Estando na ordem do dia a faculdade curadora, não é de admirar que a ela tenhamos consagrado a maior parte deste número e, seguramente, estamos longe de ter esgotado o assunto. Por isso a ele voltaremos.
Logo de saída, para fixar as ideias de muitas pessoas interessadas na questão relativa ao Sr. Jacob, as quais nos escreveram ou poderiam escrever-nos a respeito, dizemos:
1º Que as sessões do Sr. Jacob estão suspensas. Assim, seria inútil apresentar-se no lugar onde se realizavam (Rue de la Roquette, † 80) e que, até o presente, não as retomou em parte alguma. O motivo foi a excessiva aglomeração de pessoas, que dificultava a circulação numa rua muito frequentada, e um beco sem saída, ocupado por grande número de industriais, que se viam impedidos em seus negócios, não podendo receber os clientes, nem expedir as suas mercadorias. Neste momento o Sr. Jacob não dá sessões públicas, nem particulares.
2º Dada a afluência, e devendo cada um esperar muito tempo a sua vez, aos que nos perguntaram, ou no futuro nos perguntarem se, conhecendo pessoalmente o Sr. Jacob, poderiam, com uma recomendação nossa, conseguir atendimento preferencial, diremos que nunca pedimos e jamais o pediríamos, sabendo que seria inútil. Se ingressos preferenciais tivessem sido concedidos, teria sido em prejuízo dos que esperam e não deixariam de provocar justas reclamações. O Sr. Jacob não fez exceções para ninguém; o rico devia esperar como o infeliz, porque, em última análise, o infeliz sofre tanto quanto o rico; como este, não tem o conforto por compensação e, além disso, muitas vezes espera a saúde para ter de que viver. Por isso felicitamos o Sr. Jacob; e se ele não tivesse agido assim, ao solicitarmos um favor apenas teríamos feito uma coisa que nele haveríamos de censurar.
3º Aos doentes que nos perguntaram, ou poderiam perguntar, se lhes aconselhamos fazer a viagem de Paris, † dizemos: O Sr. Jacob não cura todo o mundo, como ele mesmo declara; nunca sabe por antecipação se curará ou não um doente; é somente quando está em sua presença que julga da ação fluídica e vê o resultado; é por isso que nunca promete nada e jamais responde. Aconselhar alguém a fazer a viagem de Paris, seria assumir uma responsabilidade sem certeza de sucesso. É, pois, um risco que se corre, e se não se obtiver resultado, a gente está livre das despesas de viagem, ao passo que se gastam, muitas vezes, somas enormes em consultas, sem maiores vantagens. Se não se fica curado, não se pode dizer que se pagou cuidados inutilmente.
4º Aos que nos perguntam se, indenizando o Sr. Jacob de suas despesas de viagem, já que não aceita honorários, ele concordasse em vir a tal ou qual localidade para cuidar de um doente, respondemos: O Sr. Jacob não atende a convites desse gênero, pelas razões desenvolvidas acima. Não podendo responder previamente pelos resultados, consideraria uma indelicadeza induzir gastos sem certeza de êxito; e em caso de insucesso, seria dar ensejo à crítica.
Aos que escrevem ao Sr. Jacob, ou nos enviam cartas para fazê-las chegar até ele, dizemos: O Sr. Jacob tem em sua casa um armário cheio de cartas, que ele não lê, e não responde a ninguém. Com efeito, que poderia dizer? Aliás, ele não cura por correspondência. Falar com afetação? não é o seu gênero; dizer se tal doença é curável por ele? ele não o sabe. Pelo fato de ter curado uma pessoa de tal doença, não se segue que cure a mesma doença em outras pessoas, porque as condições fluídicas não são as mesmas; indicar um tratamento? ele não é médico e se absteria de fornecer esta arma contra si.
Assim, escrever a ele é trabalho inútil. A única coisa a fazer, caso ele retomasse as sessões, classificadas por engano como consultas, já que não o consultam, é apresentar-se tão logo chegue, entrar na fila, esperar pacientemente e arriscar a chance. Se não se ficar curado, não se pode queixar de ter sido enganado, desde que ele nada promete.
