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EADE — Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita — Religião à luz do Espiritismo

TOMO II — ENSINOS E PARÁBOLAS DE JESUS — PARTE I
Módulo II — Ensinos diretos de Jesus

Roteiro 6


A inspiração de Pedro


 

Objetivos: Esclarecer a respeito desta afirmativa de Pedro: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16). — Interpretar o sentido das palavras de Jesus: “tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja” (Mt 16.18).



IDEIAS PRINCIPAIS

  • Quem dizeis vós que eu sou?

    À pergunta que nos serve de epígrafe, dirigida por Jesus aos seus discípulos, Pedro, iluminado pelas luzes do Alto, assim respondeu: Tu és o Cristo, filho do Deus Vivo. A despeito, porém, dessa clara e concisa revelação, a cristandade, mal conduzida e mal orientada, faz da individualidade do Mestre tema de controvérsias e, pior do que isso, pedra de tropeço e pomo de discórdias. Vinícius [Pedro de Camargo]: Na seara do mestre, p. 75.

  • Com a afirmativa “tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja”, […] Jesus confia a Pedro a orientação dos primeiros passos do Cristianismo e a direção dos primeiros trabalhos da disseminação do Evangelho. Eliseu Rigonatti. O Evangelho dos humildes, p. 155-156.



 

SUBSÍDIOS


1. Texto Evangélico

  • E chegando Jesus às partes de Cesareia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do Homem? E eles disseram: Uns, João Batista; outros, Elias, e outros, Jeremias ou um dos profetas. Disse-lhes ele: E vós, quem dizeis que eu sou? E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. E eu te darei as chaves do Reino dos Céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus. Então, mandou aos seus discípulos que a ninguém dissessem que ele era o Cristo. Mateus 16.13-20.

2. Interpretação do texto evangélico

  • E, chegando Jesus às partes de Cesareia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo… (Mt 16.13)

O estudo do Evangelho apresenta nuances que merecem ser destacadas. “Chegando” é a conjugação do verbo chegar no gerúndio. Trata-se de uma forma nominal do verbo, usada para exprimir uma circunstância, já que o gerúndio não está conjugado com verbos auxiliares (andar, estar, ir, vir).

É importante considerar, a propósito, que Jesus sempre valorizou as circunstâncias para ensinar com acerto. Daí ser usual encontrarmos no seu Evangelho verbos flexionados no gerúndio, tais como: partindo, operando, cumprindo, falando, dirigindo, voltando, retirando, etc.

Cesareia de Filipe (ou de Filipo) era um lugar pacato e afastado, situado ao pé do monte Hermon, norte da Palestina. Esta cidade foi ampliada e embelezada por Filipe, tetrarca de Itureia, em honra de Tibério César. Localizada na cabeceira do rio Jordão, foi assim nomeada para distinguir de outra Cesareia, a marítima. Por estar mais distante do foco político e religioso das demais cidades e povoados, Cesareia de Filipe se afigurava como um lugar ideal para as pessoas emitirem opinião sobre Jesus, falando despreocupadamente e de forma autêntica. Vemos, ainda hoje, que quando se diminui o poder das atrações exteriores, com mais naturalidade expressamos os nossos reais sentimentos e ideias.

“E chegando Jesus às partes de Cesareia de Filipe” se concretiza também, na “cesareia” de nosso campo pessoal, na intimidade do nosso ser, em momentos mais tranquilos favoráveis à reflexão. Sob o influxo da meditação e da autoanálise, nos identificamos com Jesus.

A outra frase, “interrogou os seus discípulos”, é sugestiva de que Jesus procurava aferir o nível de aprendizado desenvolvido pelos seus discípulos em relação às suas orientações e à sua pessoa, propriamente dita. O Mestre, como todos os demais benfeitores que nos tutelam com amor, acompanham de perto o nosso desenvolvimento, verificando se nós, efetivamente, estamos seguindo os seus passos.

“Discípulo” significa aprendiz, mas só há mestre onde existe discípulo. Por sua vez, o verdadeiro discípulo é consciente das próprias carências e tem necessidade de ser guiado por um bom mestre, submetendo-se com humildade e prudência às suas orientações. O texto nos mostra que os discípulos devem se portar como atentos observadores do seu orientador (guia ou mestre) e dos ensinamentos que este lhes transmite como diretrizes de vida.

