou aí se encarnam em missão. Eis, pelo menos, o que resulta do ensinamento dos Espíritos. [v. Resumo teórico do sonambulismo do êxtase e da dupla vista.]

Esta última parte do relato de Lúmen carece, pois, de exatidão; mas não se deve perder de vista que esta história não passa de uma hipótese, destinada a tornar mais acessíveis à inteligência e, de certo modo, palpáveis pela entrada em ação, da demonstração de uma teoria científica, como fizemos observar em nosso artigo precedente. [Item n.º 4.]

Chamamos a atenção para o parágrafo acima, no qual é dito que: “As grandes perturbações físicas e morais de um mundo produzem sobre os mundos vizinhos uma espécie de comoção íntima, como uma corda vibrante faz vibrar uma outra corda colocada a distância.” O autor, que em matéria de ciência não fala levianamente, anuncia aí um princípio que um dia bem poderia ser convertido em lei. A Ciência já admite, como resultado da observação, a ação recíproca material dos astros. Se, como se começa a suspeitar, esta ação, aumentada pelo fato de certas circunstâncias, pode ocasionar perturbações e cataclismos, nada haveria de impossível que essas mesmas perturbações tivessem seu contragolpe. Até o presente a Ciência considerou apenas o princípio material; mas, se se levar em conta o princípio espiritual como elemento ativo do Universo, e se se pensar que esse princípio é tão geral e tão essencial quanto o princípio material, conceber-se-á que uma grande efervescência deste elemento e as modificações que ele sofre num ponto dado possam ter sua reação, por força da correlação necessária que existe entre a matéria e o espírito. Há certamente nesta ideia o germe de um princípio fecundo e de um estudo sério para o qual o Espiritismo abre caminho.



[1] Cada número forma um volume de 160 páginas grande in-8. Preço: 2 fr. Paris, Livraria lnternacional, 15, boulevard Montmartre,  †  e 18, avenue Montaigne,  †  Palais Pompéien.


[2] Alpha Aurigae conhecida como Capella ou 13 Aurigae é a estrela mais brilhante da constelação de Auriga e a sexta mais brilhante do céu. Seu nome advém do latim capella = cabra. Capella é uma gigante amarela com dimensões maiores que o Sol e com um espectro semelhante a este. Encontra-se a 44,6794 a.l. do Sol.  † 


[3] N. do T.: Flammarion se refere à execução de Luís XVI, ocorrida em 21 de janeiro de 1793.


[4] Segundo o cálculo, e em razão da distância do Sol, que é de 38 milhões e 230 mil léguas de 4 quilômetros, a luz desse astro nos chega em 8 minutos e 13 segundos. Disso resulta que um fenômeno que se passasse em sua superfície só nos chegaria 8 minutos e 13 segundos mais tarde, e se tal fenômeno fosse instantâneo, já não existiria mais quando o víssemos. Sendo a distância da Lua de apenas 85.000 léguas, sua luz nos chega mais ou menos em um segundo e um quarto; por conseguinte, as perturbações que aí pudessem acontecer nos apareceriam pouco depois do momento em que ocorressem. Se Lúmen estivesse na Lua, teria visto a Paris de 1864, e não de 1793. Se estivesse num mundo duas vezes mais afastado do que Capela, teria visto a Regência.  † 


[5] 170 trilhões e 392 bilhões de léguas! Pela distância que separa as estrelas vizinhas pode-se julgar a extensão ocupada pelo conjunto das que, entretanto, nos parecem à vista tão perto umas das outras, sem contar o número infinitamente maior das que só são perceptíveis com o auxílio do telescópio e que não são, elas próprias, senão uma ínfima fração das que, perdidas nas profundezas do infinito, escapam a todos os nossos meios de investigação. Se se considerar que cada estrela é um sol, centro de um turbilhão planetário, compreender-se-á que o nosso próprio turbilhão não passa de um ponto nessa imensidade. Que é, pois, nosso globo de 3.000 léguas de diâmetro, entre esses bilhões de mundos? Que são seus habitantes, que durante muito tempo acreditaram que seu pequeno mundo era o ponto central do Universo, e eles próprios se crerem os únicos seres vivos da criação, concentrando apenas em si as preocupações e a solicitude do Eterno e crendo de boa-fé que o espetáculo dos céus não tinha sido feito senão para lhes recrear a vista? Todo esse sistema egoísta e mesquinho, que, durante longos séculos, constituiu o fundamento da fé religiosa, desmoronou-se diante das descobertas de Galileu.


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