O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano X — Junho de 1867.

(Idioma francês)

NECROLÓGIO.


Sr. Quinemant, de Sétif.

(Sumário)


1. — Escrevem-nos de Sétif  †  (Argélia):

“Venho comunicar-vos a morte de um fervoroso adepto do Espiritismo, o Sr. Quinemant, falecido no sábado santo de 20 de abril de 1867. Foi o primeiro em Sétif que dele se ocupou comigo. Defendeu-o constantemente contra seus detratores, sem se preocupar com os ataques, nem com o ridículo. Era, ao mesmo tempo, um bom magnetizador e, por sua dedicação desinteressada, prestou numerosos serviços a pessoas sofredoras.

“Estava doente desde novembro; tinha febre de dois em dois dias, e quando não a tinha salivava água constantemente. Comia e digeria bem, achava bom tudo quanto tomava e, não obstante isto, emagrecia a olhos vistos; homem de compleição muito robusta, seus membros chegaram à dimensão dos de um menino. Extinguia-se lentamente e compreendia muito bem sua posição; tinha dito que queria morrer no dia em que morrera o Cristo. Conservou toda a lucidez de espírito e conversava como se não estivesse doente. Morreu quase sem sofrimentos, com a tranquilidade e a resignação de um espírita, dizendo à sua mulher que se consolasse, que se encontrariam no mundo dos Espíritos. Todavia, embora pouco gostasse de padres, nos últimos momentos pediu o cura, a despeito de com este ter tido vivas altercações no que respeita ao Espiritismo.

“Far-me-eis um grande favor se o evocardes, caso possível. Não tenho dúvida de que ele sentirá prazer em vir ao vosso apelo, e como era um homem esclarecido e de bom-senso, penso que nos poderá dar úteis conselhos. Era sua opinião que o Espiritismo cresceria, apesar de todos os entraves que lhe suscitam. Pedi-lhe, também, a causa de sua doença, que ninguém conhecia.”


Dumas.


2. — Evocado em particular, o Sr. Quinemant deu a comunicação que segue e no dia seguinte deu espontaneamente, na Sociedade, a que publicamos em separado, sob o título de O Magnetismo e o Espiritismo comparados.


(Paris,  †  16 de maio de 1867. – Médium: Sr. Desliens.)

“Apresso-me em vir ao vosso apelo com tanto maior facilidade quanto, desde o enterro de meus restos mortais, vim a todas as vossas reuniões. Tinha grande desejo de julgar o desenvolvimento da doutrina em seu centro natural; e se não o fiz em vida do corpo, meus negócios materiais foram sua única causa. Agradeço vivamente ao meu amigo Dumas o pensamento benévolo que o levou a vos assinalar a minha partida e a vos pedir a minha evocação; maior prazer ele não me podia dar.

“Embora meu retorno ao mundo dos Espíritos seja recente, estou suficientemente desprendido para me comunicar com facilidade; as ideias que já possuía sobre o mundo invisível, minha crença nas comunicações e a leitura das obras espíritas haviam-me preparado para ver sem espanto, mas não sem infinita felicidade, o espetáculo que me aguardava. Estou feliz pela confirmação de meus mais íntimos pensamentos. Eu estava convencido, pelo raciocínio, do desenvolvimento ulterior, e da importância da Doutrina dos Espíritos sobre as gerações futuras. Mas, ah! eu percebia inúmeros obstáculos e fixava uma época indefinidamente afastada para a predominância de nossas ideias, efeito de minha curta visão e dos limites marcados pela matéria à minha concepção do futuro. Hoje tenho mais que convicção: tenho certeza. Ainda há pouco eu não via senão efeitos muito lentos, ao sabor dos meus desejos; hoje vejo, toco a causa desses efeitos, e meus sentimentos se modificaram. Sim, ainda é preciso muito tempo para que nossa Terra seja uma terra espírita, em toda a acepção da palavra. Mas será preciso um tempo relativamente muito curto para trazer uma considerável modificação na maneira de ser dos indivíduos e das nacionalidades.

“Os ensinamentos que colhi entre vós, o desenvolvimento importante de certas faculdades, os conciliábulos espirituais, aos quais me foi permitido assistir desde minha chegada aqui, persuadiram-me de que grandes acontecimentos estavam próximos, e que num tempo pouco afastado, numerosas forças latentes serão postas em atividade, para auxiliar na renovação geral. Por toda parte o fogo jaz latente sob a cinza; se uma faísca surgir, e ela surgirá, a conflagração tornar-se-á universal.