Ao interrogá-los, Jesus deu a entender que eles deveriam se posicionar como observadores atentos. Esta é também a proposta da Doutrina Espírita quando, pela fé raciocinada, nos fornece seguros padrões de conhecimento impulsionadores da nossa melhoria espiritual, e nos concede também condições para avaliar o progresso adquirido, segundo a nossa posição evolutiva.

Além disso, a fé raciocinada viabiliza condições para entender e respeitar o grau de progresso de cada criatura que nos compartilha a existência.

  • Quem dizem os homens ser o Filho do Homem? (Mt 16.13)

Em outras palavras: “o que falam os homens relativamente à minha pessoa?” Ambas indagações indicam processo avaliativo que, partindo-se do exame global ou coletivo, se atinge o específico ou pessoal.

Em todos os instantes da vida encontramos pessoas que nos inquirem, buscando informações ou orientações. Nós mesmos, em inúmeras ocasiões, também nos questionamos. Embora o vasto conhecimento oferecido pela Doutrina Espírita, existem conceituações diferentes acerca de Jesus: há os que o ignoram e há os que o enxergam segundo as concepções do imediatismo humano. Entretanto, existem aqueles, que à semelhança de Pedro, lhe percebe a grandeza e a dimensão espiritual, atestadas nestas suas palavras: “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque eu o sou” (Jo 13.13).

Filho do Homem” é expressão comum no Evangelho. Participando da ascendência divina como filho de Deus, ele, como “Filho do Homem”, mostra sua identificação com as faixas de aprendizado dos seres em evolução no Orbe. O Filho do Homem é, portanto, o exemplo de perfeição que podemos aspirar. O homem por excelência que, amadurecendo seus potenciais, penetra nas linhas sutis de assimilação das revelações espirituais superiores. Trata-se de alguém ajustado à sintonia ideal do Eterno Bem que, pela utilização dos conteúdos existentes no seu super-consciente, liga-se diretamente às fontes inesgotáveis da Vida Maior. É Espírito portador de evolução humana completa caracterizada pela angelitude. Dessa forma, “Filho do Homem” é aquele que nasce, cresce e se evidencia pela capacidade de transformação de si mesmo, sob a tutela amorável de Deus.

  • E eles disseram: Uns, João Batista; outros, Elias, e outros, Jeremias ou um dos profetas (Mt 16.14).

Este texto evidencia que a ideia da reencarnação era corrente à época. Faltava, no entanto, um maior entendimento dos seus processos. Tal como acontece nos dias atuais, é significativo o número de pessoas que entende e aceita a ideia da reencarnação, mas nem sempre compreende os seus mecanismos.


A reencarnação fazia parte dos dogmas dos judeus, sob o nome de ressurreição. Só os saduceus, cuja crença era a de que tudo acaba com a morte, não acreditavam nisso. As ideias dos judeus sobre esse ponto, como sobre muitos outros, não eram claramente definidas, porque apenas tinham vagas e incompletas noções acerca da alma e de sua ligação com o corpo. Criam eles que o homem que vivera podia reviver, sem saberem precisamente de que maneira o fato poderia dar-se. Designavam pelo termo ressurreição o que o Espiritismo, mais judiciosamente, chama reencarnação. Com efeito, a ressurreição dá ideia de voltar à vida o corpo que já está morto, o que a Ciência demonstra ser materialmente impossível, sobretudo quando os elementos desse corpo já se acham desde muito tempo dispersos e absorvidos. A reencarnação é a volta da alma ou Espírito à vida corpórea, mas em outro corpo especialmente formado para ele e que nada tem de comum com o antigo. […] Se, portanto, segundo a crença deles, João Batista é Elias, o corpo de João Batista não poderia ser o de Elias, pois que João fora visto criança e seus pais eram conhecidos. João, pois, podia ser Elias reencarnado, porém, não ressuscitado. (3)


O retorno do Espírito ao corpo, supostamente tido como morto — conhecido atualmente como fenômeno de quase morte — era denominado ressurreição. Há no Evangelho dois relatos que tratam da ressurreição: a história de Lázaro e a da filha de Jairo (respectivamente, Jo 11.1-46 e Lc 8.49-56). Nos dois casos, o Espírito já se encontrava em processo de desligamento físico, abeirando-se da morte, mas, por ainda existirem ligações perispirituais com o corpo físico, foi possível a Jesus impedir que se completasse a desencarnação.

