Não nos permitindo a abundância de matérias publicar atualmente todas as instruções ditadas por ocasião dos funerais do Sr. Allan Kardec, nem mesmo todas as que foram dadas por ele próprio, reunimos numa única comunicação os ensinamentos de interesse geral, obtidos através de diversos médiuns.
(Sociedade de Paris, †
abril de 1869.)
Como vos agradecer, senhores, pelos vossos bons sentimentos e pelas verdades expressas com tanta eloquência sobre os meus restos mortais? Não podeis duvidar: eu estava presente e profundamente feliz, sensibilizado pela comunhão de pensamento que nos unia pelo coração e pelo espírito.
Obrigado, meu jovem amigo (O Sr. C. Flammarion), obrigado por vos haverdes afirmado, como o fizestes. Vós vos exprimistes com calor; assumistes uma responsabilidade grave, séria e esse ato de independência vos será contado duplamente; nada perdestes por dizer o que as vossas convicções e a Ciência vos impõem. Assim agindo, podeis ser discutido, mas sereis honrado merecidamente.
Obrigado a vós todos, caros colegas, meus amigos; obrigado ao jornal Paris, que começa um ato de justiça pelo artigo de um bravo e digno coração.
Obrigado, caro vice-presidente; Sr. Delanne, Sr. E. Muller, recebei a expressão dos meus sentimentos de viva gratidão, vós todos que hoje apertais afetuosamente a mão de minha corajosa companheira.
Como homem, estou muito feliz pelas boas lembranças e pelos testemunhos de simpatia que me prodigalizais; como espírita eu vos felicito pelas determinações que tomastes para assegurar o futuro da Doutrina; porque, se o Espiritismo não é minha obra, ao menos eu lhe dei tudo quanto as forças humanas me permitiram lhe desse. É como colaborador enérgico e convicto, como campeão, de todos os instantes, da grande doutrina deste século, que o amo, e ficaria infeliz se visse perecer, caso isto fosse possível.
Ouvi com sentimento de profunda satisfação o meu amigo, o vosso novo e digno presidente, vos dizer: “Ajamos de acordo; vamos despertar os ecos, que há muito tempo não mais ressoam; vamos reavivar aqueles que ecoam! Que não seja Paris, que não seja a França o teatro de vossa ação; vamos a toda parte! Demos à Humanidade inteira o maná que lhe falta; demos-lhe o exemplo da tolerância que ela esquece, da caridade que conhece tão pouco!”
Agistes para assegurar a vitalidade da Sociedade; está certo. Tendes o desejo sincero de marchar com firmeza pelo sulco traçado; ainda está certo. Mas, não basta querer hoje, amanhã, depois de amanhã; para ser digno da Doutrina é preciso querer sempre! A vontade que age por espasmos não é mais vontade: é o capricho no bem; mas, quando a vontade se exerce com a calma que nada perturba, com a perseverança que nada detém, é a verdadeira vontade, inquebrantável em sua ação, frutuosa em seus resultados.
Sede confiantes em vossas forças: elas produzirão grandes efeitos se as empregardes com prudência; sede confiantes na força da ideia que vos une, pois ele é indestrutível. Pode-se ativar ou retardar o seu desenvolvimento, mas é impossível detê-la.
Na fase nova em que entramos, a energia deve substituir a apatia; a calma deve substituir o ímpeto. Sede tolerantes uns para com os outros; agi sobretudo pela caridade, pelo amor, pela afeição. Oh! se conhecêsseis todo o poder desta alavanca! Foi essa alavanca que levou Arquimedes a dizer que com ela levantaria o mundo! Vós o levantareis, meus amigos, e esta transformação esplêndida, que será efetuada por vós em proveito de todos, marcará um dos mais maravilhosos períodos da história da Humanidade.
Coragem, pois, e esperança. Esperança!… esse facho que os vossos infelizes irmãos não podem perceber através das trevas do orgulho, da ignorância e do materialismo, não o afasteis ainda mais de seus olhos. Amai-os; fazei com que vos amem, vos ouçam, vos olhem! Quando tiverem visto, ficarão deslumbrados.
Então, meus amigos, meus irmãos, como eu seria feliz ao ver que os meus esforços não foram inúteis e que o próprio Deus abençoou a nossa obra! Nesse dia haverá no céu uma grande alegria, um grande êxtase! A Humanidade estará livre do jugo terrível das paixões que a acorrentam e oprimem com um peso esmagador. Então não mais haverá na Terra o mal, nem o sofrimento, nem a dor; porquanto os verdadeiros males, os sofrimentos reais, as dores cruciantes vêm da alma. O resto não passa do leve roçar de um espinho sobre as vestes!…
Ao clarão da liberdade e da caridade humanas, todos os homens, reconhecendo-se, dirão: “Somos irmãos” e só terão no coração um mesmo amor, na boca uma só palavra, nos lábios um só murmúrio: Deus!
Allan Kardec.