Roteiro 8
A parábola do rico e de Lázaro
Objetivo: Interpretar a parábola do homem rico e do pobre Lázaro, à luz do entendimento espírita.
IDEIAS PRINCIPAIS
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Vemos representados nesta parábola os dois extremos: opulência e miséria. Ricos e pobres são Espíritos em provação. A indigência é uma prova dura. A riqueza é uma prova perigosa. Vinicius (Pedro Camargo): Nas pegadas do mestre, item: Lázaro e o rico.
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Se a riqueza houvesse de constituir obstáculo absoluto à salvação dos que a possuem, conforme se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a letra e não segundo o espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns um instrumento de perdição, sem apelação nenhuma, ideia que repugna à razão. Allan Kardec: O Evangelho segundo o Espiritismo, Capítulo 16, item 7.
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SUBSÍDIOS
1. Texto evangélico
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Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele. E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas. E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico e foi sepultado. E, no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaro, no seu seio. E, clamando, disse: Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, somente males; e, agora, este é consolado, e tu, atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá. E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, Abraão, meu pai; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite. Lucas, 16.19-31.
Esta parábola analisa algumas questões fundamentais relativas à riqueza: utilidade, emprego e provas; desigualdades sócio-econômicas; apego aos bens materiais. Proclama, também, a importância da prática da caridade e revela as consequências do egoísmo, do orgulho e da humildade, assim como do desprendimento das coisas materiais.
A utilidade e benefício providencial da riqueza é o controle da pobreza, não um obstáculo à melhoria de quem a possui. É um instrumento de progresso espiritual como tantos outros disponibilizados por Deus.
Sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do orgulho, do egoísmo e da vida sensual. É o laço mais forte que prende o homem à Terra e lhe desvia do céu os pensamentos. Produz tal vertigem que, muitas vezes, aquele que passa da miséria à riqueza esquece de pronto a sua primeira condição, os que com ele a partilharam, os que o ajudaram, e faz-se insensível, egoísta e vão. Mas, do fato de a riqueza tornar difícil a jornada, não se segue que a torne impossível e não possa vir a ser um meio de salvação para o que dela sabe servir-se […]. (1)
O emprego correto da riqueza impulsiona o progresso através dos trabalhos desenvolvidos pelos homens. “Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta. Cabe-lhe desobstruí-lo, saneá-lo, dispô-lo para receber um dia toda a população que a sua extensão comporta.” (2)
A atividade que esses mesmos trabalhos impõem lhe amplia e desenvolve a inteligência, e essa inteligência que ele concentra, primeiro, na satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes verdades morais. Sendo a riqueza o meio primordial de execução, sem ela não mais grandes trabalhos, nem atividade,nem estimulante, nem pesquisas. Com razão, pois, é a riqueza considerada elemento de progresso. (2)
2. Interpretação do texto evangélico
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Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele. E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas. (Lc 16.19-21).
O rico e Lázaro personificam os extremos de duas classes sócio-econômicas existentes na Humanidade: uma possuidora de recursos e facilidades concedidas pela riqueza: bens (“homem rico”); vestimentas (“vestia-se de púrpura e linho finíssimo”), alimentação e confortos (“vivia todos os dias regalada e esplendidamente”). A outra pobre e portadora de dificuldades decorrentes da privação ou escassez de bens materiais: extrema pobreza ou miséria (“certo mendigo, chamado Lázaro”), enfermidades (“que jazia cheio de chagas”), fome (“e desejava alimentar-se com migalhas”), ausência de cuidados básicos de saúde (“os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas”).
Este rico que vestia de púrpura e que todos os dias se regalava esplendidamente, é o símbolo daqueles que querem tratar da vida do corpo e esquecem-se da vida da alma. São os que buscam a felicidade no comer, no beber e no vestir; são os que se entregam a todos os gozos da matéria, são os egoístas que vivem unicamente para si, os orgulhosos que, entronados nos altares das paixões vis, da vaidade, da soberba, não veem senão o que pode saciar a sede de prazeres, não cultivam senão a luxúria, que mata os sentimentos afetivos e anula os dotes do coração. (4)
A riqueza é um meio concedido por Deus para avaliar a sabedoria e a bondade do ser humano. É forma de testar-lhe a capacidade moral. “Dando-lhe o livre-arbítrio, quis ele que o homem chegasse, por experiência própria, a distinguir o bem do mal […]. Cada um tem de possuí-la, para se exercitar em utilizá-la e demonstrar que uso fazer dela.” (3)
Representa […] os excluídos da sociedade terrena, aqueles que, quando muito, pode chegar ao portão dos grandes templos, aqueles que não podem atravessar os umbrais dos palácios dourados, aqueles que essa sociedade corrompida do mundo despreza, amaldiçoa, cobre de labéus [desonra], crava de setas venenosas que lhes chagam o corpo todo. (5)
Os lázaros da parábola simbolizam todos os que, a despeito da difícil situação em que vivem, sofrem com resignação, por compreenderem que os bens do mundo são passageiros. São Espíritos que confiam em Deus, em sua bondade e misericórdia. Ainda que submetidos às dolorosas provações, determinadas pela lei de causa e efeito, não se revoltam, mas mantêm-se pacientes, guiando-se pela esperança em dias melhores, no futuro, após o ressarcimento de suas faltas.
