A alocução seguinte foi por mim pronunciada nas exéquias do Sr. Nant, um dos nossos colegas da Sociedade de Paris, † em 23 de setembro de 1865. Publicamo-la a pedido da família e porque, nas circunstâncias relatadas no artigo anterior, ela mostra onde está a verdadeira doutrina.
“Senhores e caros colegas da Sociedade de Paris, e vós todos, nossos irmãos em crença, aqui presentes:
“Há apenas um mês, vínhamos a este mesmo lugar, render as nossas últimas homenagens a um dos nossos antigos colegas, o Sr. Dozon. n A partida de um outro irmão aqui nos traz hoje. Membro da Sociedade, o Sr. Nant também acaba de entregar à terra seus despojos mortais, para revestir o brilhante envoltório dos Espíritos. Vimos, conforme expressão consagrada, dizer-lhe o último adeus? Não, pois sabemos que a morte não passa de uma entrada na verdadeira vida, uma separação corporal de alguns instantes, e que o vazio que deixa no lar é apenas aparente.
“Ó doce e santa crença, que sempre nos mostra ao nosso lado os seres que nos são caros! Mesmo que fosse uma ilusão, deveria ser abençoada, porque enche o coração de inefável consolação! Mas, não; não é uma esperança vã, é uma realidade, atestada diariamente pelas relações que se estabelecem entre os mortos e os vivos, segundo a carne. Bendita seja, pois, a ciência que nos mostra o túmulo como o limiar da libertação, e nos ensina a olhar a morte de frente e sem terror!
“Oh! meus irmãos! Lamentemos aqueles que o véu da incredulidade ainda cega; é para eles que a morte tem terríveis apreensões! Para os sobreviventes, é mais que uma separação, é a eterna destruição dos seres mais caros. Para quem vê aproximar-se a última hora, é o abismo do nada, que se abre à sua frente! pensamento horrível, que legitima as angústias e os desesperos. “Que diferença para aquele que, não só acredita na vida futura, mas a compreende e com ela se identifica! Já não marcha com ansiedade para o desconhecido, mas com confiança para a nova via que se abre à sua frente; já entrevê, e conta com sangue-frio, os minutos que dela ainda o separam, como o viajante, que se aproxima do termo do caminho, e sabe que, à sua chegada, vai encontrar repouso e receber os abraços dos amigos.
“Tal foi o Sr. Nant. Sua vida tinha sido a do homem de bem por excelência; sua morte, a do justo e do verdadeiro espírita. Sua fé aos ensinos de nossa doutrina era sincera e esclarecida; nela hauriu imensas consolações durante a vida, resignação nos sofrimentos que a terminaram e uma calma radiosa nos últimos instantes. Ofereceu-nos um exemplo admirável da morte consciente; seguiu com lucidez os progressos da separação, que se operou sem abalos e, quando sentiu partir-se o último laço, abençoou os assistentes; depois, tomando as mãos do neto, criança de dez anos, as colocou sobre os olhos, para ele próprio os fechar. Alguns segundos depois exalava o último suspiro, exclamando: Ah! eu o vejo!
“Neste momento seu neto, tomado de violenta emoção, foi subitamente adormecido pelos Espíritos. Em seu êxtase, viu a alma do avô, acompanhada por uma multidão de outros Espíritos, elevar-se no espaço, mas preso ainda ao invólucro corpóreo pelo cordão fluídico.
“Assim, à medida que se fechavam sobre ele as portas da vida terrena, abriam-se à sua frente as do mundo espiritual, cujos esplendores entrevia.
“Ó sublime e tocante espetáculo! que não tinha por testemunhas os que a esta hora gracejam da ciência que nos revela tão consoladores mistérios! Eles a teriam saudado com respeito, em vez de a ridicularizar. Se lhe atiram a ironia e a injúria, perdoemos-lhes: é que não a conhecem e vão procurá-la onde não se encontra.
“Para nós, rendamos graças ao Senhor, que se dignou rasgar aos nossos olhos o véu que nos separa da vida futura, porquanto a morte só parece terrível aos que nada veem no Além. Ensinando ao homem de onde vem, para onde vai e por que está na Terra, o Espiritismo dotou-o com um imenso benefício, pois lhe dá coragem, resignação e esperança.
“Caro Sr. Nant, nós vos acompanhamos em pensamento no mundo dos Espíritos, onde ides recolher o fruto de vossas provações terrestres e das virtudes de que destes o exemplo. Recebei nosso adeus, até o momento em que nos for permitido aí nos reunirmos.
“Sem dúvida revistes o nosso irmão que vos precedeu há pouco, o Sr. Dozon, e que, certamente vos acompanha neste momento. Unimo-nos a ele, em pensamento, na prece que por vós vamos dirigir a Deus.”
(Aqui é dita a
prece pelas pessoas que acabam de deixar a Terra, e que se acha
em O Evangelho segundo o Espiritismo.)
Nota. – No momento de imprimir este número, soubemos que o Sr. Nant, consoante disposição testamentária, legou 2.000 francos para serem aplicados na propagação do Espiritismo.
[1]
Sr. Dozon [Henri Dozon], autor das Revelações de Além-túmulo [Révélations
d’outre-tombe - Google Books], 4 vol. in-12; morto em Passy
†
(Paris), em 1º de agosto de 1865.