Certas pessoas imaginam que os Espíritos não vêm senão ao apelo que se lhes faz. É um erro do qual não comungam os que conhecem o Espiritismo, pois sabem que muitas vezes eles se apresentam espontaneamente, sem serem chamados, o que nos levou a dizer que mesmo que se proibisse a evocação dos Espíritos, não se poderia impedir que eles viessem. Mas, dirão, eles vêm porque praticais a mediunidade e porque chamais outros; se vos abstivésseis, não viriam. É outro grave erro e os fatos estão aí para provar quantas vezes os Espíritos se manifestaram pela visão, pela audição ou outra maneira qualquer, a pessoas que jamais tinham ouvido falar de Espiritismo. Não é, pois, contra os médiuns que se deveria lançar um mandado de interdição, mas contra os Espíritos, para que não se comuniquem, nem mesmo com a permissão de Deus.
Essas comunicações espontâneas têm um interesse muito mais surpreendente quando emanam de Espíritos que não são esperados nem conhecidos, e cuja identidade pode ser verificada mais tarde. Citamos um exemplo notável na história de Simon Louvet, contada na Revista de março de 1863. Eis outro fato não menos instrutivo, obtido por um médium de nosso conhecimento.
Apresenta-se um Espírito sob o nome de François Franckowski e dita o seguinte:
“O amor de Deus é o sentimento que resume todos os amores, todas as abnegações. O amor da pátria é um raio desse sublime sentimento. Pobre país meu! infeliz Polônia! quantas desgraças vieram abater-se sobre ti! quão terríveis são os crimes dos que se julgam civilizados e como serão castigados os infelizes que querem entravar a liberdade! Ó Deus! lança um olhar sobre este desgraçado país e faze graça aos que, inteiramente voltados à vingança, não pensam que tu os punirás do outro lado da vida. A Polônia é uma terra abençoada, porque dá origem a grandes devotamentos e nenhum de seus filhos é covarde. Deus ama os que esquecem de si mesmos para o bem de todos. É em recompensa do devotamento dos poloneses que ele fará a graça e seu jugo será quebrado. Morri vítima de nossos opressores, execrados por todos os nossos. Eu era jovem, tinha vinte e quatro anos; minha pobre mãe está morrendo de dor, por ter perdido tudo o que amava neste mundo: seu filho. Eu vos suplico, orai por ela, para que esqueça e perdoe o meu carrasco, pois sem esse perdão ela estará para sempre separada de mim… Pobre mãe! eu a revi apenas na manhã de minha morte e era tão horrível nos sentirmos separados!… Deus teve piedade de mim: eu não a abandono desde que pude me libertar do resto de vitalidade que ligava meu Espírito a meu corpo… Venho a vós porque sei que orareis por ela; ela que é tão boa, geralmente tão resignada e, no entanto, tão revoltada contra Deus desde que não estou mais lá!… É preciso que ela perdoe. Orai para que esse sublime perdão de uma mãe ao carrasco de seu filho venha acabar uma vida tão gloriosamente começada. Adeus! Orareis, pois não?”
François Franckowski.
O médium jamais tinha ouvido falar de tal pessoa e julgava que talvez tivesse sido alvo de uma mistificação, quando, alguns dias depois, recebeu diversas peças de linho que tinha encomendado, enroladas num pedaço do Petit Journal de 7 de julho último. Maquinalmente o percorreu e, sob a rubrica de Execuções capitais, leu um artigo que começava assim:
“Encontramos curiosos detalhes sobre a execução de um jovem polonês, prisioneiro dos russos. Franckowsky era um rapaz de vinte e quatro anos. Ainda tem pais, que, inclusive tinham recebido licença para o visitar na prisão. Como não tinha sido pego de armas na mão, foi condenado à forca pelo conselho de guerra. Assisti à execução e não posso pensar sem emoção nesse acontecimento terrível…”
Segue-se o relato detalhado da execução e dos últimos momentos da vítima, morta com a coragem do heroísmo.
Aos que negam as manifestações — e seu número diminui a cada dia — aos que atribuem as comunicações mediúnicas à imaginação, ao reflexo do pensamento, mesmo inconsciente, perguntamos donde podia vir ao médium a intuição do nome de Franckowsky, a idade de vinte e quatro anos, a mãe vindo ver o filho na prisão, do fato, numa palavra, que desconhecia de modo absoluto e do qual até duvidava, e cuja confirmação foi encontrar num pedaço de jornal que enrolava um pacote? E que o fragmento de jornal fosse exatamente o que contém o relato? Direis: “Sim, foi o acaso.” Que o seja, para vós, que não vedes em tudo senão o acaso; mas, e o resto?
Aos que pretendam proibir as comunicações sob o pretexto de que procedem do diabo, ou qualquer outro, perguntamos se existe algo de mais belo, mais nobre, mais evangélico que a alma desse filho que perdoa ao seu carrasco, que suplica à sua mãe que também o perdoe, que dá esse perdão como condição de salvação! E por que vem ele a esse médium, que não conhecia, mas a quem, mais tarde, dá irresistível prova de identidade? Para lhe pedir que ore, a fim de que sua mãe perdoe. E dizeis que isto é linguagem do demônio? Ah! como seria bom se todos os que falassem em nome de Deus o fizessem do mesmo modo! Tocariam mais corações do que com anátemas e maldições. [Vide o artigo seguinte: Da proibição de evocar os mortos.]