Outro ponto relevante da parábola diz respeito ao que é necessário e ao que é supérfluo na vida, temas estudados nas questões 704 a 710 de O Livro dos Espíritos ou no Evangelho segundo o Espiritismo, capítulos 9, item 5 e 16, item 14 respectivamente. É preciso refletir sobre as implicações morais dos desperdícios, considerando o estado de fome e miséria existente no mundo.
A sobra em todas as situações é o agente aferidor do nosso ajustamento à Lei Eterna que estatui sejam os recursos do Criador divididos justificadamente por todas as criaturas, a começar pela bênção vivificante do Sol. É assim que o leite a desperdiçar-Se, na mesa, é a migalha de alimento que sonegas à criancinha órfã de pão, tanto quanto a roupa a emalar-se, desnecessária, no recanto doméstico, é o agasalho que deves à nudez que a noite fria vergasta. […] Não olvides, assim, que toda sobra desaproveitada nos bens que desfrutas, por efeito de empréstimo da Providência Maior, se converte em cadeia de retaguarda, situando-te pensamentos e aspirações na cidadela da sombra. E, repartindo com o próximo as vantagens que te enriquecem os dias, seguirás, desde a Terra, pelos investimentos do amor puro e incessante, em direitura à Plenitude Celestial. (11)
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E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico e foi sepultado. E, no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaro, no seu seio. E, clamando, disse: Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, somente males; e, agora, este é consolado, e tu, atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá. (Lc 16.19-21).
Os efeitos de nosso proceder durante a existência atual vão refletir-se na outra vida. O rico banqueteava-se, ria, folgava. Lázaro gemia, chorava resignadamente. Vem a morte e a ambos arrebata, porque a morte é inexorável. O corpo para o túmulo, a alma para o Juízo. A consciência é a faculdade que o Espírito possui de refleti sobre si mesmo a luz da divina justiça. Cada um traz consigo o seu juiz. Por isso o rico se viu envolvido nas chamas devoradoras do remorso, enquanto Lázaro fruía o repouso do justo. (8)
Cairbar Schutel compara a situação do rico e a de Lázaro, no além-túmulo, com os dois lados de uma moeda, ou medalha, esclarecendo sobre as dificuldades de compreender o que cada face simboliza, efetivamente.
O […] mendigo vai para a abundância, e o rico é que passa a mendigar! É o reverso da medalha. Vós tendes visto muitas medalhas? Figuremo-las numa libra esterlina: de um lado traz a figura do rei [ou rainha], mas, do outro o seu valor real. […] Cada um de nós é uma medalha; e como medalha, a libra de ouro vale segundo o câmbio corrente, assim também nós valemos de acordo com o câmbio espiritual, que taxa o valor das nossas almas. Aqueles que olham só a efígie, não conhecem o valor do dinheiro […]. Assim também os que olham o homem só pelas aparências, pelo exterior, não conhecem o homem, porque o exterior do homem é a efígie da vaidade, do egoísmo e do orgulho. O que vale na moeda é o reverso; o que vale no homem é o interior, ou seja, o Espírito. O rico trazia no verso o característico do rei, mas, depois que morreu, mas, depois que morreu, apurou-se o valor da medalha gravado no reverso, e esse valor não permitiu o rico senão uma “entrada” no Hades [submundo, “inferno”]. (6)
A situação de Lázaro, no Plano espiritual, é de alguém vitorioso que, ao vencer a prova da pobreza, desenvolveu também a paciência, a humildade e a fé. Esta é a razão de sua felicidade, compartilhada junto a Abraão, o grande patriarca do povo hebreu. O rico por sua vez, falhou na prova, uma vez que a riqueza lhe obliterou os sentimentos de amor ao próximo, desenvolveu-lhe o egoísmo, acirrou-lhe o orgulho, “[…] tornando-o homem licencioso, amigo de bebedices e deleites.” (7)
Merece comentário o significado da palavra “abismo” existente nestes versículos: “E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá”. “Abismo” indica a distância evolutiva que há entre um e outro Espírito. Nesta situação, Lázaro não pode retroceder à posição anteriormente ocupada porque, pelas provações sabiamente suportadas, ascendeu na escala espiritual. Por outro lado, o rico não possuía, ainda, qualidades que o colocasse em um nível mais adiantado. Por este motivo esclarece Abraão: “de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá”.