Há fontes que têm a propriedade de curar certas doenças. Vão lá; uns se sentem bem, outros são apenas aliviados; outros, enfim, não experimentam absolutamente nada. Deve-se considerar o Sr. Jacob como uma fonte de fluidos salutares, a cuja influência vão submeter-se, mas que, não sendo uma panaceia universal, não cura todos os males e pode ser mais ou menos eficaz, conforme as condições do doente.
Mas, enfim, houve curas? Um fato responde a esta pergunta: Se ninguém tivesse sido curado, a multidão não teria ido para lá, como fez.
Mas a multidão crédula não pode ter sido enganada por falsas aparências e para lá se dirigir confiando numa reputação usurpada? Comparsas não podem ter simulado doenças para parecerem ter sido curados?
Sem dúvida, isto se viu e se vê todos os dias, quando cúmplices têm interesse em representar a comédia. Ora, aqui, que proveito teriam tirado? Quem os teria pago? Certamente não foi o Sr. Jacob, com o seu soldo de músico dos zuavos; nem a concessão de um desconto sobre as consultas, já que ele nada recebia. Compreende-se que aquele que quer fazer uma clientela a qualquer preço empregue semelhantes meios; mas o Sr. Jacob não tinha o menor interesse em atrair a si a multidão; não a chamou: foi ela que veio a ele e, pode dizer-se, à sua revelia. Se não tivesse havido os fatos, ninguém teria vindo, pois ele não chamava ninguém. Sem dúvida os jornais contribuíram para aumentar o número de visitantes, mas só falaram do caso porque já existia a multidão, sem o que nada teriam dito, pois o Sr. Jacob não lhes tinha pedido que falasse dele, nem pago para fazer propaganda. Deve-se, pois, afastar toda ideia de subterfúgios, que não teriam nenhuma razão de ser na circunstância de que se trata.
Para apreciar os atos de um indivíduo, é preciso buscar o interesse que o pode solicitar na sua maneira de agir. Ora, está comprovado que não havia nenhum da parte do Sr. Jacob; que também não o havia para o Sr. Dufayet, que cedia seu local gratuitamente, e punha seus operários a serviço dos doentes, para carregar os enfermos, e isto com prejuízo de seus próprios interesses; enfim, que comparsas nada tinham a ganhar.
Como as curas operadas pelo Sr. Jacob, nestes últimos tempos, são do mesmo gênero das obtidas o ano passado no campo de Châlons, † e tendo-se passado os fatos mais ou menos da mesma maneira, apenas em maior escala, remetemos nossos leitores aos relatos e apreciações que demos na Revista de outubro e novembro de 1866. Quanto aos incidentes particulares deste ano, não poderíamos senão repetir o que todos souberam pelos jornais. Limitar-nos-emos, pois, quanto ao presente, a algumas considerações gerais sobre o fato em si mesmo.
Há cerca de dois anos, os Espíritos nos haviam anunciado que a mediunidade curadora tomaria grandes desenvolvimentos, e seria um poderoso meio de propagação para o Espiritismo. Até então só havia curadores que operavam, por assim dizer, na intimidade e sem alarido. Dissemos aos Espíritos que, a fim de que a propagação fosse mais rápida, era preciso que surgissem outros mais poderosos, para que as curas tivessem repercussão no público. — Isto acontecerá, foi a resposta, e haverá mais de um.
Essa previsão teve um começo de realização o ano passado, no campo de Châlons, e Deus sabe se este ano faltou repercussão às curas da Rua de la Roquette, não só na França, mas no estrangeiro.
12. — A comoção geral que estes fatos causaram é justificada pela gravidade das questões que eles levantam. Não há por que se equivocar: aqui não está um desses acontecimentos de mera curiosidade, que por um momento apaixonam a multidão ávida de novidades e distrações. A gente não se distrai com o espetáculo das misérias humanas; a visão desses milhares de doentes, correndo em busca da saúde, que não puderam encontrar nos recursos da Ciência, nada tem de prazeroso e leva a sérias reflexões.
Sim, há aqui algo mais que um fenômeno vulgar. Sem dúvida admiram-se das curas obtidas em condições tão excepcionais que parecem raiar o prodígio; mas o que impressiona mais ainda que o fato material, é que aí pressentem a revelação de um princípio novo, cujas consequências são incalculáveis, de uma dessas leis por tanto tempo ocultas no santuário da Natureza, que, à sua aparição, mudam o curso das ideias e modificam as crenças profundamente.
