Meus amigos, fui muito infeliz na Terra, porque meu Espírito era igual e por vezes superior ao das pessoas que me rodeavam; mas o corpo era inferior. Assim, meu coração era ulcerado pelos sofrimentos morais e pelos males físicos que haviam reduzido meu envoltório terrestre a um estado lastimoso e miserável.
Meu caráter se azedara com as moléstias e as contrariedades que experimentava nas relações com os amigos. Deixei-me levar pela mais causticante malignidade; eu era alegre e aparentemente sem mágoas; no entanto, sofria bem no fundo do coração. Quando estava só, entregue aos secretos pensamentos de minha alma, gemia por encontrar-me em luta entre o bem e o mal. O mais belo dia de minha existência foi aquele em que meu Espírito se separou do corpo; em que, leve e iluminado por um raio divino, lançou-se às esferas celestes. Parecia que eu renascera e a felicidade apoderou-se de meu ser: enfim, eu repousava.
Mais tarde a consciência despertou; reconheci os erros contra o Criador; experimentei remorsos e implorei a piedade do Todo-Poderoso. Desde então, procuro instruir-me no bem; busco tornar-me útil aos homens e progrido diariamente. Contudo, sinto necessidade de que orem por mim e peço aos crentes fervorosos que elevem o pensamento a Deus em meu benefício. Se me chamarem, procurarei vir sempre e responderei às perguntas tanto quanto o puder. Assim se pratica a caridade.
Paul Scarron. n
[1]
[v. Paul
Scarron.]