“Elementos espirituais atuais, triturados na imensa fornalha dos cataclismos físicos e morais que se preparam, uns mais depurados seguem o movimento ascensional; outros, lançados fora com as mais grosseiras escórias, deverão sofrer ainda várias destilações sucessivas, antes de se juntarem aos seus irmãos mais adiantados. Ah! eu compreendo, diante dos acontecimentos que o futuro nos reserva, estas palavras do filho de Maria: Haverá choro e ranger de dentes. ( † ) Fazei, pois, meus amigos, de modo a serdes convidados ao banquete da inteligência e não fazer parte dos que serão lançados nas trevas exteriores.

“Antes de morrer cedi a uma última fraqueza, obedecendo a um preconceito; não que minha crença tivesse fraquejado ante o medo do desconhecido, mas para não me distinguir dos outros. Pois bem! depois de tudo, a palavra de um homem que vos fala do futuro é boa para ouvir no momento da grande viagem; essa palavra é cercada de ensinamentos antiquados, de práticas desgastadas, vejo-o bem, mas não deixa de ser a palavra de esperança e de consolação.

“Ah! vejo com os olhos do espírito, vejo um tempo em que o espírita, ao partir, também será cercado de irmãos que lhe falarão do futuro, da esperança de felicidade! Obrigado, meu Deus, porque me permitistes ver o clarão da verdade nos meus últimos instantes; obrigado por esse abrandamento de minhas provas. Se fiz algum bem, é a esta crença abençoada que o devo; foi ela que me deu a fé, o vigor material e a força moral necessária para curar; foi ela que me deu a lucidez de espírito até os meus últimos momentos, que me permitiu suportar sem murmurar a cruel doença que me levou.

“Perguntais qual é esta afecção a que sucumbi. Ah! meu Deus, é muito simples; as vísceras nas quais se opera a assimilação dos elementos novos, não tendo mais a força necessária para agir, as moléculas gastas pela ação vital eram eliminadas, sem que outras as viessem substituir. Mas que importa a doença de que se morre, quando a morte é uma libertação! Obrigado ainda, caro amigo, pelo bom pensamento que vos levou a pedir a minha evocação. Dizei à minha mulher que sou feliz, que em mim ela encontrará o amado de sempre e que, esperando sua volta, não deixarei de cercá-la com a minha afeição e de ajudá-la com os meus conselhos.

“Agora, algumas palavras para vós pessoalmente, meu caro Dumas. Fostes um dos primeiros chamados a fincar a bandeira da doutrina neste país e, naturalmente, encontrastes obstáculos, dificuldades. Se vosso zelo não foi recompensado por tanto zelo quanto esperáveis, e que pareciam prometer no início, é que é preciso tempo para desarraigar os preconceitos e a rotina num meio inteiramente consagrado à vida material; é preciso já estar adiantado para assimilar prontamente novas ideias, que mudam os hábitos. Lembrai-vos de que o primeiro pioneiro que desbrava o terreno muito raramente é o que colhe; ele prepara o terreno para os que vêm depois dele. Fostes esse pioneiro: era a vossa missão; é uma honra e uma felicidade, que sou feliz por ter partilhado um pouco e que apreciareis um dia, como posso fazê-lo hoje, porquanto vossos esforços vos serão levados em conta. Mas não creiais que nos tenhamos dado a um trabalho inútil; não, nenhuma das sementes que espalhamos está perdida; elas germinarão e frutificarão quando chegar o momento de sua eclosão. A ideia está lançada e fará o seu caminho. Felicitai-vos por ter sido um dos obreiros escolhidos para esta obra. Tivestes dissabores, desilusões: era a prova de vossa fé e de vossa perseverança, sem o que, onde estaria o mérito para realizar uma missão, se só se encontrassem rosas sobre o caminho?

“Portanto, não vos deixeis abater pelas decepções; sobretudo não cedais ao desencorajamento e lembrai-vos destas palavras do Cristo: “Bem-aventurados os que perseverarem até o fim;” e desta outra: “Bem-aventurados os que sofrerem por meu nome.” Perseverai, pois, caro amigo, prossegui vossa obra e pensai que os frutos que se colhem para o mundo onde estou agora, valem mais que os que se colhem na Terra, onde se os deixa ao partir.

“Peço-vos que digais a todos os que me testemunharam afeição e me guardam um bom lugar em sua lembrança, que não os esqueço e que muitas vezes estou em meio deles. Dizei aos que ainda repelem nossas crenças que quando estiverem onde estou, reconhecerão que era a verdade, e que lamentarão amargamente por as terem desprezado, porque terão de recomeçar penosas provações. Dizei aos que me fizeram mal que eu lhes perdoo e que peço a Deus que os perdoe.

“Aquele que vos será sempre devotado.”

E. Quinemant.


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