Diz uma secreta intuição que se os fatos em questão são reais, é mais que uma mudança nos hábitos: é um elemento novo introduzido na sociedade, uma nova ordem de ideias que se estabelece.
Embora os acontecimentos do campo de Châlons tenham preparado para o que acaba de se passar, em consequência da inatividade do Sr. Jacob durante um ano, eles quase tinham sido esquecidos; a emoção se havia acalmado, quando, de repente, os mesmos fatos explodem no seio da capital e de súbito tomam proporções inauditas. É, por assim dizer, como se tivéssemos despertado no dia seguinte a uma revolução, e só nos abordássemos perguntando: Sabeis o que se passa na Rua de la Roquette? Tendes notícias? Dispensavam os jornais, como se se tratasse de um grande acontecimento. Em quarenta e oito horas a França inteira ficou sabendo.
Há nesta instantaneidade algo de notável e de mais importante do que se pensa.
A impressão do primeiro momento foi de estupor: ninguém riu. A própria imprensa facciosa simplesmente relatou os fatos e os boatos, sem fazer comentários. Diariamente ela dava o boletim, sem se pronunciar pró, nem contra, e foi possível notar que a maioria dos artigos não eram escritos em tom de zombaria; exprimiam a dúvida, a incerteza quanto à realidade de fatos tão estranhos, inclinando-se, porém, mais para a afirmação do que para a negação. É que o assunto, por si mesmo, era sério; tratava-se do sofrimento e o sofrimento tem algo de sagrado, que impõe respeito; em semelhante caso a pilhéria seria inconveniente e universalmente reprovada. Jamais se viu a verve zombeteira exercitar-se diante de um hospital, mesmo de loucos, ou de um comboio de feridos. Homens de coração e de senso não podiam deixar de compreender que, numa coisa que diz respeito a questões de humanidade, a zombaria teria sido indecorosa, por insultar a dor. Assim, é com um sentimento penoso e uma espécie de desgosto que hoje se vê o espetáculo desses infelizes doentes reproduzido grotescamente nos teatros de feira e traduzido em canções burlescas. Admitindo de sua parte uma credulidade pueril e uma esperança mal fundada, não é uma razão para faltar ao respeito que se deve ao sofrimento.
Em presença de tal repercussão, a denegação absoluta era difícil; a dúvida só é permitida àquele que não sabe ou que não viu. Entre os incrédulos de boa-fé e por ignorância, muitos compreenderam que seria imprudência inscrever-se prematuramente em falso contra fatos que, um dia ou outro, poderiam receber uma consagração e lhes dar um desmentido. Assim, sem nada negar nem afirmar, a imprensa geralmente limitou-se a registrar o estado de coisas, deixando à experiência o cuidado de os confirmar ou desmentir e, sobretudo, de os explicar. Era o partido mais prudente.
Passado o primeiro momento de surpresa, os adversários obstinados de toda coisa nova que contraria as suas ideias, atordoados em alguns momentos pela violência da irrupção, tomaram coragem, principalmente quando viram que o zuavo era paciente e de humor pacífico. Começaram o ataque a todo vapor, servindo-se das armas habituais dos que não têm boas razões para objetar: o gracejo e a calúnia excessivos. Mas a sua polêmica acrimoniosa denuncia cólera e evidente embaraço, e seus argumentos, quase sempre assentados em falso e sobre alegações notoriamente inexatas, não são dos que convencem, porque se refutam por si mesmos.
Seja como for, não se trata aqui de uma questão pessoal. Que o Sr. Jacob sucumba, ou não, na luta, é uma questão de princípios que está em jogo, posta com imensa repercussão e que seguirá seu curso. Traz à memória inumeráveis fatos do mesmo gênero, que a História menciona, e que se multiplicam em nossos dias. Se é uma verdade, não está encarnada num homem, e nada poderia abafá-la; a própria violência dos ataques prova que temem que seja uma verdade.
Nesta circunstância, os que testemunham menos surpresa e menos se emocionam são os espíritas, porque essas espécies de fatos nada têm de que eles não se deem conta perfeitamente. Conhecendo a causa, não se admiram dos efeitos.