  • Disse-lhes ele: E vós, quem dizeis que eu sou? E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo (Mt 16.15,16).

Vimos no texto anterior que a multidão emite opiniões diversificadas a respeito de pessoas e acontecimentos, segundo o conhecimento que cada um possui. Relativamente, porém, a esta passagem evangélica a questão é outra. Na condição de seguidores próximos de Jesus e com ele mais bem identificados, os discípulos deveriam estar aptos a refletir com maior clareza a efetiva posição espiritual do Mestre. Se antes, Jesus lhes testou o senso de observação quanto ao pensamento da multidão, agora revela a intenção de aferir-lhes o nível de conhecimento que possuíam a respeito dele, o Messias Divino, e dos seus ensinamentos cristãos.

A resposta proferida por Pedro à indagação de Jesus é sublime, refletindo divina inspiração.


Sim! O Cristo é bem o Messias Divino. A sua palavra é bem a palavra da verdade, fundada na qual a religião se torna inabalável, mas sob a condição de praticar os sublimes ensinamentos que ela contém e não de fazer do Deus justo e bom, que nela reconhecemos, um Deus faccioso, vingativo e cruel. (2)


Iluminado por inspiração superior, Pedro age como médium perfeita­mente associado às forças do bem quando reconhece, em Jesus, o Messias Divino.


Jesus constitui o tipo da perfeição moral a que a Humanidade pode aspirar na Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo e a doutrina que ensinou é a expressão mais pura da lei do Senhor, porque, sendo ele o mais puro de quantos têm aparecido na Terra, o Espírito Divino o animava. (7)


Entretanto, será que a Huma­nidade atual apresentaria uma resposta tão pronta como a que foi dada pelo apóstolo? Possivelmente não. Certas questões ainda pairam no ar sem soluções definitivas: quem é Jesus? Como compreendê-lo, efetivamente? Como cristãos — devemos admitir — ainda possuímos limitações relativas a estes assuntos, que se expressam na forma de dúvidas, atavismos ou preconceitos. A despeito de os espíritas serem portadores de relativo conhecimento espiritual e endossarem a orientação existente em O Livro dos Espíritos de que Jesus é Guia e Modelo da Humanidade (7), nem todos consideram esta questão com a devida profundidade. Presos a atavismos ou a ideias cristalizadas, oriundas de existências pretéritas, ainda cultivam uma moral periférica, de caráter utilitarista, que os mantém afastados do Cristo e dos seus ensinamentos.

Neste particular, a pergunta: “e vós, quem dizeis que eu sou?” Não obstante ser uma indagação formulada no plural, guarda, no tempo, uma resposta inteiramente individual. É necessário que, racional e afetivamente, aceitemos Jesus de forma transcendente. Estudando os seus ensinos, à luz do entendimento espírita, aprendemos a compreendê-lo sem misticismos, religiosidade perniciosa ou fanatismo, mas enxergando que o seu Evangelho é Cartilha de Vida.


A vida moderna, com suas realidades brilhantes, vai ensinando às comunidades religiosas do Cristianismo que pregar é revelar a grandeza dos princípios de Jesus nas próprias ações diárias. O homem que se internou pelo território estranho dos discursos, sem atos correspondentes à elevação da palavra, expõe-se, cada vez mais, ao ridículo e à negação. […] É nesse quadro obscuro do desenvolvimento intelectual da Terra que os aprendizes do Cristo são expoentes da filosofia edificante da renúncia e da bondade, revelando em suas obras isoladas a experiência divina d’Aquele que preferiu a crucificação ao pacto com o mal. (10)


Coube a Simão Pedro, entre os demais discípulos, veicular a resposta do Alto, demonstrando, assim, a sua desenvolvida sensibilidade mediúnica: “Tu és o Cristo, Filho de Deus Vivo” reflete elevada intuição. A resposta revela a sublimidade e a grandeza do Mestre. Por Ele, Jesus, a misericórdia e a majestade de Deus, se dinamizam no Filho, nos ajudando a compreender o Criador como Pai incansável e operante na extensão do Universo.

