1. — Um Espírito sofredor apresentou-se dando o nome de Ouran, príncipe russo de outros tempos.
1. Quereis dar-nos algumas minudências sobre a vossa situação?
R. Oh! felizes os humildes de coração, porque deles é o reino do Céu! Orai por mim. 2 Felizes os humildes de coração que escolhem uma posição modesta a fim de cumprirem a provação. 3 Vós todos, a quem devora a inveja, não sabeis o estado a que ficou reduzido um desses que na Terra são considerados felizes; não avaliais o fogo que o abrasa nem os sacrifícios impostos pela riqueza quando por ela se quer obter a salvação! 4 Permita-me o Senhor a mim, déspota orgulhoso, expiar os crimes derivados do meu orgulho entre aqueles mesmos a quem oprimi com a tirania! 5 Orgulho! Repita-se constantemente a palavra para que se não esqueça nunca que ele é a fonte de todos os sofrimentos que nos acabrunham. 6 Sim, eu abusei do poderio e favores de que dispunha; fui duro e cruel para com os inferiores, os quais tiveram de curvar-se a todos os meus caprichos, satisfazer a todas as minhas depravações. 7 Quis a nobreza, a fortuna, as honras, e sucumbi sob peso superior às próprias forças.
8 Os Espíritos que sucumbem são geralmente levados a alegar um compromisso superior às próprias forças o que é ainda um resto de orgulho e um meio de se desculparem para consigo mesmos, não se conformando com a própria fraqueza. 9 Deus não dá a ninguém mais do que possa suportar, não exige da árvore nascente os frutos dados pelo tronco desenvolvido. 10 Demais, os Espíritos têm liberdade; o que lhes falta é a vontade, e esta depende deles exclusivamente; 11 com força de vontade não há tendências viciosas insuperáveis; mas, quando um vício nos apraz, é natural que não façamos esforços por dominá-lo. Assim, somente a nós devemos atribuir as respectivas consequências.
2. Tendes consciência das vossas faltas, e isso é já um passo para a regeneração.
R. Esta consciência é ainda um sofrimento. 2 Para muitos Espíritos o sofrimento é um efeito quase material, visto como, atidos à humanidade de sua última encarnação, não experimentam nem apreendem as sensações morais. 3 Liberto da matéria, o sentimento moral aumentou-se, para mim, de tudo quanto as cruéis sensações físicas tinham de horrível.
3. Lobrigais um termo aos vossos padecimentos?
R. Sei que não serão eternos, mas não lhes entrevejo o fim, sendo-me antes preciso recomeçar a provação.
4. E esperais faze-lo em breve?
R. Não sei ainda.
5. Lembrai-vos dos vossos antecedentes? Faço-vos esta pergunta no intuito de me instruir.
R. Vossos guias aí estão, e sabem do que precisais. 2 Vivi no tempo de Marco Aurélio. Poderoso então, sucumbi ao orgulho, causa de todas as quedas. 3 Depois de uma erraticidade de séculos, quis experimentar uma existência obscura. 4 Pobre estudante, mendiguei o pão, mas o orgulho possuía-me sempre: o Espírito ganhara em ciência, mas não em virtude. 5 Sábio ambicioso, vendi a consciência a quem mais dava, servindo a todas as vinganças, a todos os ódios. Sentia-me culpado, mas a sede de glórias e riquezas estrangulava a voz da consciência. A expiação ainda foi longa e cruel. 6 Eu quis enfim, na minha última encarnação, reencetar uma vida de luxo e poderio, no intuito de dominar os tropeços, sem atender a conselhos. Era ainda o orgulho levando-me a confiar mais em mim mesmo do que no conselho dos protetores amigos que sempre velam por nós. Sabeis o resultado desta última tentativa.
7 Hoje, enfim, compreendo e aguardo a misericórdia do Senhor. Deponho a seus pés o meu arrasado orgulho e peço-lhe que me sobrecarregue com o mais pesado tributo de humildade, pois com o auxílio da sua graça o peso me parecerá leve. 8 Orai comigo e por mim: orai também para que esse fogo diabólico não devore os instintos que vos encaminham para Deus. 9 Irmãos de sofrimentos, oxalá possa o meu exemplo aproveitar-vos e não esqueçais nunca que o orgulho é o inimigo da felicidade. É dele que promanam todos os males que acometem a Humanidade e a perseguem até nas regiões celestes.”
2. — O guia do médium: — Concebestes dúvidas sobre a identidade deste Espírito, por vos parecer a sua linguagem em desacordo com o estado de sofrimento acusando inferioridade. 2 Desvanecei tais dúvidas, porque recebestes uma comunicação séria. Por mais sofredor, este Espírito tem assaz culta inteligência para exprimir-se de tal maneira. 3 O que lhe faltava era apenas a humildade, sem a qual nenhum Espírito pode chegar a Deus. Essa humildade conquistou-a agora, e nós esperamos que, com perseverança, ele sairá triunfante de uma nova provação.
4 Nosso Pai celestial é justíssimo na sua sabedoria e leva em conta os esforços da criatura para dominar os maus instintos. 5 Cada vitória sobre vós mesmos é um degrau franqueado nessa escada que tem uma extremidade na Terra e outra aos pés do Juiz supremo. 6 Alçai-vos por esses degraus resolutamente, porque a subida é tanto mais suave quanto firme a vontade. 7 Olhai sempre para cima a fim de vos encorajardes, porque ai daquele que para e se volta. Depressa o atinge a vertigem, espanta-se do vácuo que o cerca, desanima e diz: — para que mais caminhar, se tão pouco o tenho feito e tanto me falta? Não, meus amigos, não vos volteis. 8 O orgulho está incorporado no homem; pois bem! aproveita-o na força e na coragem de terminar a vossa ascensão. Empregai-o ainda em dominar as fraquezas e galgai o topo da montanha eterna.