Quanto aos que não conhecem a causa do fenômeno, nem a lei que o rege, naturalmente se perguntam se é uma ilusão ou uma realidade; se o Sr. Jacob é um charlatão; se realmente cura todas as doenças; se é dotado de um poder sobrenatural e de quem o tem; se voltamos ao tempo dos milagres. Vendo a multidão que o envolve e o segue, como outrora a que seguia a Jesus na Galileia, † alguns se perguntam mesmo se não seria o Cristo reencarnado, enquanto outros pretendem que sua faculdade seja um presente do diabo.
Desde muito tempo todas estas questões estão resolvidas para os espíritas, que têm a sua solução nos princípios da doutrina. Não obstante, como daí podem sair vários ensinamentos importantes, nós os examinaremos num próximo artigo, no qual faremos ressaltar igualmente a inconsequência de certas críticas.
[Revista de novembro de 1867.]
13.
O ZUAVO JACOB.
(Segundo artigo. — Vide o número de outubro.)
O Sr. Jacob é um charlatão? Seu desinteresse material é um fato constante e, talvez, um dos que mais têm desorientado a crítica. Como acusar de charlatanismo um homem que nada pede e nada quer, nem mesmo agradecimentos?
Qual seria, pois, o seu móvel? O amor-próprio, dizem. Sendo o desinteresse moral absoluto o sublime da abnegação, seria preciso ter a virtude dos anjos para não experimentar certa satisfação quando se vê a multidão se comprimir em torno de si, enquanto na véspera se era desconhecido. Ora, como o Sr. Jacob não tem a pretensão de ser anjo, supondo, o que ignoramos, que tenha exaltado um pouco a sua importância aos seus próprios olhos, disso não se lhe poderia fazer um grande crime, nem isto destruiria os fatos, se os há. Preferimos crer que os que lhe imputam essa imperfeição estão muito acima das coisas terrenas, para se fazerem, a esse respeito, a mais leve censura.
Mas, em todo o caso, esse pensamento não podia ser senão consecutivo e não preconcebido. Se o Sr. Jacob tivesse premeditado o desígnio de se popularizar fazendo-se passar por curador emérito, sem poder provar algo mais que a sua incapacidade, em vez de aplausos só teria recolhido apupos desde o primeiro dia, o que não lhe teria sido muito lisonjeiro. Para se orgulhar de alguma coisa é preciso uma causa preexistente; fazia-se necessário, pois, que ele curasse, antes de se envaidecer.
Acrescentam que ele queria que falassem dele; seja. Se tal fosse o seu objetivo, deve-se convir que, graças à imprensa, ele foi servido na medida do possível. Mas, qual o jornal que poderá dizer que o Sr. Jacob tenha ido mendigar a menor propaganda, o menor artigo, que tenha pago uma única linha? Foi procurar algum jornalista? Não; os jornalistas é que foram a ele e nem sempre puderam vê-lo facilmente. A imprensa falou dele espontaneamente quando viu a multidão, e a multidão só veio quando houve fatos. Foi fazer a corte a grandes personagens? A estes se mostrou mais acessível, mais solicito, mais previdente? Todos sabem que, a esse respeito, ele levou o rigorismo ao excesso. Todavia, seu amor-próprio teria encontrado mais elementos de satisfação na alta sociedade do que entre obscuros indigentes.
Naturalmente deve-se afastar toda imputação de intriga e de charlatanismo.
14. — Ele cura todas as doenças? Não só não as cura todas, mas, de dois indivíduos, atingidos pelo mesmo mal, muitas vezes cura um e nada faz pelo outro. Nunca sabe de antemão se curará um doente, por isso nunca promete nada. Ora, sabe-se que os charlatães não são avarentos em promessas. A cura se deve a afinidades fluídicas, que se manifestam instantaneamente, como um choque elétrico, e que não podem ser prejulgadas.
É dotado de um poder sobrenatural? Voltamos ao tempo dos milagres? Perguntai a ele mesmo e ele vos responderá que em suas curas nada há de sobrenatural, nem de miraculoso; que é dotado de um poder fluídico independente de sua vontade, que se manifesta com maior ou menor energia, conforme as circunstâncias e o meio onde se encontra; que o fluido que emite cura certas doenças em certas pessoas, sem que ele saiba por que, nem como.