A inspiração mediúnica de Pedro nos leva a ponderar quanto à necessidade de estarmos atentos às indagações que nos chegam, e, principalmente, em saber respondê-las de forma direta e objetiva. Recordemos que como candidatos ao esforço de renovação com o Cristo, seremos testados continuamente, convocados a dar o testemunho da nossa fidelidade aos princípios que acatamos como regra de vida, tal como ocorreu aos discípulos de Jesus.

  • E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que está nos céus (Mt 16.17).

Simão Barjonas significa filho de Jonas. Assim falando, Jesus personifica o apóstolo em sua condição humana, genealógica, estabelecida nas linhas da reencarnação. Esclarece, porém, em seguida, que não foi a herança genética (“não foi carne nem sangue”) que lhe concedeu condições para identificar o Messias Divino, mas, sim, a sua percepção espiritual que extrapola a matéria. Pedro demonstra possuir uma soma de recursos psíquicos úteis ao acolhimento da orientação que veio do Alto. Por certo, percebera Jesus a sensibilidade do seu valoroso cooperador, felicitando-o pelo fato de ter o apóstolo reconhecido, em plena existência física, o Governador Espiritual do Orbe.

A frase: “porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que está nos céus”, indica que somente quem atingiu este piso evolutivo consegue captar padrões de ordem transcendente. Entretanto, tais valores nos chegam continuamente do Alto, na forma de esclarecimentos e vibrações geradoras de segurança, equilíbrio e paz. Significa também dizer que a inspiração superior não está na dependência da “carne e sangue”, mas nos mecanismos impalpáveis da intuição e outras percepções psíquicas.

O processo evolutivo desempenha, igualmente, o papel extraordinário de preparar a instrumentalidade humana para, no devido momento, poder assimilar com propriedade o conteúdo de ordem sublimada oriundo dos planos superiores da vida. Verificamos, então, que é na aprendizagem rotineira, desenvolvida, passo a passo, ao longo do caminho, que se enriquece a mente e fortalece o Espírito.

Importa considerar que Jesus emprega o singular na expressão “Mas meu Pai” referindo-se, obviamente, ao Criador Supremo.

“Que está nos céus”. Não se trata, aqui, do céu religioso, tradicional, dos compêndios espirituais da retaguarda, fundamentados em interpretações teológicas e dogmáticas. Urge compreender “céus” como um estado vibracional da alma, em sua feição positiva de amor. É óbvio, que esse território está fora dos limites estreitos da matéria, mas vinculado aos meandros profundos do super-consciente. “Céus” é palavra que diz respeito ao estado de bem-aventurança. Estado em que a “[…] suprema felicidade consiste no gozo de todos os esplendores da Criação, que nenhuma linguagem humana jamais poderia descrever, que a imaginação mais fecunda não poderia conceber”. (1)

São “céus” que se expressam no que existe de bom, de belo, de equilibrado e de harmônico, na medida em que avançamos em conhecimento e moralidade, pelo trabalho incessante.

A verdadeira percepção de Deus e do reino dos céus é atributo dos Espíritos crísticos, como Jesus.


Os puros Espíritos são os Messias ou mensageiros de Deus pela transmissão e execução das suas vontades. Preenchem as grandes missões, presidem à formação dos mundos e à harmonia geral do Universo, tarefa gloriosa a que se não chega senão pela perfeição. Os [Espíritos] da ordem elevada são os únicos a possuírem os segredos de Deus, inspirando-se no seu pensamento, de que são diretos representantes. (1)

  • Pois também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16.18).

O apóstolo Pedro, ao identificar Jesus como o Cristo (Messias ou Enviado) de Deus, simboliza, de um lado, o médium Simão, filho de Jonas, mas por outro faz emergir “Pedro”, a nova personalidade que deverá alicerçar a edificação do templo de Deus Vivo.