O sofrimento e o remorso, vivenciados pelo rico, e as benesses desfrutadas por Lázaro, no plano espiritual, são representativas da palavra “abismo.”
Abismo de ordem moral, visto que como Abraão e o rico se viam e conversava. Para o Espírito culpado ou falido se reabilitar não basta o arrependimento, que é o primeiro passo a dar; é necessária a reparação. Portanto o rico não podia ser atendido em seu pedido. Cumpria-lhe voltar à Terra, e reparar o mal. (9)
A súplica do rico (“Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama”) revela que ele não só reconheceu as dificuldades em que se encontrava, como soube curvar a cabeça e pedir auxílio. Não era, pois, um rico tão orgulhoso; talvez tenha sido mais negligente ou indiferente ao sofrimento do próximo do que propriamente mau.
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E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, Abraão, meu pai; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite. (Lc 16.22-31).
É admirável a persistência do rico em minorar, de alguma forma, as consequências do mau uso da riqueza: se não podia, naquele momento, reparar as ações cometidas, tentou beneficiar os seus familiares que ainda permaneciam reencarnados. Esta característica da sua personalidade indica que ele não era também pessoa excessivamente egoísta. Existiam aqueles que eram objeto de sua preocupação, ainda que restrita ao círculo familiar.
Lázaro fortificou-se na dor: resistiu, venceu, subiu. O mesmo rico, apesar de sucumbir, tirou sérios proveitos da própria queda. Acordou para a realidade, arrependeu-se, humilhou-se e mostrou interesse pela sorte dos irmãos; numa palavra: as cordas de seus sentimentos despertaram. Ele viu Lázaro. Não viu os demais.Certamente Lázaro não era o único habitante da celestial mansão; mas, cumpria que o rico o visse, porque fora sobre ele que incidira a dureza do seu coração. O algoz deve ver e reconhecer sua vítima. (7)
A resposta de Abraão é sábia: o testemunho de um Espírito desencarnado não seria jamais considerado, tendo em vista que Espíritos de categoria superior, como Moisés e os profetas, não foram acreditados. Esta resposta nos faz refletir que temos o Evangelho e a Doutrina Espírita para nos guiar e nos garantir a felicidade eterna. Entretanto, agimos como crianças espirituais que muitas vezes desprezam as seguras orientações e se enveredam por caminhos que resultam em amargas provações. A propósito, esclarece Emmanuel:
A resposta de Abraão ao rico da parábola ainda é ensinamento de todos os dias, no caminho comum. Inúmeras pessoas se aproximam das fontes de revelação espiritual, entretanto, não conseguem a libertação dos laços egoísticos de modo que vejam e ouçam, qual lhes convém aos interesses essenciais. […] Ninguém justifique a própria cegueira com a insatisfação do capricho pessoal. O mundo está repleto de mensagens e emissários, há milênios. O grande problema, no entanto, não está em requisitar-se a verdade para atender ao círculo exclusivista de cada criatura, mas na deliberação de cada homem, quanto a caminhar com o próprio valor, na direção das realidades eternas. (10)
ANEXO
ORIENTAÇÕES AO MONITOR: Após uma rápida introdução do assunto, pedir à turma que se organize em grupos, cabendo a cada um a tarefa de ler, trocar ideias e apresentar, em plenária, a conclusão da atividade grupal. Como sugestão, caberia a cada grupo analisar uma parte do texto evangélico e os respectivos comentários espíritas, constantes da divisão proposta nos subsídios deste Roteiro.
Referências:
1. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Capítulo 16, item 7, p. 289.
2. Idem, ibidem - p. 291.
3. Idem - Item 8, p. 292.
4. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item: Parábola do rico e Lázaro, p. 133.
5. Idem, ibidem - p. 134.
6. Idem, ibidem - p. 135.
7. VINICIUS (Pedro Camargo). Nas pegadas do mestre. 11. ed. 2007. Item: Lázaro e rico, p. 156.
8. Idem, ibidem - p. 156-157.
9. Idem, ibidem - p. 157.
10. XAVIER, Francisco Cândido. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Capítulo 116 (Ouçam-nos), p. 247-248.
11. Idem - Religião dos Espíritos. Pelo Espírito Emmanuel. 20. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. item: Sobras, p. 37-38.