Quanto aos que pretendem que essa faculdade é um presente do diabo, pode-se responder que, uma vez que só se exerce para o bem, o diabo tem bons momentos, dos quais é bom aproveitar. Também se lhes pode perguntar que diferença existe entre as curas do príncipe de Hohenlohe e as do zuavo Jacob, para que umas sejam reputadas santas e miraculosas e as outras diabólicas? Passemos sobre esta questão, que em nossa época não pode ser levada a sério.
A questão do charlatanismo prejulgava todas as outras, razão por que nela insistimos. Uma vez afastada, vejamos que conclusões podem ser tiradas da observação.
O Sr. Jacob cura instantaneamente doenças consideradas incuráveis: eis um fato positivo. A questão do número de doentes curados aqui é secundária; houvesse apenas um caso em cem e o fato não subsistiria menos. Ora, esse fato tem uma causa.
A faculdade curadora levada a esse grau de força, achando-se num soldado que, por mais honesto que seja, não tem o caráter, nem os hábitos, nem a linguagem, nem a atitude dos santos; exercida fora de toda forma ou aparato místico, nas mais vulgares e nas mais prosaicas condições; aliás, achando-se em diferentes graus numa porção de outras pessoas, em heréticos como os muçulmanos, os hindus, os budistas, etc., exclui a ideia de milagres no sentido litúrgico da palavra. É, pois, uma faculdade inerente ao indivíduo; e, desde que não é um fato isolado, é que depende de uma lei, como todo efeito natural.
15. — A cura é obtida sem o emprego de nenhum medicamento; portanto é devida a uma influência oculta. E desde que se trata de um resultado efetivo, material e que o nada não pode produzir coisa alguma, é preciso que essa influência seja algo de material. Então só pode ser um fluido material, conquanto impalpável e invisível. Como o Sr. Jacob nem toca no doente, nem lhe aplica nenhum passe magnético, o fluido não pode ter por motor e propulsor senão a vontade. Ora, não sendo a vontade um atributo da matéria, só pode emanar do Espírito; é, pois, o fluido que age sob o impulso do Espírito. n Sendo a maioria das doenças curadas por esse meio aquelas contra as quais a Ciência é impotente, há, então, agentes curativos mais poderosos que os da medicina ordinária. Esses fenômenos são, por conseguinte, a revelação de leis desconhecidas pela Ciência. Em presença de fatos patentes, é mais prudente duvidar do que negar. Tais são as conclusões a que forçosamente chegará todo observador imparcial.
Qual a natureza desse fluido? É eletricidade ou magnetismo? Provavelmente tem um e outro e talvez algo mais; em todo o caso, é uma modificação deles, já que seus efeitos são diferentes. A ação magnética é evidente, embora mais poderosa que a do magnetismo ordinário, de que esses fatos são a confirmação e, ao mesmo tempo, a prova de que não disse a última palavra.
Não entra nos propósitos deste artigo explicar o modo de ação desse agente curativo, já descrito na teoria da mediunidade curadora. Basta ter demonstrado que o exame dos fatos leva a reconhecer a existência de um princípio novo, e que esse princípio, por mais estranho que sejam os seus efeitos, não sai do domínio das leis naturais.
Nos fatos concernentes ao Sr. Jacob, a bem dizer o Espiritismo não foi mencionado, ao passo que toda a atenção concentrou-se no magnetismo. Isto tinha sua razão de ser e sua utilidade. Embora o concurso dos Espíritos desencarnados seja um fato constatado nesses tipos de fenômenos, aqui a sua ação não é evidente, razão por que dela fazemos abstração. Pouco importa que os fatos sejam explicados com ou sem a intervenção de Espíritos estranhos; o magnetismo e o Espiritismo se dão as mãos; são duas partes de um mesmo todo, dois ramos de uma mesma ciência, que se completam e se explicam um pelo outro. Dar crédito ao magnetismo é abrir caminho ao Espiritismo, e reciprocamente.
16. — A crítica não poupou o Sr. Jacob. Como de hábito, e em falta de boas razões, ela lhe prodigalizou chacotas e injúrias grosseiras, com o que ele não se inquietou absolutamente. Desprezou umas e outras, e as pessoas sensatas ficaram gratas por sua moderação.
Alguns chegaram a solicitar o seu encarceramento como impostor abusando da credulidade pública; mas um impostor é quem promete e não cumpre. Ora, como o Sr. Jacob nunca prometeu coisa alguma, ninguém pode queixar-se de ter sido enganado. Que lhe podiam censurar? Onde a contravenção legal? Não exercia a Medicina, nem mesmo ostensivamente o magnetismo. Qual a lei que proíbe curar as pessoas olhando-as?