É importante destacar que a frase “tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja” reflete que a construção do Cristianismo não está assentada na pessoa de Simão Pedro, propriamente dita — como faz crer algumas interpretações religiosas cristãs — , mas na “pedra”, no sentido de revelação ou de fundamento espiritual, que não se ergue da falibilidade dos conceitos humanos, mas da fé raciocinada, alicerce dos planos imortais da própria revelação de Jesus.

Dessa forma, a “[…] palavra de Jesus se torna a pedra angular, isto é, a pedra da consolidação do novo edifício da fé, erguido sob as ruínas do antigo. (5)

Sabemos que após a crucificação de Jesus, Pedro inicia, em Jerusalém, a missão de divulgar o Evangelho que lhe fora confiado pelo Senhor. Mais tarde, “[…] ao lado de Paulo em Roma, Pedro articula os trabalhos evangélicos que se desenvolviam na grande cidade trabalhando fielmente até cair vítima da perseguição.” (8)

A palavra “igreja” citada na afirmativa: “edificarei a minha igreja”, nada tem a ver com templos de pedra, nem com organização teológica. Traz o sentido de congregação dos ensinamentos do Cristo, interpretados em espírito e verdade, concretizados nas manifestações de amor ao próximo. A “igreja” de Jesus deve refletir a luz dos seus ensinamentos que cresce em eficiência, à medida que cada um se conscientize dos postulados do Evangelho e os coloque em prática.

O Espiritismo esclarece que a palavra inferno na frase: “E as portas do inferno não prevalecerão contra ela” tem o significado de ignorância, treva, erro ou conflito. Não devemos esquecer que, em qualquer situação, cedo ou tarde, a treva sempre é absorvida pela luz e que a verdade sempre sobrepuja a mentira. O desenvolvimento do Cristianismo, em sua simplicidade e pureza, amplia-se na atualidade, com o advento da Doutrina Espírita. Com isso, mais criaturas estão sendo retiradas do desespero e da revolta para as faixas do entendimento e da harmonia, fechando de vez as portas largas da desilusão, abertas há milênios.

  • E eu te darei as chaves do Reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus (Mt 16.19).

A Doutrina Espírita, em seu trabalho de cristianização de consciências, explica o simbolismo das “chaves”, usualmente considerado no sentido literal e místico.

Destacamos o seguinte na análise do texto evangélico: a) o sujeito da oração está na primeira pessoa do singular (“Eu”), indicando que é Jesus quem nos fornece os meios de libertação do cativeiro moral em que teimamos em permanecer; b) o beneficiário está no singular (“te” ou “a ti”), revelando que o movimento dos seres no painel da grande renovação, proposto pelo Cristianismo, não pode estar na dependência de quem quer que seja. É de ordem pessoal, intrínseco e intransferível. Cada pessoa terá de exercitar o livre-arbítrio, realizando escolhas cada vez mais acertadas na medida que incorpora os ensinamentos de Jesus, revividos pelo Espiritismo; c) os instrumentos de libertação estão escritos no plural (“as chaves”), esclarecendo que “chaves” é um código que, ao ser desvendado, transforma propostas e cogitações de espiritualização humana em realidade tangível, sob os fundamentos da fé raciocinada; d) o verbo dar, indicativo de ação, está conjugado no futuro (“darei as chaves”) revelando que, em decorrência do bom uso do livre-arbítrio, alguns Espíritos já conseguiram a liberdade aguardada; outros estão no processo, trabalhando para obtê-la; muitos, entretanto, terão sucesso mais à frente, nos tempos futuros.

O sucesso ou insucesso espiritual depende do uso adequado ou incorreto das “chaves” ou livre-arbítrio. A promessa do Cristo é atemporal, estará sempre disponível. Cabe exclusiva­mente a nós abrir as portas do entendimento, e alcançar a libertação por meio dos recursos seguros do Evangelho. O Espiritismo, na sua feição de Cristianismo redivivo, nos ensina como fazer escolhas corretas. O entendimento espírita orienta que Jesus “[…] espera que a verdade emancipe os homens; ensina que a justiça atribui a cada um pelas próprias obras e anuncia que o Criador será adorado, na Terra, em espírito. […] Jesus, a porta. Kardec, a chave”. (6)

