Em apoio às reflexões contidas no artigo precedente, reproduzimos com prazer a carta seguinte, publicada pelo Petite-Presse de 20 de setembro de 1868.
“Les Charmettes, † setembro de 1868.
“Meu caro Barlatier,
“Sabeis a canção: Quando se é basco e bom cristão…
“Sem ser basco, sou bom cristão, e o cura de minha aldeia, que ontem comia a minha sopa de couve, me permite que vos conte a nossa conversa.
“— Então ides retomar o Rei Henrique? — Com tanto melhor vontade, respondi, quanto eu vivi naquele tempo. — Meu digno cura teve um sobressalto.
“Então lhe comuniquei minha convicção de que já tínhamos vivido e que viveríamos ainda. Nova exclamação do bravo homem. Mas, enfim, reconheceu que as crenças cristãs não excluem esta opinião e deixou que eu seguisse o meu caminho.
“Ora, meu caro amigo, acreditai mesmo que eu não quis divertir-me com a candura do meu cura, e que esta convicção de que falo está fortemente arraigada em mim. Vivi ao tempo da Liga, sob Henrique III e Henrique IV. Quando eu era criança, meus avós me falavam de Henrique IV, e de um indivíduo que eu não conhecia absolutamente, um monarca grisalho, enfiado numa gola plissada, n devoto ao excesso e jamais tendo ouvido falar da Belle Gabrielle. † Era o do padre Péréfixe. O Henrique IV que conheci, batalhador, amável, fino, um pouco esquecido, é o verdadeiro. É aquele de quem já falei e vos falarei ainda.
“Não riais. Quando vim a Paris † pela primeira vez, reconhecei-me por toda parte nos velhos bairros e tive uma vaga lembrança de me haver encontrado na rue de la Ferronnerie, † no dia em que o povo perdeu o seu bom rei, aquele que tinha querido que cada francês tivesse aos domingos uma galinha na panela. Que era eu nesse tempo? Pouca coisa, sem dúvida um cadete da Provença † ou da Gasconha. † Mas se tivesse estado nas guardas de meu herói, isto não me surpreenderia.
“Em breve, pois, meu primeiro folhetim da Segunda Juventude do rei Henrique.
“E Crede-me todo vosso.”
Ponson du Terrail.
Quando o Sr. Ponson du Terrail lançava o ridículo sobre o Espiritismo, não imaginava, e talvez ainda hoje não imagine, que uma das bases fundamentais desta doutrina é precisamente a crença da qual faz uma profissão de fé tão explícita. A ideia da pluralidade das existências e da reencarnação evidentemente ganha a literatura e não nos surpreenderíamos que Méry, que se lembrava tão bem do que tinha sido, não tenha despertado em mais de um de seus confrades, lembranças retrospectivas e não seja, entre eles, o primeiro iniciador do Espiritismo, porque o leem, ao passo que não leem os livros espíritas. Eles aí encontram uma ideia racional, fecunda, e a aceitam.
O Petite-Presse publica, neste momento, sob o título de Sr. Médard, um romance cujo enredo é todo espírita. É a revelação de um crime pela aparição da vítima em condições muito naturais.
[1] N. do T.: Grifo nosso. Fraise no original: Espécie de gola ou de colarinho pregueado. Fazia parte da moda da época e foi muito usado pelo rei Henrique IV conforme o retratam os pintores do século XVI. [Veja a roupa do rei na] †