Denunciaram-no, porque a multidão de doentes que a ele acorria perturbava a circulação. Mas foi ele quem chamou a multidão? Convocou-a por anúncios? Qual o médico que protestaria se tivesse uma semelhante à sua porta? E se um deles tivesse essa boa sorte, mesmo à custa de anúncios caros, que diria se quisessem inquietá-lo pelo fato? Disseram que se mil e quinhentas pessoas por dia, durante um mês, totalizando quarenta e cinco mil doentes, tivessem sido curadas, não deveria mais haver coxos nem estropiados nas ruas de Paris. † Seria supérfluo refutar esta singela objeção; apenas diremos que quanto mais cresce o número de doentes, curados ou não, que se acotovelam na Rua de la Roquette, † mais se prova quão grande é o número daqueles que a Medicina não pode curar, pois é evidente que se esses doentes tivessem sido curados pelos médicos, não teriam vindo ao Sr. Jacob.
Como, a despeito das denegações, havia fatos patentes de curas extraordinárias, quiseram explicá-las dizendo que o Sr. Jacob agia, pela própria aspereza de suas palavras, sobre a imaginação dos doentes. Seja. Mas, então, se reconheceis à influência da imaginação um tal poder sobre as paralisias, as epilepsias, os membros anquilosados, por que não empregais esse meio, em vez de deixar que os inditosos enfermos sofram tanto, ou lhes dar drogas que sabeis inúteis?
17. — Disseram que o Sr. Jacob não tinha o poder que se atribuía, e a prova é que se recusou a ir curar num hospital, sob as vistas de pessoas competentes para apreciar a realidade das curas.
Duas razões devem ter motivado a recusa. Primeiro, não se podia ocultar que a oferta que lhe faziam não era ditada pela simpatia, mas um desafio que lhe propunham. Se, numa sala de trinta doentes, ele só tivesse levantado ou aliviado três ou quatro, não teriam deixado de dizer que isto nada provava e que havia fracassado.
Em segundo lugar, é preciso levar em conta circunstâncias que podem favorecer ou paralisar sua ação fluídica. Quando está rodeado de doentes que lhe vêm voluntariamente, a confiança que trazem os predispõe. Não admitindo nenhum estranho atraído pela curiosidade, ele se acha num meio simpático, que também o predispõe; é dono de si; seu espírito se concentra livremente e sua ação tem toda a sua força. Numa sala de hospital, desconhecido dos doentes habituados aos cuidados de seus médicos, cuja fé em outra coisa que não fosse a sua medicação seria suspeita, sob os olhos inquisidores e zombeteiros de criaturas prevenidas, interessadas em o denegrir; que, em vez de o secundar pelo concurso de injeções benfazejas, temessem mais do que desejariam vê-lo triunfar — o sucesso de um zuavo ignorante seria um desmentido dado ao seu saber — é evidente que, sob o império dessas impressões e desses eflúvios antipáticos, sua faculdade se acharia neutralizada. O erro desses senhores, nisto como quando se tratou do sonambulismo, sempre foi acreditar que esses tipos de fenômenos seriam manobrados à vontade, como uma pilha elétrica.
As curas desse gênero são espontâneas, imprevistas e não podem ser premeditadas nem constituírem objeto de concurso. Acrescentemos a isto que o poder curador não é permanente; aquele que hoje o possui, pode vê-lo cessar no momento em que menos espera. Essas intermitências provam que depende de uma causa independente da vontade do curador e frustram os cálculos do charlatanismo.
Nota. — O Sr. Jacob ainda não retomou o curso de suas
curas. Ignoramos o motivo e parece que não há nada fixado quanto à época
em que recomeçará, se é que isto vai acontecer. Esperando, informam-nos
que a mediunidade curadora se propaga em diferentes localidades, com
aptidões diversas.
Allan Kardec.
Paris. – Typ. de Rouge frères, Dunon et Fresné, rue du Four-Saint-Germain, † 43.
[1]
ERRATUM — Número de novembro de 1867,
página …, linha …: É pois o fluido que agita sem o impulso
do Espírito…, lede: com o impulso. [Revista Espírita de janeiro de 1868.]