“E tudo o que ligares na terra será ligado nos céus” se traduz como sendo a criatura responsável que alcança o estágio de consciência iluminada. O ser esclarecido não tem como alegar desconhecimento dos fatos. Se por um lado a ignorância tem sido usada para atenuar certas ações humanas, o conhecimento confere, por outro, o atestado inarredável de responsabilidade. Sendo assim, os gravames e os atenuantes se refletem no futuro por força da lei de causa e efeito, uma vez que a “[…] Lei está escrita na consciência”. (6)

“E tudo o que desligares na terra será desligado nos céus” tem outros significados, já que “ligar” e “desligar” se expressam como: o mal escraviza, prende, limita, reduz e degrada o ser humano; o bem liberta, expande, dinamiza, eleva o ser. A experiência de cada pessoa se efetiva na esteira de vinculações e desvinculações, com ressonâncias de paz ou de sofrimento, segundo a qualificação de que se reveste. Se a justiça se impõe à revelia do ser, o amor lhe concede a faculdade de “ligar” e “desligar”por meio de pensamentos, palavras e ações.

Somente quem se liga de maneira segura aos ideais que elege, às propostas elevadas que se delineiam para a sua vida, poderá obter forças para desligar-se e desvincular-se das dificuldades ou dos equívocos a que se jungiu no passado.

  • Então, mandou aos seus discípulos que a ninguém dissessem que ele era o Cristo (Mt 16.20).

Ao instruir que se guardasse sigilo quanto ao fato de ser ele o Cristo, o Mestre evidenciou, mais uma vez, que só o amadurecimento e a iniciação espirituais poderiam favorecer o enten­dimento de que era o Messias aguardado. Revela maturidade espiritual quem sabe identificar o momento em que um fato ou informação devam ser divulgados. Imaginemos no caso do Cristo!

Havia um clima de contenda entre os discípulos resultante das características individuais e dos interesses de cada um. Mesmo entre os apóstolos, nem todos compreenderam, de imediato, a missão de Jesus e quais seriam as consequências do Evangelho nas comunidades judaicas e gentílicas. Era importante, pois, que o povo, sobretudo os sacerdotes, membros do Sinédrio e mandatários romanos ignorassem, naquele momento, quem de fato era Jesus.

Os acontecimentos não devem ser precipitados, como bem nos esclarecem o Eclesiastes:


Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu: Há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo de derribar e tempo de edificar; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de prantear e tempo de saltar; tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar e tempo de afastar-se de abraçar; tempo de buscar e tempo de perder; tempo de guardar e tempo de deitar fora; tempo de rasgar e tempo de coser, tempo de estar calado e tempo de falar; tempo de amar e tempo de aborrecer; tempo de guerra e tempo de paz (Ecl 3.1-8).



 

ANEXO


Citação de Mateus 24.35



ORIENTAÇÃO AO MONITOR: Analisar de forma dinâmica o texto evangélico, destacando, ao final, os pontos citados nos objetivos deste Roteiro.



Referências:

1. KARDEC, Allan. O céu e o inferno. Tradução de Manuel Justiniano Quintão. 58. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Primeira parte, Capítulo 3, item 12, p. 34.

2. Idem - Capítulo 10, item 19, p. 154.

3. Idem - O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 124. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Capítulo 4, item 4, p. 84.

4. Idem - Capítulo 14, item 4, p. 236.

5. Idem - A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 48. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Capítulo 17, item 28, p. 379.

6. Idem - O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 86. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005, questão 621, p. 307.

7. Idem, ibidem - Questão 625, p. 308.

8. RIGONATTI, Eliseu. O Evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento-Cultrix, 2003. Item: A confissão de Pedro, p. 155.

9. XAVIER, F. Cândido e VIEIRA, Waldo. Opinião espírita. Pelos Espíritos Emmanuel e André Luiz. 4. ed. Uberaba: 1973. Capítulo 2 (O mestre e o apóstolo — mensagem ditada por Emmanuel), p. 25.

10. XAVIER, Francisco Cândido. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 24. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Capítulo 7 (Aos discípulos), p. 31-32.


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